O atual presidente brasileiro, eleito num pleito eivado de ilegalidades, abuso de poder econômico e difusão de fake news em escala desmedida, é um político profissional que:
— ao longo de 30 anos de vida política (sete mandatos eletivos como deputado federal e um como vereador, tendo pertencido a nove diferentes partidos), foi cínico a ponto de posar de outsider na eleição de 2018, recebendo os votos daqueles que acreditaram no seu discurso de que a força das armas deve sobrepujar a magnitude da razão;
— ao longo de 30 anos de vida política (sete mandatos eletivos como deputado federal e um como vereador, tendo pertencido a nove diferentes partidos), foi cínico a ponto de posar de outsider na eleição de 2018, recebendo os votos daqueles que acreditaram no seu discurso de que a força das armas deve sobrepujar a magnitude da razão;
— que critica a ditadura militar de 1964-1985 por haver torturado ao invés de matar, estimando em pelo menos 30 mil opositores aqueles que, no seu entender, deveriam ter sido exterminados;
— que apoia quem prendeu arbitrariamente os descontentes com o regime e demitiu funcionários públicos administrativamente, segundo critérios superficiais e sem nenhum crivo judicial;
— que não considera corrupto um regime que abriu as portas para que militares reformados de alta patente pudessem ser testas-de-ferro de grandes empresas públicas e privadas, nacionais e multinacionais (estas últimas objetivando a obtenção de privilégios especiais);
— que tem como ícones governantes do naipe dos generais Augusto Pinochet (Chile), Alfredo Stroessner (Paraguai) e Jorge Rafael Videla (Argentina), os quais, no século passado, seguiram a trilha de golpes militares latino-americanos programados no exterior que prendiam, torturavam, matavam cidadãos pelo simples fato de terem opiniões contrárias aos golpistas, e ainda sequestravam crianças dos seus pais assassinados para as doarem a famílias de terceiros interessados e coniventes;
— que tem como ícone brasileiro o deslustrado e sinistro coronel Brilhante Ustra, que torturava e matava presos políticos indefesos, afirmando tal admiração sem o menor pejo e fazendo disso bandeira eleitoral;
— que em 15 anos de carreira militar, na qual atingiu o posto de tenente (só ascendeu a capitão por promoção regimental decorrente do seu afastamento para a reserva) destacou-se principalmente pela insubordinação contra a defasagem dos soldos militares – razão pela qual ele apoia as badernas policiais-militares sob o mesmo argumento, nas quais os amotinados usam capuzes e trajam camisetas com seu retrato, assaltam carros de particulares, impõem o fechamento do comércio e incitam a violência urbana já insuportável);
— que cotidianamente faz afirmações misóginas, homofóbicas, grosseiras, deselegantes, além de dar exemplos deploráveis para a cidadania.
— que cotidianamente faz afirmações misóginas, homofóbicas, grosseiras, deselegantes, além de dar exemplos deploráveis para a cidadania.
Diante de todo seu currículo, mais de mau político que de mau militar, não temos como duvidar das pretensões ditatoriais de quem, elegendo-se com tais bandeiras (assumidas publicamente e diante de um quadro de recessão econômica que levou grande parte da população sofrida a acreditar em salvadores da pátria), dentro do processo eletivo democrático burguês e alçando-se ao poder institucional pelo voto, pretende cuspir no prato em que comeu.
As evidências são gritantes de que a quimera liberal capitalista do ministro Paulo Guedes não é factível como fora prometido para os eleitores (principalmente diante de um quadro de recessão econômica mundial anunciada desde o ano passado e que agora é agravada com a pandemia do novo coronavírus que, apesar de sua gravidade, está sendo usada para fins inconfessáveis da guerra concorrencial mundial de mercado).
