quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

PRECISAMOS FALAR SOBRE O SIGNIFICADO PARA A ESQUERDA DE UMA ALIANÇA COM O FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO EVANGÉLICO

Quando se confirma a entrada no Supremo Tribunal Federal de uma figura duplamente nefasta (carreirista e fundamentalista religioso ao mesmo tempo), é preciso falar um pouco a respeito do papel dos evangélicos na sociedade. 

A respeito do personagem em questão e do apoio a ele dado pelo petismo oportunista, farei adiante um artigo específico, daí não tratar disso aqui. 

Possuo aquilo que o identitarismo contemporâneo chama de lugar de fala para abordar o tema evangélicos. Tendo mãe evangélica e grande parte da família materna seguidora de tal religião, estive dentro das paredes petencostais até os meus 16 anos, daí conhecer bem toda a prática política, econômica e ideológica do dito agrupamento. 

Assumi o ateísmo em tenra adolescência, antes mesmo de suspender em definitivo minha participação na comunidade religiosa; tenho, desde então, refletido a respeito da lógica religiosa no capitalismo atual. 

O chamado fundamentalismo religioso, fenômeno surgido no século 19 nos EUA, foi uma reação conservadora às interpretações liberais da bíblia patrocinadas por teólogos das grandes universidades daquele país e da Europa. 

A lógica do fundamentalismo é retomar aos fundamentos, isto é, aos princípios bíblicos tal como expressos literalmente. Por isso, o fundamentalismo é avesso a qualquer hermenêutica bíblica. 

Ao contrário do que se pensa, o fundamentalismo cristão é anterior ao islâmico. 
Merecia vaga no STF quem se avacalhou ao ponto de
perseguir cartunista só porque o Bozo mandou?
 
 

O mundo mulçumano sempre possuiu larga tradição filosófica de leitura do Alcorão. Foram intelectuais de extrema-direita que importaram a leitura fundamentalista do mundo ocidental e geraram o movimento fundamentalista islâmico. 

A ideologia fundamentalista gera uma hostilidade profunda à racionalidade. Sua negação de qualquer hermêneutica do texto religioso desemboca numa uma negativa geral a qualquer compreensão da realidade que não se ajuste ipsis literis aos princípios dogmáticos da fé. 

Esta lógica de condenação da racionalidade leva a uma desvalorização da mediação linguística e à super valorização da experiência mística. 

Por isso, os evangélicos dão grande apelo ao transe, às orações, ao louvor emotivo, ao exorcismo. Pior, os próprios princípios da fé são revelados de forma eminentemente mística, sem intermediação da linguagem, o que os tona francamente arbitrários e inquestionáveis, pois são considerados revelações do Espírito Santo. 

A negação do discurso e o apelo à experiência mística, sempre individual, está na base, inclusive, dos cismas e da criação infinita de novas congregações, pois cada qual acredita ter ele a interpretação e a ideia correta da fé. 

Não havendo parâmetro comum para interpretação e norteamento da prática, tudo passa a ser válido, prevalecendo, no frigir dos ovos, a capacidade de cada líder em convencer com seu discurso emotivo.  
Do ponto de vista estrutural, de modo geral, o fundamentalismo religioso é assim. Mas, nem de longe isso explica seu sucesso social. Aí é preciso entender sua inserção dentro da sociedade capitalista.

É reacionário por origem o fundamentalismo, pois tem como base histórica uma negação das interpretações liberais da bíblia. Ou seja, sua origem é uma negação à racionalização da experiência religiosa. 

Aprendemos com Lukács, a partir de Marx, que o irracionalismo é estimulado pelo sistema capitalista justamente para obstacularizar a compreensão da dinâmica social da exploração de classes e de sua desumanidade.

Mais que isso até. O irracionalismo é o resultado necessário de um sistema social baseado na reprodução da forma-valor sem consideração às necessidades humanas. Um sistema irracional gera uma lógica irracional de viver e entender a realidade. 

O fundamentalismo religioso, assim, é produto do capitalismo e útil a ele, ao mesmo tempo. Produto por se originar da própria irracionalidade do sistema e útil por retroalimentar essa irracionalidade em prol da perpetuação do sistema. 

Por isso, a igreja evangélica é uma estrutura reacionária afeita ao domínio burguês contrarrevolucionário. Ela existe para domesticar e subjugar o povo, submetendo-o aos ditames capitalistas. E aqui, as exceções deste ou daquele evangélico progressista ou mesmo revolucionário entra apenas enquanto exceção de uma dinâmica ontológica. 

Não à toa, as igrejas evangélicas crescem na miséria e na crise, pois se trata do momento propício para aparecerem oferecendo uma saída mística, de apaziguamento psicológico, ao indívíduo desorientado. 

Mais do que isto, ela cresce na ausência da organização revolucionária, na ausência da teoria social racionalmente correta. 

Quando a esquerda, tal qual o PT, se torna eleitoreira e abdica de esclarecer os trabalhadores sobre as causas de sua condição, o irracionalismo avança. 

Pior ainda é quando (como novamente faz Lula e sua turma) a esquerda acena e estabelece alianças com o fundamentalismo. Equivale a pedir para ser engolido por ele, mas disto também falarei noutra oportunidade. (por David Emanuel Coelho) 

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