Quando os reacionários de dois continentes tudo faziam para obter a cabeça do escritor Cesare Battisti, era frequentemente citado um caso de direitista cuja extradição havia sido negada pelo Brasil sem que nossa imprensa canalha manifestasse, nem de longe, a mesma indignação: o ditador paraguaio Alfredo Stroessner.
O bom baiano Ismar de Souza acaba de reavivar minhas lembranças de um episódio ainda mais chocante.
Embora ausente do julgamento de Nuremberg, o nazista Gustav Franz Wagner foi condenado à pena capital por haver comandado um campo de extermínio em Sobibor (Polônia) no qual foram executados 250 mil judeus, tendo recebido a Cruz de Ferro por sua eficiência em erradicar as raças inferiores.
Fugiu para o Brasil e, sob identidade falsa, estava morando num sítio da região de Atibaia (SP), quando, em 1978, caiu na besteira de comparecer ao Deops para desmentir notícia de que participara de uma festa em homenagem a Hitler.
Reconhecido, detido e logo transferido para uma clínica psiquiátrica, teve sua extradição solicitada por Israel, Áustria e Alemanha. Acusação: sequestro e assassinato em massa.
Ele, indiscutivelmente, fazia por merecer o apelido de carniceiro de Sorbibor.
O que não impediu o Supremo Tribunal Federal de rejeitar, quase sem debates, os dois primeiros pedidos.
O terceiro rendeu mais papo pra manga. O STF, contudo, acabou concluindo por 8x2 que a pena já estava prescrita pelo Direito alemão (embora não o estivesse pelo Direito brasileiro...).
Ou seja, considerou-se mais qualificado do que os alemães para interpretar as leis alemãs.
Exatamente o que tanto escandalizou a nossa direitalha quando o ex-ministro da Justiça Tarso Genro -- respaldado em ninguém menos do que o maior jurista italiano do século passado, Norberto Bobbio -- aludiu às leis de exceção vigentes na Itália durante os anos de chumbo, quando o Estado tinha o direito de manter sob PRISÃO PREVENTIVA um SUSPEITO de subversão armada por MAIS DE DEZ ANOS!
ALELUIA, GRETCHEN
Pior: Wagner não foi caso isolado de nazista acolhido de braços abertos pelo Brasil.
Historiadores concluíram (ver aqui) que isto se deu com o conhecimento e anuência do presidente Eurico Gaspar Dutra, antigo simpatizante do nazi-fascismo:
"Havia na época uma circular secreta, datada de 1947, que restringia a entrada de judeus no Brasil. Em contrapartida, existia uma missão diplomática em Berlim que não se acanhava em ludibriar a lei para facilitar o ingresso de funcionários do III Reich no País" (professora Maria Luiza Tucci Carneiro, da USP).
"Tudo indica que houve facilitação da entrada de empresários nazistas no Brasil por iniciativa pessoal de Dutra" (Marionilde Brephol Magalhães, autora do livro Pangermanismo e Nazismo - A Trajetória Alemã Rumo ao Brasil).
Libertado, Wagner voltou ao seu sítio e, em menos de dois anos, cometeu suicídio.
Que o diabo o tenha e guarde.
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