quinta-feira, 5 de setembro de 2019

GOVERNO OU MOSTRENGO IDEOLÓGICO? O PRESIDENTE TEM VIÉS DITATORIAL E O GURU ECONÔMICO É UM LIBERAL ANACRÔNICO – 9

continuação deste post)
Francisco Julião e as Ligas Camponesas: a reforma agrária tinha bem mais a ver em 1964...
Sobre a reforma agrária – O capitalismo tem na produção industrial de mercadorias manufaturadas o seu carro-chefe na geração de valor válido, capaz de sinalizar para a colocação de moeda nova em circulação sem que cause inflação.

Considera-se como valor válido aquele não existia até o momento em que o insumo é extraído da natureza e processado na produção pelo trabalho abstrato e maquinaria, transformando-se em mercadoria. 

Quando se analisa a composição do PIB dos países detentores de valores expressivos, como os Estados Unidos, China, Japão, França e Alemanha, vamos constatar a importância do setor industrial (secundário da economia), ainda que seja o setor de serviços (terciário da economia) o mais expressivo na composição do PIB, mesmo não sendo produtor de valor válido, pois apenas transfere de mãos valor já existente (daí a certeza de tanta emissão de moeda sem lastro).

O setor agrícola, (primário da economia), ainda que seja produtor de valor válido, nunca representa soma considerável de valor econômico. Nos EUA, maior produtor de grãos do mundo, o setor agrícola gera apenas 1,9% do PIB.
...do que agora, mas a esquerda estacionou no século passado.
Fiz este preâmbulo para deixar mais claro que a reforma agrária – ou seja, a divisão de terras para a produção de mercadorias – se constitui numa bandeira capitalista, pois é capaz de manter a subsistência alimentar e ocupação de grandes contingentes de trabalhadores não absorvidos pelo setor industrial graças à produção vital de alimentos para os trabalhadores desse setor a preço compatíveis com o trabalho necessário (aquele pago aos trabalhadores para a sua mera subsistência). 

Assim mesmo, observa-se nos países capitalistas liberais ou capitalistas de estado, que fizeram a reforma agrária já há bastante tempo, uma nova concentração de terras nas mãos de grandes empresas agrícolas sediadas em terras nas quais são passíveis a produção de alimentos em grande escala e com altos níveis de produtividade.

As terras que, não se enquadrando na economia de escala, destinam-se à mera sustentação dos pobres produtores, não podem competir no mercado, daí resultando desde a pobreza do campo (e a migração urbana) até o abandono de terras tidas como improdutivas dentro desse quadro capitalista de produção. 

No Brasil, país de baixa densidade demográfica, ainda não se fez a reforma agrária, pois nossas elites políticas, com sua burrice crônica, ainda não compreenderam que se trata de uma bandeira capitalista. O último governo que quis acelerar a reforma agrária (Jango Goulart) foi deposto pelos militares como comunista, sob aplausos de políticos, empresários e dos setores eclesiásticos atrasados!!!

Os antigos coronéis, proprietários de latifúndios no semiárido do nordeste brasileiro, há muito abandonaram as suas terras (juntamente com os trabalhadores rurais) e foram morar nos centros urbanos mais próximos. 
Reforma agrária despenca nos últimos governos

Os filhos de tais coronéis, que estudaram e se formaram em cursos superiores, produzem para os setores secundário e terciário da economia. Os filhos dos trabalhadores rurais, agora citadinos, que não puderam estudar, são trabalhadores desqualificados profissionalmente que amargam os baixos salários e o desemprego estrutural.  

Diante deste quadro, o Movimento dos Sem Terra, em que pese a sua meritória intenção de dar terras aos que nelas querem trabalhar, está contaminado pelo vírus da propriedade rural (que é categoria jurídica capitalista, diferente do conceito de posse) e da produção de mercadorias. 

Ou seja, os despossuídos querem destituir o proprietário para serem proprietários, numa jornada que está a priori, e sob tais propósitos, condenada ao fracasso, antes por imposição da lógica de mercado do que pelo recalcitrante preconceito da elite política da bancada ruralista e dos latifundiários brasileiros.

Sob o governo do presidente Boçalnaro, o ignaro, reforma agrária é palavrão. 

Mal sabe ele e sua equipe que até os latifundiários nordestinos se queixam da suspensão da desapropriação de suas terras improdutivas, pois, para eles, é melhor receber títulos da dívida agrária do governo por terras avaliadas sob critérios inconfessáveis, do que ter que sustentar os custos dos impostos e da conservação de terras abandonadas.

O MST no nordeste perdeu sua função, pois se restringia à ocupação de terras improdutivas e abandonadas como forma de obtenção de propriedades territoriais cujos módulos rurais logo adiante seriam abandonados ou vendidos a preço vis. Os proprietários rurais já têm saudade dos tempos em que o governo desapropriava as suas terras improdutivas e pagava por elas. 

Com sua burrice ignara profunda e ideológica de ultradireita, o governo que aí está desagrada a gregos e troianos. 
Faltou esclarecer: comida para o povo ou para o mercado?
Qualquer pessoa que se digne a enfrentar as veredas rurais nordestinas verá, desolada, as ruínas de casas nas quais outrora moravam os sofridos trabalhadores rurais; e poderá também constatar a desertificação causada pelo aquecimento global que produz secas intermitentes e longas. 

No sul, sudeste e centro-oeste brasileiro, grandes produtores de itens agrícolas, o poder da vigorosa produção agrícola brasileira (mesmo que isso não represente grandes somas de valor quando comparadas aos produtos industriais manufaturas e até aos agrotóxicos comprados a preços de ouro) não admite falar-se em reforma agrária, até pelos preços proibitivos das terras perante um governo economicamente combalido. 

Este é o quadro da reforma agrária brasileira, que, a exemplo de outros fenômenos sociais mundo afora que aqui chegaram com imenso atraso ou nem sequer chegaram (estamos, p. ex., entre os últimos a abolirem a escravidão negra), cada vez mais fica relegada às calendas gregas. (por Dalton Rosado)
(continua neste post)

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails