dalton rosado
FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO NA CORTE SUPREMA
Sérgio Moro, mesmo não sendo uma sumidade como jurista (nem sequer soube evitar as nulidades processuais que poderiam invalidar a sua falsa bandeira anticorrupção), caso eleito, servirá aos interesses da direita de modo menos imprudente e atabalhoado que o atual presidente.
André Mendonça, idem, Trata-se de um advogado da União experimentado e reconhecidamente competente como tal, capaz, portanto, de fundamentar bem os seus votos conservadores como ministro do Supremo Tribunal Federal, aos olhos do público e de seus pares. O direito, como a Bíblia, tem argumentos para justificar tudo.
Estamos, portanto, diante de possibilidades sombrias no cenário da política institucional, pois se esboça o abandono eleitoral do Boçalnaro (somente as aves de rapina do PL querem aproveitar o restante da carcaça putrefata do final de governo) e, ao invés de uma autocrítica dos seus eleitores, vemos a migração da sua turma para uma 3ª via eleitoral que nada mais é do que a velha via udenista de falso moralismo elitista.
Por seu turno, no Judiciário a posse do Mendonça representa a defesa de interesses conservadores nos costumes e elitista na economia
André Mendonça quando estava pedindo a Bolsonaro licença para ir fazer pipi |
Isto porque, cada vez mais, vem ocorrendo a judicialização das questões político-econômicas em face da atuação do centrão e em consonância com as medidas de restrições orçamentárias impostas pelo default das contas públicas (todos os governos são obrigados a salvar o Estado falido) decorrentes da debacle capitalista mundial e, especialmente, nacional.
As respostas de Mendonça às perguntas sobre racismo, homofobia, misoginia e alinhamentos religiosos fundamentalistas (tão comuns aos milionários ou bilionários vendilhões dos templos, donos das entidades religiosas a proliferarem diante de uma população que, desesperada, busca cura de doenças, conforto espiritual e esperança numa vida melhor, terrena ou espiritual), sendo ele bom advogado, foram fundamentadas habilmente.
Soube mentir e não está nem aí para o pormenor de que a mentira é pecado...
Preparou-se para separar falaciosamente a sua obediência bíblica na vida e aos preceitos constitucionais e legais na judicatura, cujas decisões devem estar submissas à lei e à jurisprudência dominante da ordem democrático-burguesa.
Para um conservador religioso como Mendonça, nada melhor do que as próprias leis vigentes e toda a entourage de suportes institucionais.
Quando ele elogia a institucionalidade e sua democracia burguesa ("todos podem criticar a política; podem criticar o processo eleitoral e os políticos; podem criticar o judiciário; podem criticar o executivo; mas nada é melhor do que a democracia"), ele está sendo ao mesmo tempo equivocado no conteúdo do conceito, mas convergente com os postulados político-econômicos que vai defender.
[Postulados que têm levado o Brasil a uma situação de barbárie social, com aumento da criminalidade, falência empresarial, desemprego e fome, apesar de nosso país ser celeiro alimentar do mundo.]
Não, Mendonça, a democracia burguesa não é o último e superior estágio civilizatório das sociedades. Pelo contrário, está suficientemente comprovada a falência do republicanismo capitalista pretensamente iluminista e seus cânones constitucionais.
E o pior é que o seu apego à institucionalidade constitucional (quando isto for conveniente às elites e à manutenção do status quo estabelecido) e a derivação disto para o apelo aos preceitos bíblicos conservadores, com boa fundamentação jurídica (quando se fizer necessário tal recurso retórico de justificativa de voto) vão sempre estar presentes nos votos que proferir...
Mas, isto como ministro de uma Corte Suprema que se pretende laica?! Não será terrivelmente impróprio e inaceitável?
A miséria brasileira não tem sido boa conselheira. Aliás, os países mais pobres do mundo (desde Haiti até as ditaduras sangrentas da África) são os que mais se apegam à religiosidade como tábua de salvação e mais apoiam os fariseus salvadores da pátria e seus exércitos de morte e dominação pela força.
O Brasil cada vez mais caminha nesta direção, em que pese a nossa imensa riqueza material e o razoável nível de conhecimento intelectual da chamada classe média brasileira.
A grande ruptura que se engendra socialmente não diz respeito à consolidação de um processo político-econômico pretensamente democrático (mas que é déspota a partir da manipulação eleitoral do voto e da permanência do Estado protetor do capital), mas de uma outro estrutura de produção social e de um ordenamento jurídico que lhe se já consentâneo.
Tal fermento de ruptura está na mente da juventude de modo ainda embrionário, pouco claro, mas vai tomando forma. Provas disto são as de que:
— o segmento político e seus partidos são alvo do escárnio popular;
— o Judiciário é ineficiente em termos administrativos e elitista nas suas decisões, não se constituindo num instrumento de distribuição de justiça social;
— o Legislativo, por aqui liderado pelo Centrão (dominante no Brasil, com suas sub-sedes em partidos de aluguel ou não) representa a síntese da corrupção com o cada vez mais parco dinheiro do erário e o alinhamento a todos as medidas antipovo que o capital determina; e
— o Executivo, administrador da falência estatal e sem capacidade de, ao mesmo tempo, atender às demandas sociais e cumprir a sua função de indutor do desenvolvimento econômico (leia-se capitalismo), daí cair amiúde em descrédito popular, num eterno pêndulo eleitoral entre governantes de esquerda e de direita como consequência de sua ineficácia administrativa.
Mas, diz o velho provérbio, água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.
De tanto escárnio com o sofrimento do povo e a falência sistêmica mundial, é possível que as contradições de depressão do capitalismo terminem por bater às portas dos países que detêm a hegemonia econômica mundial (e já há sintomas disso).
A insatisfação das ruas num país com o povo instruído e acostumado ao conforto que as chamadas ilhas de prosperidade podem ainda proporcionar (digamos o G6 com a exclusão da China e seus imensos contingentes populacionais empobrecidos) não deve ser desprezada: talvez por lá o desmoronamento da democracia burguesa, ora em processo de decomposição orgânica.
A eleição para o STF de um ministro terrivelmente evangélico, que até ontem era subserviente a um governo genocida, representa um retrocesso terrivelmente institucionalizado, e como ele se diz crente, termino por citar este preceito bíblico de Isaías:
"Ai dos juízes injustos e dos que decretam leis injustas! Daqueles que não deixam haver justiça para os pobres, para as viúvas e para os órfãos! Sim, porque a verdade é que chegam até a roubar as viúvas e os órfãos!"
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