terça-feira, 22 de novembro de 2016

DALTON ROSADO ANALISA O CONTEÚDO DE TRÊS NOTÍCIAS DO "JORNAL NACIONAL"

"A ideologia da austeridade propõe a penalização dos
mais fracos. Os políticos e tecnocratas gostam de se 
enxergar como pessoas sérias que tomam decisões
difíceis, como cortar programas populares elevar
taxas de juros, sem perceber que isso só vai piorar
as coisas." (Paul Krugman, prêmio Nobel de Economia)

1) AFIRMAÇÃO DE TEMER DE QUE A CRISE DERIVA DA TENTATIVA DE DILMA DE ENCOBRIR A REALIDADE
Na primeira reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Presidente Temerário afirmou que “a gigantesca crise enfrentada pelo País é resultado da tentativa de disfarçar a realidade”. 

Podemos extrair desta frase algumas conclusões que denunciam a falta de consistência da análise presidencial, bem como a tentativa de escamotear a verdadeira realidade. 

Em primeiro lugar, a crise não deriva da tentativa de disfarçar a realidade, mas sim de problemas muito mais graves do que este.

É certo que, no caso brasileiro, a crise mais intensa herdada do governo Dilma tem imediata conexão com fatores como: 
  • erro na administração econômico-financeira dos recursos do Tesouro e forma de endividamento;
  • conivência com a corrupção generalizada, da qual participaram muitos dos membros do atual governo e o próprio partido do Presidente Temerário, por ele presidido; e
  • da conjuntura econômica mundial em tempos de Black Friday (sexta-feira negra) permanente. 
Em segundo lugar, a frase presidencial é inconsistente do ponto de vista lógico e deriva de uma tentativa de evitar a admissão de que vivemos uma crise econômica sistêmica, a qual é insolúvel dentro dos critérios que se constituem na sua causa. 

Se a ex-presidente Dilma tivesse exposto de forma transparente o descontrole das finanças públicas, a crise teria deixado de existir? Evidentemente que não.

A questão é que, com o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social pugnando pela intensificação das causas do mal como forma de combater os efeitos do próprio mal, não se cogitaram medidas alternativas fora da lógica econômica dominante. 

Quaisquer propostas de saída da crise e análise de suas causas a partir de tais conceitos econômicos são natimortas, e esta é a camisa de força que aprisiona e imobiliza todos os governos, independentemente de suas concepções ideológicas aparentemente diferenciadas.

Por fim, devemos lembrar que não pode haver desenvolvimento social a partir de um desenvolvimento econômico que atingiu o seu ponto limite de expansão e que, mesmo em sua fase de ascensão, nunca deixou de ser segregacionista. O pé de laranja não dá manga. 

2) CONSELHO DE NIZAN GUANAES AO PRESIDENTE TEMERÁRIO, DE QUE NÃO TENHA MEDO DE SER IMPOPULAR
Em reunião capitaneada por Temer, o hábil marqueteiro Nizan Guanaes, agora guindado à condição de conselheiro presidencial, aconselhou-o a aproveitar a sua baixa popularidade atual para tomar as medidas impopulares que, no seu entender, seriam necessárias. Entre outras superficialidades de marqueteiro, disse que “a popularidade é uma jaula”. E foi muito aplaudido por quem precisa do endosso presidencial  para a prática das malvadezas contra o povo como forma de manutenção do sistema.  
Nizan: "Abra logo o saco de maldades!"

Tudo se passa como se a austeridade nas contas públicas tivesse o condão de resolver um problema causado pela contradição inconciliável entre a forma de relação social estabelecida e a própria ineficácia atual da mecânica de reprodução do capital. O déficit nas contas públicas é efeito e não causa da crise. 

A austeridade econômico-financeira ditada pelo capital aos países periféricos já vem sendo feita por imposição de uma realidade de crise estrutural que reduz o Estado unicamente às suas verdadeiras prioridades, quais sejam a sustentação dos poderes e o monopólio da força militar que mantêm a coerção social patrocinada pelo capital, deixando de lado, cada vez mais, as suas funções sociais (saúde, educação, serviços públicos gerais, etc.) e jogando por terra a sua máscara de isenção e neutralidade. 

No mundo inteiro as sociedades se regulam pelo mesmo critério das relações mercantis. Mas, somente aos governos dos países pobres (que não podem emitir moeda sem lastro para financiar o déficit público e suprir a falta de dinheiro que irriga as relações econômicas, muito menos emitir títulos públicos a juros baixos e prazos longos que o mercado aceite) é imposto o discurso da austeridade como varinha de condão capaz de resolver problemas que, na verdade, são muito mais graves do que nos querem fazer crer.

Não precisamos de mais um conselho superficial, conservador e inconsistente como o de Nizan Guanaes, que busca na causa dos nossos infortúnios as soluções para os problemas por ela causados. 

3) A VALORIZAÇÃO DAS AÇÕES DO BANCO DO BRASIL POR CONTA DE MEDIDAS DE SANEAMENTO FINANCEIRO   
Na sequência das notícias, o Jornal Nacional enfatiza com júbilo a subida das ações do Banco do Brasil na Bolsa de Valores do Estado de São Paulo como resultado de medidas econômico-administrativas que visam ajustar o BB à realidade financeira de depressão.  

Tais medidas se resumem ao fechamento de agências bancárias e à reedição do plano de demissões voluntárias do período Collor de Mello (aquele que foi eleito como caçador de marajás e acabou cassado...).  

Isto significa que muitas cidades interioranas ficarão sem as agências bancárias (as quais já não funcionavam em várias delas por causa dos repetidos assaltos que vinham sofrendo, fazendo a dupla Bonnie e Clyde parecer de assaltantes de meia tigela), enquanto aumentará a pesada estatística de desempregados. 

O mercado financeiro, que somente consegue enxergar os números e medidas geradoras de lucros localizados, sem se importar com o contexto social global, naturalmente aplaude tais medidas, que são enfatizadas pelo noticiário nacional como ganhos da austeridade. 

Mas, aí eu pergunto: e a vida das pessoas, como é que fica? 

Quando se reduz a vida social a um grande cassino econômico, é a própria vida que corre perigo. (por Dalton Rosado)

Um comentário:

Taciano disse...

Mais um artigo brilhante, como sempre, de Dalton Rosado. Indo, na análise, à raiz do problema.

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