É hilária, no gênero de humor negro, a longa reportagem que a revista piauí publicou, de autoria da jornalista Mônica Gugliano: O dia em que Bolsonaro decidiu mandar tropas para o Supremo (acesse aqui).
Comédia por comédia, eu prefiro, contudo, O rato que ruge (d. Jack Arnold, 1959), sobre uma república das bananas que decide declarar guerra aos EUA, esperando ser derrotada e depois obter ajuda para sua reconstrução – uma alusão sarcástica ao Plano Marshall. Por dois motivos:
— Peter Sellers era um grande ator, Jair Bolsonaro nem para chanchadas presta;
— o plano dos governantes de Fenwick chega a parecer equilibrado e sensato, se comparado com o chilique grosseiro e grotesco do rato que ruge brasileiro.
A reportagem o mostra fora de si ao receber a notícia de que o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, consultara a Procuradoria-Geral da República sobre a possibilidade de apreender seu celular e o do filho Carlos, uma formalidade de rotina face a uma notícia-crime apresentada por três partidos.
Tão desinformado quanto desequilibrado, Bolsonaro rodou a baiana e passou a gritar, espumando de ódio: "Vou intervir! Vou intervir!".
Quais os delírios de um anormal que passavam por sua cabeça? Estes, segundo a Mônica:
"Bolsonaro queria mandar tropas para o Supremo porque os magistrados, na sua opinião, estavam passando dos limites em suas decisões e achincalhando sua autoridade. Na sua cabeça, ao chegar no STF, os militares destituiriam os atuais onze ministros.
Os substitutos, militares ou civis, seriam então nomeados por ele e ficariam no cargo até que aquilo esteja em ordem, segundo as palavras do presidente.
No tumulto da reunião, não ficou claro como as tropas seriam empregadas, nem se, nos planos de Bolsonaro, os ministros destituídos do STF voltariam a seus cargos quando aquilo estivesse em ordem".
Depois de uma caricata reunião de cúpula –cujo relato nos transmite a mesma sensação de mediocridade abissal daquele outro show de horrores encenado por alguns dos mesmos personagens, cuja gravação foi exibida aos brasileiros por ordem do STF– conseguiram finalmente tirar-lhe aquela ideia fixa da cabeça oca:
"Dois argumentos ajudaram a acalmar Bolsonaro na reunião.
O primeiro: não havia ordem para apreender seu celular, apenas uma consulta do ministro do STF, de modo que ainda havia a possibilidade de que a apreensão não ocorresse.
(De fato, dez dias depois, Celso de Mello arquivou o pedido de apreensão, mas, em sua decisão, fez questão de mandar um recado ao presidente, dizendo que o descumprimento de uma ordem judicial configuraria gravíssimo comportamento transgressor.)
O outro argumento: o governo daria uma resposta contundente ao STF na forma de uma nota pública. Combinou-se na reunião que o general Heleno assinaria a nota".
Mas, independentemente do que o ridículo aprendiz de ditador pensava que poderia fazer, baseando-se em interpretações falaciosas sobre um poder moderador que os militares não estão de maneira alguma autorizados pela Constituição a desempenhar (Ives Gandra Martins melhor faria se continuasse apenas ensinando aos ricos como pagarem menos impostos ou nenhum imposto), a realidade dos fatos está é neste outro trecho da reportagem:
"Entre os militares da reserva, estão os saudosos da ditadura militar. Eles defendem a radicalização do governo, inclusive com a adoção de medidas de exceção.
A situação é outra entre os atuais comandantes, que têm tropa e poder. Esses querem distância da polarização política e rejeitam qualquer hipótese de intervenção militar.
Nos três últimos meses, enquanto Bolsonaro minimizava a pandemia e apoiava manifestações radicais na frente de quartéis, as três forças – Marinha, Exército e Aeronáutica – se encarregaram de adotar um comportamento oposto, participando das ações de combate à Covid-19.
No mesmo dia em que Bolsonaro fez pronunciamento na tevê dizendo que a pandemia era um problema sério na Itália, mas não no Brasil, o comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, publicou um vídeo dizendo que a crise sanitária talvez seja a missão mais importante de nossa geração".
Ou seja, se a turma do deixa disso não tivesse impedido Bolsonaro de intervir, certamente (e bota certeza nisso!) teria quebrado a cara e, como consequência, sido reconduzido à insignificância do qual um destino insólito o retirou, para desgraça dos brasileiros. (por Celso Lungaretti)
2 comentários:
Celso,
A ascensão de JB não tem nada de "destino insólito".
Nós erramos feio e só nos resta lamber as feridas e recomeçar com o que nos sobrou.
É o que acontece na vida.
As vezes, a recuperação é lenta. As lesões custam a cicatrizar.
Mas, um belo dia, estamos saudáveis de novo.
Enquanto os patifes se digladiam em disputas intestinas.
Como terminaria o III Reich se eles vencessem?
Digo: cobra engolindo cobra.
É o que está acontecendo agora.
"Por um destino insólito" é um filme da Lina Wertmuller, então o que eu fiz foi uma citação. Quis aludir ao fato que só uma teia de acontecimentos muito raros e bizarros poderia ter levado à presidência um fascista tão medíocre e inepto.
O cenário era propício, sim, mas foi uma peça que o destino nos pregou, a de a chance existente ser aproveitada por um sujeito evidentemente desequilibrado, cheio de traumas mal resolvidos do passado, que melhor estaria no divã de um psicanalista.
Por piores que fossem Jânio, Collor e Dilma (outros que não terminaram o mandato), em comparação com o Bozo, os três seriam gênios da raça...
Postar um comentário