sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

LAMENTO, ADAM SMITH, NÃO DEU CERTO...

Delfim Netto em 1968, já ministro da Fazenda aos 40 anos.
Eu tinha 6 aninhos. Escapulia do meu cortiço na rua Coronel Cintra, na Mooca,  cruzava a velha ponte de taboas largas do rio Tamanduateí e regressava com um enorme cesto de vime nas costas, abarrotado de tocos de madeira da formidável marcenaria do meu tio, na rua dos Alpes, no Cambuci. Nosso fogão era a lenha.

Ao lado da marcenaria morava um menino que não saia de casa. Uma casa pequena e pobre. A vida dele é ler, dizia meu primo, afundando os pés na serragem da oficina. Na casa modesta viviam ele, a mãe e a irmã. A mãe faz um sacrifício danado para ele estudar, ainda meu primo falando.

Esse menino, preclaro leitor, se chamava Antonio Delfim Neto e – quem diria? – se tornaria um dia um luminar da economia, oráculo procurado por bandos de fieis em busca de revelações salvadoras provenientes dessa ciência que jamais amenizou as aflições vitais dos humanos.  A ponto de inspirar nos italianos esta definição jocosa: uma ciência tal que, com a qual ou sem a tal, a situação permanece tal e qual.

Quem adivinharia que o menino que não parava de ler e hoje é lido nos mais importantes veículos financeiros do planeta, viria, aos 88 anos de idade, confessar sua descrença definitiva no predomínio econômico dos capitais, modo de vida adotado pela humanidade, intitulado de sistema capitalista. Tantas rugas no rosto experiente... para nada!

Delfim ora acredita que nem mesmo a extinção do sistema chamado de excludente, apontado como culpado pelo desfilar do rico com trajes palacianos ao lado do pobre esfarrapado, salvaria a humanidade.

Os críticos do capitalismo sonham com o fim desse sistema e o consequente surgimento de uma sociedade mundial fraterna, livre do devorai-vos uns aos outros!. Nem nisto Delfim acredita. 

Com sistema capitalista ou sem sistema capitalista, uma montanha de livros depois, o menino vizinho da marcenaria de outrora não vê salvação. O culpado é o homem. Não se iludam, o ser humano não presta, dizia em classe um meu professor de Direito na USP.

Quando um bando de cachorros vislumbra um semelhante  no canto do um beco,  acuadinho, pequenininho, pobre dele, é atacado covardemente em avalanche pelos valentões. Teremos lucidez para uma comparação? O cãozinho capitalista merece ser atacado e culpado por todas as dores da humanidade? O que virá depois que todos nós, raivosos com o sistema, o destruirmos em seu beco hoje sem saída? Estaria garantida uma nova sociedade boazinha, boazinha? Para Delfim, não.

A história do capitalismo guarda em seu arquivo um fluir implacável de desumanidades geradas no mui interno do homem. Quem nasceu primeiro, o foro íntimo desairoso do ser humano ou o seu filhote, o sistema capitalista?
Este final de elucubrações é pura elucubração: todos os impérios e sistemas de vida caíram, então deve ser ordem natural das coisas que o sistema capitalista um dia se torne obsoleto e seja substituído gradativamente por modo de vida feliz.  Na marra, de improviso, não acredito. 

Os sermões dos religiosos em suas apregoações de fim de mundo anunciam uma era pós-capitalista, o surgimento de uma sociedade em que o leão circula pacificamente com o carneiro em meio a uma exuberante natureza preservada. Há até pinturas religiosas do leão e do carneiro sobre um gramado impecável antevendo o paraíso. 

O jeito é esperar. (por Apollo Natali)
.
"O que é que tem de novo pra deixar? Nada, só 
a caminhada longa, pra nenhum lugar..." 

Um comentário:

SF disse...

Apollo,
Sinto-me tranquilo para tecer considerações esotéricas a respeito do seu texto.
E de outros referentes ao golfinho.

Direi que tem o homem o poder da inteligência de maneira a, ao bem utilizá-la, obter cabedais que lhe proporcionem conforto e bem estar.

É sabido que ótimas prebendas conquistou o nosso Estudioso.

Sua mente brilhante ofuscou e seduziu a muitos...

Ocorre que, sua crespúscular debacle, abre a possibilidade de asseverar que nem riquezas, nem connhecimentos ou homenagens completam a trajetória humana.

O ser que só desenvolve a mente estaciona na aridez da incompletude.

Aos que veem nos outros inimigos o fim desalentado do nosso Sabido, de alguma maneira, justifica-os.

Mas...
Ouso afirmar que ao chegar ao fastígio deveria o ser humano aceitar o desafio de amar.

Sim. Amar.

Envolver-se tão intimamente com outro ser humano ao ponto de tormar-se um com ele.

E não falo de amores fraternais e sim carnais.

O desnudamento do corpo e a renúncia de si mesmo. Ao ponto de não saber mais onde termina o seu eu e onde começa o/a do/a amado/o.

Esse amor humano, natural,substantivo é o prelúdio do conhecimento universal.

Saindo um pouquinho das amarras do ego o ser vislumbra o eterno.

Mesmo que por um instante liberta-se do cruel egoísmo que o infelicita.

Nu. Entregue ao prazer da comunhão verdadeira.

E as vantagens sâo tantas... sem remuneração ou glória, contudo.

Uma delas chama-se o despertar de kundalini.

Quão poucos seres humanos já o experimentaram?

Outra, já num grau mais avançado, é sair do corpo e a ele voltar conscientemente.

E tudo começa quando alguém decide amar, apesar de toda a oposição.
Apesar dos prejuízos e das perdas de status.

Reverbera até hoje a serena advetência do Divino Mestre "de que vale ao homem ganhar o mundo e perder sua alma?"
Ou aquela: "deixe-na! Seus pecados estão perdoados porque MUITO AMOU!

Foi isso e é isso que falta a maioria das pessoas.

A coragem de amar e, depois de amar, ir além do amor.

Por não amar.

Por isso sofre o antigo e sôfrego leitor, denominado de mamífero aquático.

Deus tenha misericórdia de sua alma.

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