Esta semana, lamento registrar, o governo de Jair Bolsonaro completa mil dias de destruição do país, das instituições e da nossa imagem no mundo.
O pior é que ainda faltam 457 dias para este pesadelo acabar.
Para onde se olha, só encontramos escombros daquela que já foi a sexta economia mundial, com pleno emprego aqui dentro e respeitada lá fora, em todos os fóruns internacionais, um país que saiu do Mapa da Fome e foi pioneiro na defesa do Meio Ambiente, reduzindo as queimadas e o desmatamento.
Hoje, o Brasil está pegando fogo e passando fome, como mostraram as reportagens publicadas no UOL neste final de semana sobre as famílias que recolhem restos de comida no lixo e ossos nos açougues.
Falta água nas torneiras e comida nos pratos, enquanto a Amazônia é ocupada, com apoio do governo, por pecuaristas passando a boiada, sojicultores, garimpeiros e outros trogloditas invadindo reservas indígenas.
Foram mil dias de horror, ira e morte, os piores dias da vida da imensa maioria dos brasileiros, inclusive dos devotos da seita bolsonarista que ainda apoiam o mito e morrerão abraçados com ele.
Duvido que exista um único brasileiro capaz de apontar algo de positivo, um só projeto criado pelo governo federal neste período (o Bolsa Família, agora com outro nome, já existia antes), para nos dar a esperança de uma vida melhor.
Só os militares e o mercado financeiro não podem reclamar, com seus privilégios mantidos e ampliados em todas as reformas.
Ainda não viramos a Venezuela, a nossa bandeira não é vermelha (só na conta de luz), mas é muito pior. Estamos cada vez mais parecidos com o Afeganistão dos talibãs, com as milícias soltas nas ruas, cada vez mais armadas.
Nestes malditos mil dias, nos tornamos um país pária, temido pelo mundo civilizado e ridicularizado na imprensa mundial.
É nesse cenário de desolação, tristeza e dor das quase 600 mil famílias que choram seus mortos na pandemia, que este governo da necropolítica tem a coragem de programar uma semana de comemorações para os mil dias de governo. E a lista de inaugurações de obras para festejar a data é a maior prova da inércia e desmazelo da administração federal, da falta de políticas públicas e de um programa de governo.
Só para se ter uma ideia das ações coordenadas por todo o país esta semana, para recuperar a popularidade do presidente, a festa começa nesta terça-feira (28) com a entrega de 200 unidades habitacionais em Maceió, nas Alagoas. Repito: duzentas!
De lá, a comitiva presidencial segue no mesmo dia para Teixeira de Freitas, na Bahia, onde Bolsonaro e ministros vão entregar 5,4 km de duplicação da BR-116 e mais 5 km da BR-101. Dá para acreditar que baterão bumbo para inaugurar 10 km de asfalto num país onde as estradas estão apodrecendo por falta de manutenção?
Na quarta-feira, eles vão até Boa Vista, em Roraima, para inaugurar a Usina Termelétrica de Jaguatirica, no momento em que o país corre o risco de um apagão federal de energia, por falta de planejamento e incúria dos setores responsáveis.
E assim segue a procissão até sexta-feira, quando a comitiva presidencial chega a Maringá, no Paraná, para inaugurar a reforma do aeroporto da cidade, reduto do líder do governo, Ricardo Barros, e do ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, bolsonarista de primeira hora que ficou pelo caminho e hoje ganha a vida nos Estados Unidos.
Com certeza, vão gastar mais dinheiro nessas viagens do que nas obras, em plena campanha pela reeleição, paga com verbas públicas.
Para quem já viajou até São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, só para inaugurar uma ponte de madeira de 20 metros de comprimento, construída pelo Exército, tudo é motivo de festa.
Mas é isso tudo que o governo tem para apresentar, depois de mil dias de mandato, num país de 212 milhões de habitantes, assolados pelo desemprego e pela fome, sem nenhum plano de recuperação econômica para o pós-pandemia? Por falar nisso, que fim levou o super ministro Paulo Guedes com seu Posto Ipiranga?
Recolhido a um silêncio obsequioso, depois da Declaração à Nação escrita por Michel Temer, Bolsonaro não ataca mais diariamente o Supremo, o Congresso e a imprensa, desistiu do voto impresso (até rimou!) e até da cloroquina, e agora quer mimetizar Juscelino Kubitschek, inaugurando obras.
Se não fosse tudo tão trágico, seria apenas patético, ridículo. Mais de seis décadas atrás, Juscelino rasgou milhares de quilômetros de estradas de norte a sul, industrializou o país, fez o Brasil sentir orgulho do Brasil e, ainda por cima, inaugurou Brasília, dançando uma valsa.
Vão comemorar o quê, agora?, ainda que mal me pergunte, ao ver tantas famílias vivendo nas calçadas e sob os viadutos, sem esperanças de melhorar de vida, a indústria nacional em coma, tantas lojas fechadas, a educação e a saúde entregues a sacripantas e o Ministério da Defesa (de quem?) nas mãos de um general terrivelmente bolsonarista.
Nem o mais criativo roteirista da Globo seria capaz de escrever este enredo para uma série de ficção de horror sobre a destruição de um grande país, em tão pouco tempo. Que me perdoem minha filha e meu genro.
Bolsonaro conseguiu tornar isso real.
Vida que segue. (por Ricardo Kotscho)
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