dalton rosado
O CONTEÚDO DO DISCURSO PROGRAMÁTICO-POPULISTA
DO LULA AGORA LIVRE
Em seu discurso de 45 minutos no palanque armado em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP), o ex-presidente Lula foi o mais autêntico personagem dele mesmo.
Carismático como sempre, ainda que o conteúdo do seu discurso já desperte desconfiança até mesmo entre trabalhadores menos escaldados, Lula foi o mais legítimo representante do populismo social-democrata.
Os meus quase 50 anos de estudo e observação da cena política institucional cuja atuação inclusiva hoje renego, permitem-me extrair as contradições e impropriedades de um discurso cheio de apelos populistas que, infelizmente, podem calar fundo em muitas mentes desavisadas e açoitadas pelo capitalismo que lhes rouba qualquer esperança.
Por outro lado, sua arenga pode ser capaz de açular o ódio nos recalcitrantes representantes do conservadorismo governamental.
Quer o fim desta penúria? Aguente até as eleições de 2022 e aí, quem sabe... |
Todas essas posturas imanentes à lógica capitalista representam uma bipolaridade inconsequente cujo resultado é a perpetuação da exploração social... e a insatisfação coletiva desnorteada.
Ao contrário do peixe que tentou vender com sua retórica mais do mesmo, não são as mudanças (aliás, cosméticas) propostas por Lula dentro do capitalismo que redimirão o povo. Isto só vai acontecer com a superação de governos e governantes, para a qual ele jamais contribuiu nem pretende contribuir doravante.
Diferentemente da ladainha entoada por Paulo Guedes, o capitalismo está longe de ser a forma de relação social capaz de retirar da miséria 3 bilhões de seres humanos, pois só faz aprofundá-la, agora acoplada à agressão irracional ao meio ambiente:
— terrestre (vide os lixões nas grandes e pequenas cidades);
— fluvial (o rio Tietê, p. ex.),
— marítimo (petróleo derramado na praias nordestinas, a proliferação de plásticos e dejetos nos mares, etc.); e
— atmosférico (causador do efeito-estufa responsável pelo genocida aquecimento global).
"Capitalismo é a causa maior das misérias sociais" |
É cruel para quem tem sensibilidade emancipacionista a possibilidade de ressurgimento da bipolaridade eleitoral burra que coloca em lados falsamente dicotômicos os pretensos defensores do povo, todos eles inseridos numa mesma imanência capitalista que é a causa maior das exclusões e misérias sociais.
O que pontua no discurso de Lula é a contradição intrínseca de conteúdo, aliada a uma implícita crença ideológica de que o capitalismo pode ser humanizado.
É contraditório ele atacar a concentração de renda (segundo dados recentes, há 206 bilionários nadando em dinheiro e mais da metade dos brasileiros vive com apenas R$ 413 por mês) e, ao mesmo tempo, afirmar que se estivesse no governo a Ford não teria fechado sua fábrica no ABC paulista.
Ora, será que a empresa Ford, abrindo e fechando unidades de produção mundo afora em busca de mão-de-obra barata para fazer face à concorrência de mercado, não está entre as muitas representantes do capital industrial internacional que é a causa da concentração de renda?
Lula ressalva em sua falação, sem pestanejar, que não tem nada contra essa gente (do mundo dos ricos) e que, com bons governantes, é possível consertar o país. Ou seja, ele deixa implícito que crê no atendimento das necessidades dos trabalhadores sob o tacão do capital, bastando votar nas pessoas certas.
Esta concepção denuncia a sua visão sindicalista da relação capital e trabalho, segundo a qual os trabalhadores não devem almejar a superação do trabalho e de sua condição de trabalhadores, fontes primárias da formação do capital e de sua exploração
"os trabalhadores não devem almejar a superação do trabalho" |
Assim, só lhes restaria contribuir para que o capital se desenvolvesse, na esperança que disto decorresse um tratamento menos desumano para sua mão-de-obra.
Tal postura, além de equivocada, é uma aceitação do jugo capitalista e da perpetuação da exploração do homem pelo homem, desde que a aristocracia operária, os dirigentes sindicais e o segmento político que deveria representar os explorados (como o PT e seus parlamentares, prefeitos e governadores), continuem a existir e a administrar a máquina opressora estatal e as verbas eleitorais milionárias.
Quando ele diz haver uma banda podre no Judiciário, no Ministério Público e na polícia, implicitamente admite a existência de uma banda boa e, assim, releva a submissão dos órgãos jurisdicionais à lei burguesa, ao seu conteúdo de classe e à função institucional que os órgãos do Estado capitalista exercem (pela sua própria natureza de regulamentação e manutenção de uma ordem de relação social mercantilista).
A necessidade de dita ordem ser humanizada é reconhecida pelo próprio Lula, sem nunca dar o passo seguinte e chegar à raiz do problema: trata-se hoje de uma missão impossível, só nos restando superá-la no seu ethos essencial. (por Dalton Rosado)
(continua neste post)
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