quinta-feira, 9 de abril de 2020

JOSIAS DE SOUZA: 'REPRESENTANTE DO ESTADO ESCULHAMBADO, MANDETTA NEGOCIA COM CRIME ORGANIZADO'

Num país como o Brasil, que se equilibra à beira do vácuo, há muitas definições para abismo. Mas nada se parece mais com o fundo do buraco do que um Estado que, para levar serviços essenciais como saúde às comunidades pobres, precisa negociar com a bandidagem. 

Henrique Mandetta informou que o combate ao coronavírus no Rio envolverá esse tipo de negociação:
"Começamos o primeiro plano de manejo. E não vou falar em que comunidade será." 
O ministro fez uma declaração muito parecida com uma rendição: 
"Você tem de entender que são áreas em que, muitas vezes, o Estado está ausente. Quem manda é o tráfico, quem manda é a milícia. Como a gente constrói essa essa ponte em nome da vida? A Saúde dialoga, sim, com o tráfico, com a milícia, porque eles também são seres humanos e precisam colaborar, ajudar, participar." 
Sob Wilson Wietzel, vigorava nos pedaços pobres do Rio apenas a política estadual baseada na teoria do tiro na cabecinha. Agora, se a delinquência permitir, os agentes de saúde subirão o morro armados de testes e medicamentos. 

Como os criminosos já dão as cartas há muito tempo e, mesmo assim, o brasileiro continua assistindo às suas novelas e se esforçando para pagar os seus carnês, o país vivia a ilusão de que o inferno seria apenas uma ficção admonitória que nunca se tornaria uma realidade irrefutável.

Foi preciso uma pandemia para lembrar o Brasil da existência de si mesmo. 

Integrante de um governo civil em que ministros militares se esforçam para presidir um presidente ingovernável, Mandetta tornou-se a face do Estado esculhambado. Negociará a saúde dos morros cariocas com o crime organizado. 

Se o time de Mandetta tiver dificuldades de interlocução, o ministro pode interromper o isolamento social do ex-PM Fabrício Queiroz, o faz tudo do clã Bolsonaro. Trata-se de um PhD em milícia. (por Josias de Souza)
.
Toque do editor — Mandetta não deverá ter dificuldade para acertar os ponteiros com os chefões do crime organizado, que são suficientemente sensatos para perceber quantos prejuízos terão se uma pandemia devastar sua clientela; portanto, convém-lhes colaborar com as autoridades sanitárias.

Um ponto a favor do ministro é que até hoje ele tem conseguido, embora a duras penas, suportar as pirraças e maluquices de um presidente miliciano. Ou seja, alguma experiência prévia ele possui.

Mas, se parece talhado para a nova missão, talvez a antiga (que tanto o vem estressando ultimamente) pudesse ser confiada a um profissional mais apto a fazer-se entender por aquele em quem estaria tentando incutir um pingo de racionalidade. Eu sugeriria um paleontólogo. (por Celso Lungaretti)

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails