demétrio magnoli
GUIA PRÁTICO DO VOTO
Não vote em candidatos que:
A crítica dura do adversário faz parte do jogo. Mas exibi-lo, explícita ou implicitamente, como inimigo do povo, revela uma alma antidemocrática.
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Os regimes tirânicos apoiam-se no conceito de que as sociedades estão divididas entre cidadãos leais e traidores, aos quais se reserva a prisão, o degredo ou a morte. A figura retórica do inimigo do povo é a transposição dessa ideia às condições postas pelo sistema democrático.
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Candidatos que operam por essa lógica estão cometendo uma fraude. O jogo democrático parte do pressuposto de que todos as candidaturas são expressões legítimas da pluralidade ideológica da sociedade. Tratar o rival eleitoral como inimigo do povo é violar as regras que asseguram o direito de candidatura do próprio acusador.
Tais candidatos não passam de espertalhões enrolados em bandeiras.
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Samuel Johnson classificou o patriotismo como último refúgio do canalha, num contexto em que distinguia os autodefinidos patriotas do patriotismo genuíno.
O segundo é o patriotismo cívico, isto é, o chamado a um esforço nacional comum pelo bem-geral. Já o primeiro é o nacionalismo vulgar, destinado a extrair proveito pessoal do sentimento de coesão nacional.
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A pátria é de todos os cidadãos —e, portanto, nenhum partido singular pode querer representá-la. A pretensão abusiva descortina espíritos autoritários: embriões de ditadores.
3. falam em nome de Deus.
Tais candidatos colidem tanto com os princípios terrenos que governam a disputa eleitoral quanto com os valores da fé que alegam praticar. São falsários, duplamente.
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Deus não tem partido. Fazer campanha usando o nome de Deus é tão patético quanto agradecer a Deus por um gol marcado. Não há fé nenhuma nas duas atitudes, mas mera ignorância ou, mais provavelmente, baixa esperteza. O Estado é laico, única garantia de liberdade para todas as religiões. O programa oculto do candidato que porta a cruz é exterminar a liberdade religiosa.
4. alegam representar corporações.
São aqueles que exibem-se como representantes de policiais, professores, médicos, advogados, juízes ou procuradores. Os candidatos que adicionam um qualificativo profissional a seus nomes (professor X ou Y, doutor isso ou aquilo) pertencem a essa coleção de pescadores das lagoas do corporativismo..
O Brasil moderno nasceu sob o signo do corporativismo varguista, que continua a nos assombrar. As corporações são atores legítimos do jogo das sociedades abertas, por meio de associações e sindicatos que vocalizam suas reivindicações, exercendo pressão sobre governos e órgãos legislativos. Mas as eleições não devem se subordinar às suas agendas.
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A Câmara Federal, as Assembleias Legislativas e as Câmaras Municipais existem para espelhar a pluralidade política da sociedade, ou seja, dos cidadãos. Transformá-las em fóruns corporativos é calar a voz dos indivíduos não organizados em associações ou sindicatos e, ainda, falsear a representação das próprias corporações, que têm regras próprias para eleger seus representantes.
Tais candidatos são bandidos fantasiados nas roupagens de cidadãos do bem. De fato, o que querem é fragmentar as polícias em milícias privadas, em esquadrões da morte. Não passam de bandos de vigilantes com passaporte para assassinar.
(por Demétrio Magnoli)
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