Muito se falou e escreveu sobre o factoide palhaço histérico x caçador de holofotes, quase sempre para zoar alguém cujo maior defeito não é ser ridículo, mas sim genocida.
Fico chocado ao constatar que ele ter sido o indiscutível e principal responsável pela morte evitável de algo entre 50 mil e 500 mil brasileiros não basta para sepultar definitivamente sua carreira política, conduzi-lo à prisão e tornar seu nome maldito até o fim dos tempos.
Que país é este? O que foi feito da nossa gente? Como chegamos a tamanha desumanização?
Eu morreria de vergonha se hoje viajasse pelo mundo e fosse visto pelos gringos como conterrâneo dessa miniatura extemporânea de Hitler. Até que este pesadelo seja esquecido eu não botarei os pés fora do Brasil.
Mas, já que a tantos compraz ficar usando essas besteirinhas como compensação pelo que não se ousou fazer (o impeachment do celerado assim que passou a sabotar o combate científico à pandemia de covid), vou levantar aqui os pontos que estão sendo omitidos ou desfocados nessa discussão rasteira:
— nas turminhas de rua de que eu participava lá pelos meus sete, oito anos de idade, qualquer um sabia que deixar a molecada perceber quando uma gozação o machucara era dar-lhe quilometragem e acabar vendo o insulto transformar-se em apelido;
— vítimas frequentes desse tipo de estigmatização eram os esquisitos (como um menino com musculatura imponente e uma certa teatralidade no falar e outro que, por causa da ascendência alemã ou austríaca, era vermelho como um pimentão) e os afeminados;
— neste último caso estavam meninos que, aparentemente por conviverem apenas com mulheres, não falavam e agiam de acordo com os padrões da rua –até por desconhecê-los– e não davam as demonstrações de virilidade comuns aos moleques daquele tempo, na encarniçada disputa por prestígio que travavam o tempo todo;
— estes eram fortemente pressionados a passarem de meros mariquinhas a viados, ou seja, a se sujeitarem a ser sodomizados (mesmo que os garanhões nem sequer fossem aptos para um desempenho à altura e estivessem apenas blefando ou seja, fazendo farol, como se dizia então):
— alguns dos mariquinhas ficavam no meio termo, nem conseguindo igualar-se aos outros em machismo exibido, nem cedendo às cantadas que recebiam;
— tendiam, então, a passar o resto da vida marcados por tal bullying, obcecados em ser como adultos os personagens que não conseguiram ser quando crianças;
— podem ser reconhecidos pela misoginia reativa (as meninas não davam muita bola para os frouxos, preferindo os mais machinhos) e pelas encenações de força que dão o tempo todo, só chegando às vias de fato, contudo, quando surgem oportunidades para eles descarregarem sua raiva contra os mais fracos, enquanto continuam refugando na hora de enfrentarem desafios de verdade (amarelam agora como amarelavam outrora).
Para bom entendedor, meia palavra basta. (por Celso Lungaretti)
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