segunda-feira, 1 de abril de 2019

REUNIMOS 21 TEXTOS PARA SERVIREM DE ANTÍDOTOS À DITADURA. UM PARA CADA ANO QUE O PESADELO DUROU

O Encontro com a ditadura já atingiu seu objetivo, o de oferecer farto material de leitura e consulta para quem busca informação isenta e consistente sobre o arbítrio que se abateu sobre o Brasil no dia 1º de abril de 1964 e o manteve subjugado até 15 de março de 1985.

O Direto da Redação e o Náufrago da Utopia admitem publicar boas colaborações tardias que porventura ainda cheguem, mas o principal já foi feito, de forma que podemos passar ao balanço final.

Esperamos que nossos esforços dos últimos dias sirvam para aclarar a visão das novas gerações, ao oferecer-lhes uma alternativa às distorções da indústria cultural.

Uma destas distorções é exatamente quanto à data da ignóbil quartelada, assunto que o site Pragmatismo Político já esgotou num  post inquestionável e irrespondível.

Noutras circunstâncias se deveria considerar bizantina tal questão. Mas, tratou-se de uma virada de mesa imposta à força que, até no detalhe do rótulo (revolução de 31 de março), apostou em que os mais poderosos conseguiriam atropelar com êxito a verdade histórica. 

Primeiramente, jamais foi uma revolução (tanto que sua proposta inicial era apenas a de suspender garantias constitucionais enquanto efetuava uma cirúrgica intervenção saneadora, devolvendo em seguida as chaves do Palácio do Planalto aos civis). 

Para piorar, nem sequer sucedeu na data trombeteada. Fake news ontem, fake news hoje. Essa gente não consegue viver sem eles...

Então, em meio a tanta mentira deslavada, a coincidência com o Dia da Mentira não só está inscrita na História, como estava de antemão escrita nas estrelas...

E que os leitores aproveitem as horas que restam do aniversário do golpe de 1964 para tomar conhecimento, nestas duas tribunas virtuais, de outras tantas distorções que têm prevalecido até agora porque os interessados em escamotear a verdade têm recursos materiais infinitamente maiores ao seu dispor e não hesitam em martelar as versões que lhes convêm até que passem por verdadeiras. Goebbels explica.

Eis a relação dos posts referentes ao Encontro que o Náufrago da Utopia publicou. Para acessá-los, basta clicar no título:

O COTIDIANO DE UM RESISTENTE (Celso Lungaretti)

6 comentários:

Anônimo disse...

Primeiro, parabéns pelas postagens que enriqueceram o conteúdo dos leitores acerca do tema.
Na condição de alguém que não viveu o período, sendo eu um centrista ("isentão", caso prefiram) e irremediavelmente democrata, pergunto (de boa-fé): algum regime autoritário não era inevitável no período, de um polo ideológico ou de outro?
Tendo em vista o contexto da Guerra Fria, me parece o seguinte: o Brasil aderia às ditaduras militares financiadas pelos EUA na América Latina ou cairia também em um modelo autoritário alinhando-se com a União Soviética. E aqui não entro no mérito sobre qual seria melhor, afinal repudio toda forma de governo que não seja democrática. Os decretos provocativos e inconstitucionais do Jango à época, como aquele da reforma agrária, parecem apontar nesse sentido. Bem como o fato de que a URSS apoiava os movimentos guerrilheiros, ainda que parcialmente.
Havia, na prática, a viabilidade de um caminho do meio? Da manutenção da democracia? E que fique claro para que não reste confusão: repudio veementemente a ditadura militar e seu arbítrio.

celsolungaretti disse...

A esquerda era fraca e pulverizada demais para impor qualquer regime autoritário. O PCB foi a única (e remota) chance de algo assim, mas saiu completamente desmoralizado do golpe de 1964, já que nem sequer resistira ao inimigo.

Você tem uma visão muito influenciada por mera propaganda política. Eu, que estava bem no centro da coisa (era comandante estadual de Inteligência da VPR, o segundo escalão de uma das 2 principais organizações guerrilheiras da época, abaixo apenas dos comandantes nacionais), conheci uma realidade bem diferente:
— a URSS apenas utilizava as guerrilhas latino-americanas como trunfos nas suas disputas geopolíticas com os EUA, mas tudo fazia para elas não chegarem ao poder em lugar nenhum;
— a exploração no campo era tão extremada que os decretos do Jango, longe de ser provocativos, constituíam-se no mínimo aceitável naquelas circunstâncias (se não os lançasse seria ultrapassado pelas Ligas Camponesas, então o que ele tentava era evitar um descontrole explosivo);
— os EUA tinham como abortar qualquer nova revolução no nosso continente, a surpresa cubana jamais se repetiria.

Enfim, o que houve foi mesmo um esquema golpista fabricando espantalhos para servirem de pretexto para o que essa gente vinha tentando fazer desde 1954. E só conseguiu êxito depois da morte do Kennedy, que era perspicaz demais para entrar nessas artimanhas da CIA, como não entrou no episódio da Baía dos Porcos.

Foi preciso a presidência cair no colo de um caipirão como o Lyndon Johnson para eles afinal receberem sinal verde para o golpe.

Anônimo disse...

Celso, obrigado pelos esclarecimentos! E perdão pela minha ignorância nas perguntas. Minha curiosidade é sincera e sinto privilégio de poder conversar com alguém que vivenciou tão profundamente o período.
Não quero amolar, mas fiquei com duas curiosidades de sua resposta. Caso possa responder ficarei grato.
1) Não entendi bem porque a URSS tudo fazia para as guerrilhas não chegarem ao poder. Claro, caso queira e possa comentar o assunto!
2) Essa visão de que os EUA teria como abortar qualquer revolução foi adquirida posteriormente? Ou à época já se tinha noção de que a guerrilha era uma luta sem perspectiva, uma missão quase suicida portanto?
Perdão por incomodá-lo!

Henrique Nascimento disse...

Eu também sempre me perguntei qual teria sido o rumo da história se, ao invés do atrapalhado Jânio Quadros e o hesitante Jango, tivesse ganhado as eleições presidenciais de 1960 o general Henrique Lott, o candidato do Juscelino. Este tinha sido ministro da guerra do Juscelino, garantido a posse do Juscelino e já tinha provado que era eficiente em conter os colegas revoltosos, quando abafou os levantes de Jacareacanga/Aragarças. A sua atuação já iniciou-se na época da morte de Café Filho em 1955. Por ser alta patente no exército, com certeza ele sabia muito bem o que se passava nas cabeças dos conspiradores-mor da caserna.

celsolungaretti disse...

Henrique, concordo plenamente.

E digo mais: foi oportunista ao extremo o apoio velado que Jânio e Jango se deram por baixo do pano, traindo seus companheiros de chapa.

Naquele tempo se votava no presidente e também no vice, de forma que podiam ser eleitos cidadãos de partidos e tendências ideológicas diferentes.

Para aumentaram suas respectivas chances de vitória, as campanhas de Jânio e Jango estimularam, por baixo do pano, a votação na "chapa" Jan-Jan. Essa imoralidade foi o ponto de partida de 21 anos de ditadura.

celsolungaretti disse...

Anônimo das 21h04,

entre as duas superpotências havia um reconhecimento tácito de quais eram as áreas de influência do adversário que não deveriam ser invadidas.

A revolução cubana, p. ex., foi vitoriosa apesar da URSS, e não por causa da URSS. Depois, quando já estava no poder, os soviéticos passaram a sustentá-la para poder controlá-la.

O Che fez uma última tentativa de evitar tal dependência, ao ir lutar na Bolívia, contando com uma promessa do Brizola de lançar uma guerrilha também no Brasil (ele não acreditou nessa possibilidade e botou aqueles gatos pingados em Caparaó só para fingir que estava cumprindo o acordado com os cubanos).

Guevara foi executado e Fidel Castro, o pragmático, aceitou curvar-se às diretrizes do Kremlin.

Por que a URSS não queria envolver-se com revoluções no nosso continente? Porque não teria como defendê-las, a menos que usasse armas atômicas e precipitasse o fim da espécie humana.

Numa guerra convencional, jamais conseguiria bater os EUA no seu quintal. E deixar uma revolução daqui entregue à própria sorte causaria danos consideráveis à sua imagem.

Da mesma forma, os EUA não moveram uma palha para ajudar a Hungria em 1956 e a Checoslováquia em 1968. A realpolitik é repulsiva.

Quanto à minha opção pela luta armada, foi feita quando eu acabara de completar 18 anos. Ainda não tinha os conhecimentos e a experiência da vida para perceber que uma intervenção dos EUA seria inevitável e impossível de derrotar. Acreditava no contrário por causa de Cuba (os EUA tiveram dúvidas sobre os rumos que tomaria o novo regime) e do Vietnã (fora da zona de influência estadunidense).

Aliás, mesmo um economista como o Ladislau Dowbor não previu que os EUA direcionariam uma enxurrada de investimentos diretos para o Brasil em 1970, suficiente para criar boom econômico efêmero que causou nossa derrota política (a derrota militar se deveu apenas e tão somente à enorme desigualdade de forças).

Ao refletir depois sobre como o fajuto "milagre brasileiro" retirou a escada e nos deixou pendurados na brocha, percebi o acerto das advertências do Paulo Francis (ele sempre fora cético a respeito das chances de as guerrilhas brasileiras serem vitoriosas no quintal dos EUA).

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