quarta-feira, 9 de maio de 2012

O PV E SERRA SE MERECEM

Em 2006, quando se aproximava o final do prazo para filiação a partidos de quem se dispunha a ser candidato às eleições daquele ano, um amigo promotor, grande defensor dos direitos humanos, recomendou que eu me inscrevesse em alguma agremiação.

Respondi que não tinha nenhum projeto nessa direção, mas ele insistiu: quem sabe adiante?

Nem de longe cogitava ingressar na política oficial, salvo na remotíssima eventualidade de vir a ser anticandidato ao Executivo por algum partido que se dispusesse a usar as tribunas fornecidas pelo sistema para defender posições revolucionárias, sem nenhuma ambição de vitória eleitoral. Algo que se fazia no passado, mas parece ter saído de moda; agora, todos querem mais é obter nacos do poder.

Pelo sim, pelo não, acabei concordando com a sugestão do meu amigo.

Vem de longe minha propensão a deixar sempre uma porta aberta para as improbabilidades. Aos 18 anos, quando tirei a carteira de motorista, optei pela habilitação do tipo profissional, apenas porque o único requisito adicional era preencher outra página de questões de múltipla escolha.  Por que não? --pensei. Adquiri, portanto,o direito de dirigir qualquer veículo, menos os que transportassem carga perigosas; e, previsivelmente, isto acabaria não tendo utilidade nenhuma para mim. 

Aceitei também uma má indicação do bom Jorge: ele me recomendou o Partido Verde porque era, no seu entender, o menos sectário do campo da esquerda.

Mas, depois da inscrição, nem o PV me contatou, nem o procurei. Tinha outras prioridades.

Ao contrário do Jânio, o PV já
decidiu o rumo: direita, volver!
Postava, contudo, meus artigos na comunidade do PV no Orkut.

O que lancei em março de 2007, à véspera de mais um aniversário da quartelada de 1964, foi mal recebido por uma dirigente estadual, que me respondeu com esta farpa: 
"Quem fez a luta armada, já fez sua autocrítica, na medida que tantas mortes não foram de grande serventia".
A discussão azedou e eu invoquei o direito que tínhamos de confrontar a tirania:
"Eu participei da luta armada e considero nossa opção plenamente justificada nas circunstâncias da época, já que o fechamento de todos os caminhos da luta política, a partir do AI-5, só nos deixava a alternativa de desistirmos da resistência à ditadura ou pegarmos em armas".
Ela retrucou:
"Me espanta isso, pq isso abre precedente pra que numa situação crítica, novamente o fim justifique os meios.
A menos que eu esteja completamente equivocada, o PV defende o pacifismo".
 Então, face à insistência dela de que eu deveria respeitar o opção estatutária do PV pela não violência do Gandhi, eu comuniquei que estava deixando aquela comunidade do Orkut e providenciaria a desfiliação do partido logo no dia seguinte (o que fiz).

REQUIESCAT IN PACE

Hoje reavaliei minha postura em relação àquela desafeta virtual: deveria tê-la poupado de recriminações e, isto sim, agradecer-lhe penhoradamente por ter aberto meus olhos.

Que alívio estar, há cinco anos, bem longe desse partido! Se não, parafraseando o bordão do narrador esportivo Sílvio Luís,  o que é que eu iria dizer lá em casa  quando o PV formalizasse, na noite desta 6ª feira (10), o apoio a José Serra na eleição municipal?! Programaticamente, não faz sentido nenhum. Inexiste qualquer justificativa aceitável. E a única explicação que me ocorre é a frase pessimista do escritor francês Maurice Druon, "viver envilece".
Plínio Salgado + Índio da Costa +
Geraldo Alckmin = José Serra atual
O que o PV teve um dia de esquerda --meu ex-companheiro de movimento secundarista e militância revolucionária, Edmauro Gopfert, p. ex., foi um  verde  de primeira hora-- desmanchou no ar. Hoje não passa de um partidinho fisiológico como qualquer outro.

Aderir a quem se mancomunou escancaradamente com a extrema-direita na última eleição presidencial é vergonhoso.

Assim como vergonhoso é somar forças com aquele que, como governador, iniciou a atual escalada autoritária em São Paulo e, mesmo tendo um dia presidido a UNE, não hesitou em autorizar a invasão da USP por brucutus fardados.

O caráter ignominioso de tal aliança aumenta se lembrarmos da administração calamitosa dos tucanos no Estado, consolidando a ocupação militar da USP, ordenando a blitzkrieg na Cracolândia e a barbárie no Pinheirinho, dentre outras reincidências nas práticas ditatoriais das quais pensávamos ter-nos livrado em 1985.

Enfim, como bom cristão, deixarei os mortos enterrarem seus mortos. O PV e Serra se merecem.

4 comentários:

Anônimo disse...

Como sempre, outro excelente artigo. Parabéns!
Maria do Rocio Macedo - Curitiba/Pr.

Anônimo disse...

o PV é tão fisiológico como o PCdoBolso, o PSB e o PPS . Nem sei qual destes é pior. Partidos que se autointitulanm de esquerda, socialistas, comunistas só no nome.

Djijo disse...

Mal cara. Pacifismo é revolucionário (não me refiro ao pregado pelos religiosos pois estes são hipócritas). Na época do golpe vc usou os meios que achou necessários. Para a colega poderia ter ponderado que hoje dificilmente seria necessário tal postura. Se o PV optou pelo Serra, talvez foi pq vc não tava lá, fez falta. Mudar paradigmas também requer ousadia e corragem. Vc se absteve, apenas.

Apelido disponível: Sala Fério disse...

Qual é o partido no Brasil hoje que pode ser classificado realmente como socialista? A ditadura da vanguarda (ou elite partidária) começa no modo como são criados e geridos. A escolha das plataformas, a direção milimétrica de cada passo do movimento são dados a partir dos diretórios, nada é decidida por grandes assembléias. O projeto também não é socialista: é no máximo socializante. Chegar lá e não governar é vexame: vai ter que fazer alianças pelo centro, até mesmo para tentar mudar as próprias normas do jogo político, ou não governa (não aprova orçamento, leis, programas de governo, etc.).

Concordo com o Celso quando diz que não havia outro caminho possível ou visível. O pacifismo da época andava junto com a alienação das drogas e a válvula de escape sexual, o qual acabava servindo ao sistema. A droga e a alienação voluntária, na época, representavam a aceitação tácita do que ocorria de pior.

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