quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O GRANDE DESAFIO: UM DEBATE ENTRE O EMANCIPACIONISTA DALTON ROSADO E O NEOLIBERAL PAULO GUEDES – 2

(continuação deste post)
Dando sequência a nosso debate (*), faço ao Paulo Guedes e ao Dalton Rosado uma pergunta que vai diretamente ao encontro de uma das maiores preocupações atuais dos brasileiros:                                                              

O desemprego estrutural é uma realidade em todo o mundo e fustiga o Brasil, onde atinge 13 milhões de pessoas, além de tantas outras subempregadas. Como os senhores veem essa questão?
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Paulo Guedes: o desemprego não é estrutural, mas localizado. Os Estados Unidos têm taxa de desemprego em torno de 3,7% da mão-de-obra economicamente ativa e um padrão salarial bem acima do brasileiro, como de resto se verifica mundo afora. 

O desemprego ocorre em países que relutam em se adequar às exigências do mercado, pois este exclui as práticas contrárias aos seus princípios, como baixa produtividade, altos custos tributários, burocracia e perseguição aos que querem empreender; enfim, a tudo que diga respeito ao livre empreendedorismo.

O Brasil tem sido um exemplo de quem faz tudo errado e o resultado é o que estamos vendo. Nossa intenção é criar um ambiente favorável ao empreendedorismo no Brasil. Assim, valorizaremos talentos nacionais e atrairemos outros do exterior para gerar novas tecnologias, emprego e renda aqui. 

Quebraremos o ciclo vicioso da falta de crescimento e reduziremos a dívida pública via privatizações em massa e aceleradas, substituindo tudo isso pelo ciclo virtuoso de menores déficits, dívida decrescente e juros mais baixos. Isso estimulará os investimentos, o crescimento e a consequente geração de empregos.

A promoção de um ambiente de renda crescente, de modo que a própria renda estimule a produção que promoverá a retomada do crescimento econômico (o qual depende de um conjunto de fatores que se agregam e solidificam positivamente) é como vamos enfrentar o problema do desemprego no Brasil. 

O crescimento econômico é a pedra de toque para o solução de muitos problemas, que vão desde a necessidade do ajuste do orçamento fiscal a uma realidade tributária administrável e que seja bem aproveitada (sem descaminhos pela corrupção) até o combate ao desemprego, que é chaga social e origem de tantos males e problemas,
                                                                                                                                      .
Dalton Rosadonegar que haja desemprego estrutural mundo afora é se contrapor às estatísticas mundiais. Trata-se de um argumento insustentável. 

Hoje observamos que os países nos quais a tecnologia de produção de mercadorias está defasada em relação aos grandes centros produtores de mercadorias ficam para trás na guerra de mercado, especialmente porque o capitalismo não consegue se estabelecer como sistema capaz de proporcionar a riqueza abstrata de forma equânime, pois a pujança (hoje em trajetória descendente) dos ricos está na inversa proporção da pobreza de muitos.
Isto ocorre em razão da baixa produtividade, que condena os países pobres a serem perdedores nessa guerra de mercado pela falta de conhecimento e aparelhamento tecnológico, falta de educação profissional e escolar, falta de estímulos econômico-financeiros, de infraestrutura, além de problemas climáticos ou geológicos.

Os países pobres vivem o drama do desemprego estrutural e o subemprego que fermenta a desintegração política e oportuniza posturas ditatoriais que desintegram completamente a vida social desses países.

Os Estados Unidos é a exceção, por motivos bem artificiais, e que confirma a regra mundial. Basta olhar para a África, o Oriente Médio, as Américas Central e do Sul, e para regiões asiáticas e eurasiáticas para se encontrar índices de desemprego bem além do aceitável. 

Mas o problema não se restringe à periferia do capitalismo Mesmo a União Europeia, culta e economicamente fortalecida pela sua moeda (o euro) e pelos sistema de crédito internacional, já enfrenta sérios problemas de desemprego que repercutem inclusive na previdência social. 

Nessas regiões ditas prósperas as pessoas vivem mais e o desemprego implica uma menor parcela de contribuintes previdenciários; isto causa um desequilíbrio irresolúvel das contas públicas sob a lógica capitalista. Até os ricos estão em decadência.

O desemprego estrutural decorre do fato de que a produção tecnológica de mercadorias a partir da introdução da microeletrônica (que propiciou a informação imediata, os cálculos e procedimentos computadorizados) e da robotização tornou dispensável, em grande parte, o trabalho abstrato, único produtor de valor.

Com isto, estabeleceu-se uma contradição inconciliável entre forma da produção (mercadorias) e conteúdo dessa produção (forma-valor).

O problema do desemprego estrutural que atinge o Brasil (país periférico do capitalismo) de modo acentuado, não será resolvido com a diminuição dos direitos trabalhistas e redução de salários, mas sim mediante a superação do próprio modo de produção capitalista. 

É algo bem diferente do proposto por Paulo Guedes, que acredita na possibilidade de desenvolvimento econômico brasileiro sustentado, mesmo que tal prognóstico esteja na contramão do que está a ocorrer mundo afora.

A solução deste problema não é a criação de empregos mas a superação do próprio emprego, somente possível sob outro modo de produção social.
                                                                                                                                                                      .
Uma das questões mais candentes para a vida social é o valor do dinheiro, que tem
 peso fundamental tanto no planejamento familiar quanto na tomada de
decisões empresariais. Como os senhores analisam a questão
da inflação e do controle monetário estatal? 
 .
Paulo Guedes: esta é uma pergunta inteligente e oportuna. Tenho defendido a independência do Banco Central por entender que os humores e interesses da política não devem interferir na administração da moeda. 
Esta deve se reger por regras pragmáticas da economia de mercado, uma vez que tal administração está diretamente ligada ao sistema de preços, sem o qual o mercado não tem parâmetros de confiabilidade. 

O mercado é o grande balizador da economia, pois promove a regulação de preços; e é nele que se manifesta a eficiência da cooperação da produção mercantil a partir da divisão do trabalho. 

Já dizia Adam Smith que o capitalismo se desenvolve a partir da necessidade e do interesse pessoal, individual, baseando-se na cooperação da divisão do trabalho, na qual as capacidades individuais se sobressaem e, de forma conjunta, promovem a riqueza das nações e, por consequência,  dos seus cidadãos.

Assim sendo, o Banco Central deve ser um poder autônomo, tal como o devem ser o Judiciário e o Legislativo, que têm funções específicas dentro do ordenamento jurídico-constitucional republicano. Considero, inclusive, que deva ter mandato com duração fixa, sem possibilidade de remoção política após a aprovação pelo Congresso Nacional do nome indicado pelo Presidente da República.

O Brasil, nas últimas quatro décadas, foi alvo de processos inflacionários que causaram turbulências econômicas e políticas, graças aos modelos de planos econômicos desastrosos que tinham como base a emissão irresponsável de moeda pelo Banco Central. Tais desatinos nos custaram caro.
Governo Sarney: maior inflação nacional de todos os tempos

Os governos militares, que criaram o Banco Central, no primeiro momento mantiveram rigidez na condução da questão monetária, que deu bons resultados;infelizmente, no final fizeram concessões políticas nessa questão, o que causou um processo inflacionário. 

Depois vieram os governos civis, cujos planos econômicos pouco consistentes terminaram por fazer explodir a inflação, tanto no final do Governo Sarney (em 1989, chegou-se ao patamar de mais de 5.000% ao ano), como depois no Governo Collor (em mais de 2.000% ao ano), o que implicou uma desordem econômica com reflexos políticos acentuados.

Lula não caiu com o mensalão porque a economia ia bem, mas o mesmo não aconteceu com a Operação Lava-Jato: num cenário de crise econômica e inflação em alta, as chocantes revelações sobre corrupção nas altas esferas derrubou Dilma Rousseff. 
 .
Dalton Rosado:   primeiramente, quero ressaltar que a política serve ao capital, que é quem a sustenta. Neste sentido, o Banco Central, responsável pelo controle monetário, obedece aos humores da economia, ainda que de forma indireta, porque seu dirigente é nomeado por um político.  Todos os poderes da República se subsomem ao negativo poder do capital. É ele que manda.
O capitalismo balançou em 2008. Cairá na próxima vez?
Jamais haverá independência do Banco Central na economia capitalista, porque ele é sempre submisso aos interesses nacionais do capital, que variam de acordo com sua própria ascensão ou depressão. As regras econômicas, por mais pragmáticas que sejam, são alteradas quando a economia nacional assim o exige.

Os exemplos históricas são muitos e podemos citar o mais recente ocorrido quando da crise do subprime estadunidense de 2008, que exigiu a emissão de dólares sem lastro para cobrir o déficit da bolha imobiliária cujo estouro representaria um crash financeiro do sistema bancário caso não fosse socorrido monetariamente. 

Sobre isto nada tem a dizer a escola da ortodoxia monetária liberal de Chicago à qual o senhor é ligado ideologicamente como economista e como banqueiro.

Entretanto, a tese correta do ponto de vista da ciência econômica que afirma ser a emissão de moeda sem lastro na produção de mercadorias causadora de inflação, não vale para quem emite moeda internacional, pois estas são exportadas sem que isso cause inflação no país emissores (caso dos Estados Unidos e União Europeia). 

O Brasil, contudo, não pode usar dos mesmos artifícios monetários dos países de moedas fortes, por todos aceitas como se fossem válidas; tais mecanismos são inacessíveis aos países da periferia do capitalismo e suas moedas fracas. 

O senhor, como economista liberal que é ligado ao sistema financeiro internacional, tal qual receita o Fundo Monetário Internacional, quer que nós sejamos cumpridores da cartilha do monetarismo internacional sem levar em conta a nossa realidade econômico-financeira, ou seja, quer que se cumpram as regras capitalistas acadêmicas (que os países ricos não cumprem), ainda que isto ocasione a morte de brasileiros que não têm acesso às franquias financeiras somente acessíveis aos países do 1º mundo.

Mais adiante falaremos sobre a desigualdade do sistema de crédito internacional que aqui está instalado com os grandes bancos multinacionais e a relação disso com o Banco Central e a emissão da moeda e controle do câmbio. O senhor quer que apenas nós sejamos disciplinados na nossa miséria e aceitemos as imposições do capital como pobres alunos.

A questão não é tornar o BC independente, coisa que é impossível de ocorrer quando a economia nacional está combalida, mas questionarmos a própria mediação social e comando feito pela moeda, que é outro raciocínio que o senhor nem sequer admite que possa existir, mas que, mesmo assim, existe.
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Observação do editor: trata-se, evidentemente, de um debate hipotético, idealizado pelo Dalton para expor, de forma didática e esclarecedora, as diferenças entre o pensamento econômico que norteará o governo de Jair Bolsonaro (enquanto durar) e uma alternativa possível, a da corrente de reinterpretação de Marx conhecida como crítica do valor.
(continua neste post)

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