E não há mais como negar a perspectiva sombria de um crescimento pífio da economia em 2020, na linha do que já ocorreu em 2019, com a agravante de que o ano atual herda um déficit do último orçamento público, da ordem de R$ 100 bilhões (Guedes havia prometido zerá-lo em 2019)
Vários setores da indústria estão paralisando suas atividades por falta de reposição de peças industriais e não se sabe o que virá depois da queda vertiginosa da Bolsa de valores, que em apenas dois dias teve uma queda de 9,0%, uma dos maiores os últimos anos.
Ademais, a popularidade de Bolsonaro derrete rapidamente, estando agora circunscrita aos fanáticos, aos crédulos e aos desinformados.
Face a todos esses fatores adversos, ele e sua trupe parecem ter adotado uma nova estratégia: a sustentação pela força militar, apoiada pelo mobilização popular.
Entretanto, e felizmente para nós, o Brasil não é a Venezuela.
O balão de ensaio lançado pelos seus seguidores e orientadores de campanha eleitoral olavistas, terraplanistas, milicianos, viúvas da ditadura e neo-udenistas defensores do moralismo rançoso nos costumes e hipócrita no combate à corrupção, não alçou voo e isto já podemos afirmar antes mesmo do resultado das manifestações marcadas para 15 de março.
A sociedade brasileira é plural, mesmo que dirigida politicamente de modo elitista e com altos níveis de concentração de renda na economia. Tal pluralidade de vertentes de pensamentos com experiência histórica (todos se lembram receosos de 1985, quando os militares deixaram o governo pela porta dos fundos, com a economia em frangalhos e após estuprarem os direitos civis e jurídico-constitucionais dos brasileiros por 21 anos perdidos) fez com que os organismos vivos da sociedade civil se pronunciassem em uníssono contra o balão de ensaio golpista, que propõe o repúdio ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal.
Não devemos nos esquecer que, no golpe de 1964, vários organismos da sociedade civil apoiaram a usurpação do poder, acreditando na ladainha da defesa da honra e dos bons costumes, contra a corrupção com o dinheiro público e contra o perigo vermelho comunista.
Agora o espírito do tempo é outro.
Organismos como a CNBB, OAB e a ABI; partidos políticos de centro e até conservadores (caso do PSL, pelo qual se elegeu o presidente); governadores; os presidentes da Câmara Federal e do Senado; ministros do STF e personalidades dos mais variados segmentos da intelectualidade, das ciências, dos esportes e das artes, se posicionaram contra as pregações de quebra da institucionalidade oriundas dos boçalnarianos das mídias sociais, diante do silêncio omisso ou da aprovação velada daqueles que têm por missão zelarem pelo respeito à ordem constitucional.
A formação de um ministério presidencial composto pelo generalato de pijama, que já não detém o comando de tropas, não significa que a cúpula ministerial miliar da ativa e seu corpo dirigente vejam com simpatia as aventuras destrambelhadas de um grupo de fanáticos, liderados por alguém que, de modo indisciplinado, um dia negou os compromissos de juramento militar e seguiu na careira política.
Os boçalnaristas veem derreter a popularidade de quem tinham como mito e estão completamente desconectados com a realidade mundial de crise capitalista irreversível – crise que está a clamar por um novo contrato social, voltado para a satisfação das necessidades de consumo e sustentabilidade ecológica.
Os boçalnaristas veem derreter a popularidade de quem tinham como mito e estão completamente desconectados com a realidade mundial de crise capitalista irreversível – crise que está a clamar por um novo contrato social, voltado para a satisfação das necessidades de consumo e sustentabilidade ecológica.
Estão desconectados, também, com uma nova realidade comportamental de costumes que não se coaduna com o fundamentalismo religioso retrógrado que vê pecado nas mais elementares manifestações de liberdade comportamental.
Desligada a tomada da energia golpista, devemos aproveitar o vácuo de poder que se prenuncia para uma discussão construtiva sobre uma forma de convivência social que tenha o ser humano como centro das nossas preocupações. (por Dalton Rosado)
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