sexta-feira, 26 de março de 2021

OS DONOS DO PIB ESTÃO DANDO UMA ENQUADRADA NO GENOCIDA DESVAIRADO/2

(continuação deste post)
S
entindo a pressão, o governo recua com cara de desespero; mente descaradamente em pronunciamento televisivo à nação; muda o rumo da conversa e convoca os representantes dos poderes Legislativo e Judiciário para um acordão de sustentabilidade governamental. 

A carta faz inicialmente uma exposição dos números da tragédia brasileira na área econômica apontando a queda do PIB em 4,1% em 2020, e já aumentando no primeiro trimestre de 2021; 14% de desempregados; 5,5% milhões de pessoas como redução da força de trabalho, para concluir que tudo se deve à pandemia. 

Discordamos desta análise que coloca unicamente nos ombros da pandemia toda a debacle da economia. Já em 2019, quando ainda não havia pandemia, ocorreu um crescimento pífio do PIB brasileiro, de apenas 1,1%; e os organismos internacionais (FMI, OCDE, ONU, entre outros) apontavam para uma queda no crescimento da economia mundial para 2020. 

A pandemia agravou o quadro de queda das atividades econômicas, e isto é verdadeiro. Entretanto, mais do que isto, demonstrou a incompatibilidade entre vida sustentável e economia mercantil utilitária (a produção mercantil usa a necessidade de consumo para existir, e não para satisfazê-la como princípio humanista). 

A explicitação de tal oportunismo talvez tenha sido o único aspecto positivo da pandemia diante de um custo tão alto de vidas humanas. Os mortos, nos seus silêncios sepulcrais, conspiram contra o genocídio capitalista pandêmico. 
O que mais me impressiona na carta é, no final, ela restringir-se unicamente a quatro proposições de combate à pandemia como forma de revitalização da economia, como se a retomada do crescimento econômico, que já vinha cambaleante, tivesse o condão de restaurar de modo saudável a vida social.

Esquecem-se de condenar a execrável concentração da riqueza brasileira e os privilégios de sua elite insensível, inclusive do segmento político, até porque os signatários, ou a representam como altos executivos, ou dela fazem parte (as exceções somente confirmam a regra).

Nenhuma proposição se refere a mexer na comprovada concentração de riqueza das elites brasileiras, que afronta pela desigualdade social visualmente comprovada de dois brasis justapostos geografica e socialmente.

Nenhuma medida de ampliação de direitos relativos à posse de bens servíveis à moradia e exploração da terra agrícola.

Nenhuma proposição de apropriação das nossa riquezas alimentares no sentido de saciar a fome que se alastra entre os desempregados que a carta afirma estarem aumentando (vale ressalvar que o documento é favorável à concessão transitória do auxílio emergencial que movimenta a economia, mas é fato também que tal paliativo tem um custo de endividamento cuja conta será paga mais tarde pelos brasileiros pobres).

Nenhum proposição de subsídio ou mesmo congelamento de cobrança de contas de abastecimento de água e fornecimento de energia elétrica (pelo contrário, têm subido os preços do gás de cozinha e combustíveis, obedecendo às regras de mercado).

Neste artigo recente, elenquei proposições em tal sentido, algumas dentro da lógica capitalista e outras estruturantes, avessas à dita cuja, que não apenas seriam emergencialmente satisfatórias, como educativas para a população compreender que toda riqueza material socialmente produzida deveria sê-lo em seu benefício e não em favor do capital concentrador de riqueza abstrata segregacionista. 

A pior pandemia que nos assola é termos de viver sob a égide da forma-sujeito mercantil, responsável pelo impasse atual da humanidade, e que está a clamar por uma novo modo de produção e ordem jurídico-social de organização horizontal que sejam consentâneas com as exigências do novo tempo. (por Dalton Rosado

Um comentário:

SF disse...

Grande Dalton, a frase "a produção mercantil usa a necessidade de consumo para existir, e não para satisfazê-la como princípio humanista" demonstra o seu poder de síntese. E, como dizia Feynman, só quem tem conhecimento consegue expor algo, que é complexo, de maneira simples.
***


Related Posts with Thumbnails