terça-feira, 18 de abril de 2023

ESTRATÉGIA DIPLOMÁTICA DE LULA É BEM PENSADA, MAS ARRISCADA


 L
ula faz um jogo complexo e perigoso nas relações estrangeiras, mas age de forma estratégica. Para além da ladainha da mídia brasileira, a qual apenas segue as diretrizes do Departamento de Estado dos EUA, ou seja, faz propaganda estadunidense em questões geopolíticas, a lógica do presidente não é exatamente de tratar do conflito atualmente em curso na Ucrânia, mas da disputa muito maior travada entre dois grandes blocos mundiais em formação. 

De fato, Lula leu corretamente a situação global e visualizou o que a guerra em curso no leste da Europa realmente é, um choque indireto entre EUA e Rússia, em que o governo estadunidense, através da OTAN, usa o povo e o território ucranianos para testar e minar o poderio bélico russo. Quem ainda tiver um pingo de dúvida sobre isso, basta ler os recentes documentos secretos do Pentágono que vieram a público nos últimos dias, pois nele é claríssimo o comando total do exército estadunidense sobre Kiev, a ponto de mesmo as ligações telefónicas de Zelensky com seus generais serem monitoradas em tempo real pelo alto comando militar em Washington. 

Nenhum movimento das tropas ucranianas acontece sem um aval do Pentágono. São especialistas estadunidenses os responsáveis por treinar e coordenar as ações militares ucranianas e se não fossem os armamentos vindos dos EUA, certamente o regime de Zelensky não teria resistido por tanto tempo à ofensiva de Putin. 

Uma no cravo...

Ao mesmo tempo, há um conflito econômico se aprofundando entre EUA e China. Algo antes visto como mera excentricidade de Trump, provou-se ter uma lógica profunda em uma disputa por hegemonia mundial. Obviamente, o país asiático está longe de possuir a mesma capacidade e pujança que a nação norte-americana, mas o mero fato de hoje já concorrer em alguns setores chaves da economia do século XXI, como a área tecnológica, é motivo suficiente para desencadear um choque de grandes repercussões. 

Diante deste cenário, Lula age de modo semelhante a Getúlio Vargas: tenta se balançar entre os dois lados para pegar o máximo possível de ambos. Vargas também fazia algo semelhante nos dramáticos períodos anteriores à Segunda Guerra Mundial, ora pendendo para os EUA, ora para a Alemanha. Conseguia, assim, retirar o máximo de benefícios dos dois lados em disputa, elemento crucial para o avanço econômico do Brasil naquele período.

O atual presidente faz o mesmo cálculo. Dando uma no cravo, outra na ferradura, tenta conseguir vantagens dos dois lados, cortejando uma hora Biden, outra Xi Jinping, mais uma outra Putin. Parceiro historicamente preferencial, os EUA certamente devem ter tirado a mesma lição hoje que a tirada por Roosevelt há quase noventa anos, é preciso agradar o Brasil com dólares.

Porém, a situação hoje é pior que a do período pós-crash, pois à época existia o New Deal que garantiu aos EUA um respiro capaz de apaziguar as tensões internas e capitalizar o governo a ponto de distribuir dinheiro para outros países, algo inexistente no contexto atual. 

... outra na ferradura. 

Lula, portanto, pode estar apostando alto, entrando em um jogo complexo e de cálculo arriscadíssimo. Pode dar certo, mas também pode dar muito errado. No entanto, não há muito de diferente a ser feito, pois a condição colonial do capitalismo brasileiro, sua improdutividade crônica e a virada neoextrativista não deixa espaço para uma ação autóctone, passando apenas a inversão de valores do estrangeiro ser o caminho. 

Mas, ao seguir as pegadas de Getúlio, Lula tem de ter consciência que a estratégia tem um limite. Quando a Guerra finalmente explodiu e Pearl Harbor foi bombardeada pelos japoneses, o Brasil precisou tomar uma decisão e decididamente optar por um dos lados da disputa. Pode não estar longe o dia que o atual presidente brasileiro terá de enfrentar decisão semelhante. (por David Emanuel Coelho


3 comentários:

Anônimo disse...

https://elpais.com/opinion/2023-04-18/lula-busca-su-eldorado-para-acabar-dependiendo-de-china.html

Anônimo disse...

Maria Cristina Fernandes - Brasil arma a cama para Lavrov deitar — e rolar
https://gilvanmelo.blogspot.com/2023/04/maria-cristina-fernandes-brasil-arma.html

Luiz Carlos Azedo - Com a visita de Lavrov, Lula deu o terceiro drible a mais
https://gilvanmelo.blogspot.com/2023/04/luiz-carlos-azedo-com-visita-de-lavrov.html

Neves disse...

Enquanto Xi faz amizade com líderes mundiais, ele endurece sua posição sobre os EUA - The New York Times
https://www-nytimes-com.translate.goog/2023/04/20/world/asia/xi-china-us.html?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=pt&_x_tr_hl=pt

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