sábado, 24 de agosto de 2024

HÁ 55 ANOS, CARLOS LAMARCA EVITOU QUE A ESTÁTUA DO DUQUE DE CAXIAS VIRASSE PÓ NA MADRUGADA DO DIA DO SOLDADO

Amanhã (25) se comemora mais um Dia do Soldado, instituído em homenagem ao Duque de Caxias, que nasceu em 25 de agosto de 1803. A data despertou em mim duas lembranças dos anos de chumbo

Em 1969, um pequeno grupo de esquerda independente procurou a Vanguarda Popular Revolucionária com uma proposta inusitada: queria destruir, na madrugada de 25 de agosto, a estátua do Duque de Caxias que existe até hoje na praça Princesa Isabel, no bairro paulistano de Campos Elísios. 

Havia descoberto que a base era oca, tornando facílimo mandá-la pelos ares. Só precisava de explosivos, que nós tínhamos para fornecer, se assim o decidíssemos.

O Comando estadual da VPR contava, àquela altura, com três membros: José Raimundo da Costa (Moisés), Samuel Iavelberg (Moraes) e eu (Douglas). Aprovamos a ideia, até porque seria uma forma de vingarmos a captura do quarto membro, João Domingues da Silva, o Elias

[Logo adiante esse bravo companheiro morreria de hemorragia, por terem-no torturado antes que se restabelecesse suficientemente do ferimento sofrido na troca de tiros com agentes da repressão.]

Mas o Comando Nacional vetou a ideia, convencido pelo comandante Carlos Lamarca de que seria uma provocação inconsequente e poderia acirrar a bestialidade dos militares contra nós. 

Meu lado racional até concordou, mas passei muito tempo sonhando com a satisfação que sentiria ao infligir tal humilhação à ditadura militar numa data tão simbólica. Teria sido de lavar a alma.
Aqui serviu o professor de tortura Ailton Joaquim. Aqui,  
em junho/1970, me deixaram meio surdo para sempre.
 

A segunda lembrança é de quando eu já estava preso, na PE da Vila Militar: o tenente Ailton Joaquim, considerado um dos dez piores torturadores do período pelo grupo Tortura Nunca Mais, a pavonear-se pelo quartel com a Medalha do Pacificador que lhe entregaram no Dia do Soldado de 1970. 

[Adivinhem onde eu gostaria que aquela latinha fosse enfiada...]  

Frequentemente lembrado por um episódio dos mais repulsivos –torturou presos políticos apenas para demonstrar as técnicas das quais era mestre, durante palestra que fez a oficiais no RJ–, tal tenente foi responsável direto por eu ter ficado para sempre com um tímpano estourado e propensão a labirintite, pois o cabo Marco Antônio Povoreli, espancador de presos indefesos, pertencia à sua equipe.

Dita medalha foi instituída em homenagem a Caxias, chamado de  pacificador  por seus fãs. A pacificação por ele conduzida na Guerra do Paraguai se expressou numericamente no assassinato de 10 mil "pobres, negros e mestiços", segundo historiadores afrodescendentes.

Na era Médici, era comum agraciarem com essa medalha os carrascos da ditadura. E, em plena democracia, os militares aproveitaram o 25º aniversário da quartelada para outorgá-la a mais uma leva de personagens com esqueletos no armário – provocação que a chamada Nova República engoliu da forma mais pusilânime. (por Celso Lungaretti) 
"Relembro nesta hora tudo que ocorreu, memória não morrerá!"

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