Em sua linguagem e abordagem circunspectas, características de um jornalão centenário da imprensa burguesa, o editorial deste sábado (7) de O Estado de S. Paulo simplesmente reclama a aplicação da Lei do Impeachment ao recordista mundial de crimes de responsabilidade, Jair Bolsonaro.
E isto logo no parágrafo inicial, conforme os leitores constatarão abaixo. Não é pouca coisa.
Morro de vergonha ao constatar que seja o jornal mais paradigmático do conservadorismo brasileiro quem exija o desencadeamento da luta que a esquerda tinha a obrigação política e moral de estar, sem tréguas, travando desde o primeiro ano do governo mais medíocre, ruinoso e genocida da história republicana deste país. (CL)
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É PRECISO REAGIR AOS CRIMES DE BOLSONARO
O Congresso e a Procuradoria-Geral da República têm o dever de reagir às ameaças e agressões que Jair Bolsonaro vem cometendo contra a Constituição, a legislação eleitoral e a Lei 1.079/1950 (Lei do Impeachment). Não podem ficar passivos perante tão insistente violência do presidente da República contra a ordem jurídica e o regime democrático.
No dia 5 de maio, Jair Bolsonaro anunciou que as Forças Armadas vão realizar uma tarefa inteiramente estranha às suas competências constitucionais. "As Forças Armadas não vão fazer papel de chancelar apenas o processo eleitoral, participar como espectadoras do mesmo", disse Bolsonaro.
Com tal anúncio, verdadeira ameaça contra o processo eleitoral, o presidente da República violou a Constituição que jurou defender.
As Forças Armadas "destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem", diz a Constituição. Não é papel dos militares tutelar eleições.
Entre os crimes de responsabilidade, a Lei 1.079/1950 inclui "incitar militares à desobediência à lei ou infração à disciplina".
De forma evidente e continuada, o que Jair Bolsonaro tem feito é incitar a que Marinha, Exército e Aeronáutica se sintam autorizados a agir fora de suas competências constitucionais. Ao contrário do que disse Bolsonaro, as Forças Armadas são rigorosamente espectadoras do processo eleitoral. É assim que funciona num regime democrático.
Meses atrás, Jair Bolsonaro incitou o Congresso a colocar-se contra o processo eleitoral. Felizmente, o Legislativo foi prudente e rejeitou as propostas do Palácio do Planalto. Em vez de proporcionar maior segurança e confiabilidade, o projeto do voto impresso introduzia fragilidades no sistema, suscitando situações para novas e velhas fraudes. Era descarada tentativa de impor o retrocesso num processo eleitoral que funciona muito bem, de forma rápida, segura e confiável.
Na ocasião, Jair Bolsonaro prometeu acatar a decisão do Congresso. Não apenas não cumpriu sua promessa, como tenta agora envolver as Forças Armadas em sua campanha de deslegitimação do processo eleitoral.
Infelizmente, a incitação de Jair Bolsonaro para que as Forças Armadas atuem fora de suas competências não é um perigo abstrato ou distante. P. ex., o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, sentiu-se no direito de pedir ao Tribunal Superior Eleitoral a divulgação de propostas das Forças Armadas sobre o processo eleitoral. O ofício do ministro da Defesa é um total disparate, a revelar incompreensão sobre o funcionamento de um Estado Democrático de Direito.
O convite para que as Forças Armadas participassem, em função consultiva, sem nenhum poder decisório, da Comissão Externa de Transparência da Justiça Eleitoral não autoriza o ministro da Defesa a exercer pressão pública sobre o TSE, opinando sobre o que a Corte deveria dar publicidade.
Cabe ao TSE ser muito firme na defesa de suas prerrogativas constitucionais, sem transigir com esse tipo de pressão, que, de uma só vez, agride a independência do Judiciário e extrapola as competências das Forças Armadas.
Como se não bastasse, Jair Bolsonaro anunciou que seu partido, o PL, vai contratar uma empresa para auditar as eleições. A legislação eleitoral prevê essa possibilidade, mas não é bem isso o que Bolsonaro quer. Ele deseja criar atrito com a Justiça Eleitoral e desconfiança nas urnas. Já até anunciou a pretensa jogada: "Ela (a empresa) pode falar ‘aqui é impossível auditar’ e não fazer o trabalho. Olha a que ponto vamos chegar", disse.
Com essa conduta, Jair Bolsonaro incorre noutro crime de responsabilidade, previsto no art. 7.º da Lei 1.079/1950: "Utilizar o poder federal para impedir a livre execução da lei eleitoral".
O País tem, portanto, lei para punir Jair Bolsonaro pelo que está fazendo. Cabe ao Congresso e à PGR torná-la efetiva. Não é tempo de covardia. Ao permitirem que o presidente da República perturbe as eleições, como há tempos está fazendo, as instituições a quem caberia impedi-lo prejudicam a si mesmas.
Afinal, no regime sonhado por Bolsonaro, o Congresso, o Ministério Público e outras expressões do poder soberano do povo não têm nenhuma serventia. (transcrição na íntegra do editorial d'O Estado de S. Paulo de 07/05/2022 – os grifos em verde são do editor deste blog)
Um comentário:
Telegram, la desinformación y la derecha en Brasil - The New York Times
https://www.nytimes.com/es/2022/05/05/espanol/opinion/brasil-bolsonaro-telegram.html
Lula launches campaign to reclaim Brazilian presidency from Bolsonaro | Luiz Inácio Lula da Silva | The Guardian
https://www.theguardian.com/world/2022/may/07/lula-launches-campaign-to-reclaim-brazilian-presidency-from-bolsanaro
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