Se eu fosse um burguês social-democrata num país economicamente dominante, proferiria um discurso a favor do imigrante, que é útil para fazer os serviços que os nacionais rejeitam (lavar pratos, banheiros, cuidar de doentes ricos e de idosos, recolher o lixo das ruas e separar os materiais recicláveis, etc.).
Se eu fosse um burguês conservador condenaria a corrupção com o dinheiro público, exigindo a punição rigorosa dos envolvidos, inclusive com achaques policiais veiculados pela grande mídia ao vivo, principalmente sob o manto do Poder Judiciário e do Ministério Público, e aproveitando as brechas da lei, até porque entenderia que salvar as finanças públicas é salvar o capitalismo.
Se eu fosse um burguês social-democrata, diria que a corrupção sempre foi praticada pelos governantes de direita sem que estes jamais fossem punidos, e que o repentino combate escrupuloso à corrupção não passa de uma perseguição a quem defende os trabalhadores.
Se eu fosse um burguês conservador, defenderia os princípios republicanos capitalistas e suas práticas desumanas como se fossem o Graal da santidade, não hesitando em dar um golpe militar quando tais princípios estivessem real ou pretensamente ameaçados, pois consideraria justificável rasgar a Constituição em nome da defesa do republicanismo constitucionalmente estatuído.
Se eu fosse um burguês social-democrata, defenderia os princípios republicanos capitalistas, mas torceria o nariz para as aventuras militares totalitárias, que nos privariam do bom e velho Estado de Direito burguês.
O prato mais pesado da balança será o prato dos ricos? E é por isto que a Justiça está mais próxima dele? |
Se eu fosse um burguês social-democrata, faria uma lei da anistia niveladora, no sentido de que as atrocidades cometidas pelos militares durante o regime de exceção fossem equiparadas às ações dos que lutaram contra o arbítrio.
Se eu fosse um burguês conservador, negaria a lisura do voto e condenaria o voto eletrônico, alegando ser o mesmo susceptível de manipulação, como se o voto impresso estivesse isento de fraudes.
Se eu fosse um burguês social-democrata, defenderia o voto eletrônico e seus mecanismos de controles externos e, assim, reforçaria o processo democrático eleitoral burguês como a legítima expressão da soberania da vontade popular.
Se eu fosse um burguês conservador, defenderia a livre circulação popular mesmo dentro de uma pandemia assassina e negaria as vacinas (principalmente as originárias de países tidos como comunistas, mesmo sem sê-los), porque, afinal, o capitalismo não pode parar.
Se eu fosse um burguês social-democrata defenderia as vacinas como forma de apressar o retorno à normalidade burguesa, tão necessária para a sustentação do emprego e a extração da mais-valia.
Se eu fosse um burguês conservador, apoiaria a guerra de conquista iniciada por um autocrata qualquer como forma de demonstração de sua força e dos benefícios da imposição da vontade dos poderosos sobre os cidadãos comuns.
Se eu fosse um burguês social-democrata mais à esquerda, apoiaria a mesma invasão e a guerra como legítima alternativa ao domínio burguês ocidental e seu imperialismo, e tudo sob a sombra de uma bandeira vermelha cada vez mais desbotada.
Se eu fosse um burguês conservador defenderia medidas econômicas próprias do liberalismo de Milton Friedman, mas não hesitaria em mudar os rumos das coisas e virar keynesiano de carteirinha caso a economia estivesse afundando.
Se eu fosse um burguês social-democrata no governo, idem, idem.
Ufa!
Mas, sou um revolucionário emancipacionista, com tudo que tal definição implica (negação da forma-valor, de seus padrões monetários e suas mercadorias tangíveis, Estado, poder vertical, constituição burguesa e direito burguês, trabalho abstrato, trabalhador, partidos políticos, eleições burguesas, etc.).
Consequentemente, sou defensor de uma estrutura social de base, com um modo de produção social sem mensuração monetária e voltado para a satisfação das necessidades sociais,
Então, eu não voto! (por Dalton Rosado)
Um comentário:
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"Eu sou eu e minha circunstância" é a parte mais famosa da frase "Eu sou eu e minha circunstância, e se não salvo a ela, não me salvo a mim", de autoria do filósofo espanhol José Ortega y Gasset, publicada em 1914 (in Meditaciones del Quijote).
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A primeira parte dessa frase, "Eu sou eu e minha circunstância", encerra uma concepção do homem como um "eu-circunstância", indissociável do seu meio.
O "eu" é distinto da realidade à sua volta, mas inseparável desta.
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A segunda parte da frase, "se não salvo a ela, não me salvo a mim", exprime a idéia de que o homem que "quiser salvar-se, deverá também salvar sua própria circunstância", isso é, a realidade à sua volta.
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Mas, como!?
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Contra armas nucleares como se tornar auto-suficiente e independente de taxas, impostos, pedágios, normatizações arbitrárias e a falta de escolhas?
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Ocorre que, contra todas as adversidades, renitentemente, teimosamente, com escassos recursos e meio como a água, amoldando-se às circunstâncias, porém procurando tentam criar algo menos monstruoso.
Destaco desta feita uma "empresa" localizada em Glória de Goitá e Ibimirim/PE.
serta.org.br
O SERTA Serviços de Tecnologias Alternativas
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Sertanejos, naturalmente.
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Ah! O ego e sua sombra!
Conclui a pouco a leitura de Bacantes (Eurípedes de Salamina).
Que imensa lição o "deus" Dionísio vem trazer.
Veja-se Agave. Nobre matrona, mãe do rei, entretanto, entrega-se as orgias e mata o próprio filho durante o delírio.
O homem nega, o homem reprime, o homem se regra, o homem se diz ser... mas, a sombra, a ménade, a bacante interna sempre dá jeito de sair.
Atente-se a Penteu, vestido de mulher, a espiar os sacros ritos dionisíacos.
E não há como parar!
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Hoje Dionísio retorna a via pública.
E é melhor que seja assim.
Evoé!
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