Após 367 dias da epidemia de Covid, o Brasil beira 255 mil casos confirmados de mortes pelo Sars-CoV-2, fora a subnotificação. Na 5ª feira (25) o país bateu recorde de sete meses atrás e registrou 1.582 vítimas –as diagnosticadas, repita-se.
A média móvel alcançou 1.150 óbitos por dia. Chegamos ao pior estágio da pandemia, e duas calamidades se prenunciam:
— a situação ainda vai se agravar muito;
— continuamos privilegiando as falsas batalhas e no caminho certo de perder a guerra.
Há quem deplore a metáfora bélica, talvez porque o governo esteja infestado de militares e vários deles passem hoje por exemplos de incompetência, pusilanimidade e depravação. O capitão tornado presidente é aquele deputado que elogiava impunemente tortura, fuzilamento e estupro –deu no que deu.
Faz muita falta aquele senso de empatia e comunidade que empurra cidadãos no mesmo rumo, como num conflito. Na refrega atual, o único objetivo digno é salvar as vidas passíveis de salvação. Ao abandonar máscaras e distanciamento, contar com vacinas não compradas e eleger alvos errados, multiplicamos as mortes evitáveis.
Como se não houvesse um morticínio em curso, perdemos dias preciosos mesmerizados com um programa de TV em que exibicionismo e voyeurismo se mesclam na vivência de paixões vicárias.
Um deputado federal desqualificado antes mesmo de eleger-se sequestrou a pauta do Supremo Tribunal Federal e do Congresso.
A nova legislatura, que escolheu na Câmara um presidente acusado de violência doméstica, mobiliza-se contra o STF para consagrar na Constituição o direito parlamentar à impunidade. Isso quando deveria atropelar de novo o Planalto e votar o prolongamento do auxílio emergencial para amparar os brasileiros que sofrem o pior da pandemia.
O Superior Tribunal de Justiça, que nada ostenta de justo ou superior, rebaixa-se ao contrariar decisões anteriores para, na prática, inocentar o senador filho do presidente da República dado a rachadinhas. No comando da manobra, o magistrado que só tem olhos para a sinecura de uma vaga no STF, enquanto milhares se asfixiam pelo país.
[Médicos não são cientistas, já se disse; pior ainda quando são bolsonaristas que rezam pelo conhecido credo para exorcizar a ciência.]
Foi quanto bastou para um sem-número de progressistas, pessoas razoáveis e equilibradas (entre as quais amigos e fontes), atacarem esses diários com virulência. Entende-se que alguns acreditem ser obrigação moral dos jornais recusarem anúncio negacionista, mas há também quem sustente ser essa uma decisão comercial defensável.
Errado está o alvo. Escandaloso é ver médicos defendendo o indefensável. O Conselho Federal de Medicina, dominado por acólitos de Jair Bolsonaro, se omite e comete prevaricação similar à do Congresso ao fazer vista grossa para delitos recorrentes dos políticos da família, no passado e no presente.
Governadores e prefeitos também se acovardam na epidemia. Mas eles ao menos podem dar a desculpa de ter dois vírus genocidas para combater ao mesmo tempo, um nos hospitais, outro em palácio.
O pior ainda está por vir, pelas mãos sujas do capitão Jair Bolsonaro e do general Eduardo Pazuello. Escolhamos melhor contra quem nos insurgir nesta hora. (por Marcelo Leite, na Folha de S. Paulo)
TOQUE DO EDITOR – Meu caro Marcelo, creio não haver dúvida nenhuma quanto a quem seja o verdadeiro responsável pelo genocídio, até porque o general Pazuello, mostrando total resignação com seu papel de ordenança de capitão, afirmou em alto e bom som que "um manda e o outro obedece". (por Celso Lungaretti)
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