(continuação deste post)
Sobre as idílicas proposições para a retomada do desenvolvimento econômico
Destarte, uma vez no poder, a esquerda tem de cumprir a agenda de administração do déficit orçamentário eliminando gastos com demandas sociais, pois estes são menos impositivos do que o pagamento dos juros da dívida, folha de pagamento dos funcionários, manutenção da máquina militar e policial, bem como dos demais poderes do Estado. Administrar a falência do capitalismo não deve ser tarefa de quem se coloca em favor do povo, a menos que se queira exercer tão função por mero interesse econômico, político, fisiológico.
A austeridade financeira estatal não é nem neoliberal, nem keynesiana, mas sim capitalista.
A consigna usada no manifesto, conquista da natureza patriótica, se não for apenas meramente demagógica, é repugnante em termos ideológicos. Denota um nacionalismo pretensamente heroico e certamente ultrapassado, que ignora a dinâmica do mundo one world moldado pela dinâmica capitalista, que está clamando por uma interação transnacional (o que diriam desta proposição os sofridos migrantes europeus?) e não pelo tosco nacionalismo de um Trump ou de um Bolsonaro.
Por afirmar as categorias capitalistas ao invés de denunciá-las (não é por menos que a foice e o martelo, símbolos do trabalho abstrato, produtor de valor e de mais-valia na cidade e no campo, tremulavam nas bandeiras pretensamente revolucionárias), a esquerda perde o referencial libertador que a deveria nortear, trocando-o pela verborragia opressora da busca do poder. Mesmo quando nem sequer se apercebe desta distorção, é sumamente lamentável que nela incorra.
Estado nacional forte, financiado pelos impostos cobrados ao exaurido trabalhador produtor de valor, é proposta para que o oprimido financie ainda mais o seu opressor.
A cidadania é um conceito burguês, estatal. Tanto que qualquer pessoa com dinheiro suficiente pode entrar e residir em qualquer país rico, enquanto os refugiados pobres, expulsos pela desintegração capitalista nos países periféricos, são tratados como indesejados.
Quando Ulisses Guimarães cunhou a expressão triunfalista Constituição cidadã, sabia que estava promulgando uma Carta burguesa na qual estão preservados todos os institutos jurídicos capitalistas, coadunados com o conceito de cidadania.
Assim, ao jurar obediência irrestrita à Constituição, a esquerda propõe a volta à observação rigorosa dos seus institutos, o que equivale a ajoelhar-se diante do capital; da mediação social patrocinada pelo sistema produtor de mercadorias; do trabalho abstrato (a escravidão indireta da coerção tácita do capital); do direito à propriedade; e de todos os demais acessórios categoriais capitalistas.
Ademais, não foi no final de tal ciclo que a insustentabilidade do crescimento econômico do país levou ao desemprego estrutural de 14 milhões de brasileiros e a uma depressão econômica grave, com rebaixamento da nota de crédito do Brasil pelas indefectíveis agências de risco?
Não se deve tentar iludir as pessoas manipulando as cronologias da vida social capitalista, até porque a verdade é revolucionária e a mentira sempre tem pernas curtas.
Karl Marx, o esotérico, não assinaria o tal manifesto, e até mesmo o Karl Marx, o exotérico, teria dificuldades de o assumir. (por Dalton Rosado)
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