sexta-feira, 5 de julho de 2019

SAMBA DO PRESIDENTE DOIDO – 1

Por Celso Lungaretti
Em 1968, o inesquecível jornalista Sérgio Porto, que adotava o pseudônimo de Stanislaw Ponte Preta, compôs uma impagável sátira dos sambas-enredos sobre acontecimentos históricos que então estavam em voga e eram verdadeiros shows de besteiras

Seu Samba do crioulo doido antecedeu em meio século a inacreditável ignorância e imbecilidade da corte atual, principalmente do rei, dos príncipes herdeiros (melhor seria dizer desordeiros...) e da quota de bizarros e aloprados abrigados no Ministério.

Até como homenagem ao grande Sérgio Porto, este blog inspirou-se no seu fino humor para denominar uma série (que promete ser uma das mais longas já vistas na blogosfera!), enfocando as maluquices produzidas ou ensejadas pelo pior presidente brasileiro de todos os tempos.

Pois sua gestão tem como características básicas o ultradireitismo e uma incompetência tão extrema que se torna anedótica. Trataremos, nesta seção, apenas dos episódios que se enquadram na segunda categoria.
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GARGANTA PROFUNDA — O jornalista e escritor Rubens Valente constata que Jair Bolsonaro, em entrevista coletiva no Japão, admitiu ter cometido uma contravenção e delatou Sergio Moro como seu cúmplice, ao fazer a seguinte afirmação sobre o inquérito da Polícia Federal que apura a laranjada do PSL:
"Ele [Moro] mandou a cópia do que foi investigado pela Polícia Federal pra mim. Mandei um assessor meu ler porque eu não tive tempo de ler."
Além disto, com sua incurável incontinência verbal, o presidente revelou ter determinado a Moro (o qual, por sua vez, repassaria o recado à Polícia Federal) que investigasse todos os partidos e não apenas o dele:
"Tem que valer para todo mundo, não ficar fazendo pressão em cima do PSL para tentar me atingir".
Ou seja, Moro vazou para Bolsonaro a cópia de uma investigação que tramita sob segredo de Justiça na 26ª Zona Eleitoral de Minas Gerais e este a repassou a um assessor. Os três, aos olhos da lei, são contraventores.

Quanto à orientação sobre como a Polícia Federal deva efetuar seu trabalho, só em reinados ou em estados policiais o principal mandatário mete o bedelho em assuntos desta natureza. No mundo civilizado, as polícias são instituições a serviço do Estado e não dos caprichos de governantes.
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QUE REI SOU EU? Com desempenho péssimo nos seis primeiros meses e seus índices de aprovação despencando cada vez mais, a continuidade do Governo Bolsonaro depende fundamentalmente da aprovação da Reforma da Previdência exigida pelos donos do Brasil

Dilma Rousseff caiu porque prometeu entregar a encomenda e não honrou o compromisso. O catastrófico Bolsonaro só está sendo suportado porque o mercado ainda espera dele a aprovação desta e de outras medidas desumanas e merecidamente impopulares.

Mesmo assim, Bolsonaro tudo tem feito para atrapalhar a reforma, começando por deixar o trabalho pesado inteiramente nas costas de Paulo Guedes e de Rodrigo Maia, enquanto move céus e terras em função de ninharias como a demissão de um fiscal que cumpriu o dever de multá-lo e aberrações como o liberou geral de armas de fogo.

Agora, quando tudo parecia finalmente caminhar na direção determinada pelo sistema, Bolsonaro fez dos privilégios a policiais um cavalo de batalha, batendo o pé no que abriria uma fresta para outros lobbies também exigirem tratamento diferenciado.

Aqui já nem se trata mais de estado policial. A visão que ele parece ter do seu cargo é do tempo das monarquias absolutas.
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MÉDICI NÃO DESCIA PARA O GRAMADO  Emílio Garrastazu Médici, o ditador responsável pelo período mais sanguinário do regime militar, utilizava o futebol para se popularizar, comparecendo ao Maracanã nos clássicos dominicais com um rádio de pilha colado ao ouvido e batalhões de segurança ao redor.
Bolsonaro vai além, descendo ao gramado para comemorar a vitória brasileira numa mera semifinal (!) de Copa América (!!), participando de um arremedo de volta olímpica (!!!), enquanto recebia uma monumental vaia, entremeada com alguns aplausos e gritos de Mito!.

E não perde nenhuma oportunidade de levantar a bola murcha do Neymar, como se receber o apoio de um notório misógino ajudasse o jogador a livrar-se da acusação de estupro. 

O efeito pode até ser o contrário: muitos que, como eu, lhe concedem a atenuante de que provavelmente o imbroglio terá começado numa tentativa de extorsão, não suportam vê-lo apadrinhado por um troglodita que considera uma honra para as mulheres serem estupradas pelos supostos machos alfa...
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RATO QUE RUGE — O acordo Mercosul-União Européia, pelo qual os governos brasileiros vinham batalhando há duas décadas, caiu no colo do Bolsonaro como a única realização (vista pela maioria dos agentes econômicos como) positiva em seis meses de desgoverno.

Mesmo assim, ele quase jogou a dádiva no lixo, ao insistir no direito de destruir a Amazônia ao seu bel-prazer. Até que, encostado na parede por Macron (com o respaldo da Merkel), só restou ao ratinho parar de rugir, passando a emitir chiados de anuência.

Bastou voltar ao Brasil para ele trombetear aos analfabetos políticos que colocou a França e a Inglaterra no lugar delas. Acredite quem quiser...

Enquanto isto, avoluma-se na Europa a campanha para que o acordo não seja homologado pelos parlamentos das várias nações. Se os verdes ainda precisavam de algum trunfo retórico, o boquirroto lhes forneceu uma coleção inteira.

Manifestação feminista contra Bolsonaro em Paris
Por mais que mime Neymar, o jogador com quem Bolsonaro realmente tem afinidade é o Fernandinho, autor do gol contra que afundou o Brasil no último Mundial da Fifa.

Aliás, é inconfundível o fedor planaltino que exala da campanha contra Tite, o treinador civilizado demais para a abominação truculenta em que tentam transformar o Brasil. 

Juca Kfouri deve haver tido seus motivos para não abrir o jogo, quando antecipou que o Adenor poderá sair após a Copa América, mas salta aos olhos que há uma fritura em curso, repetindo o episódio de João Saldanha na ditadura militar.

4 comentários:

Anônimo disse...

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Sempre bom ler suas acuradas análises.

De minha parte vou aproveitar a oportunidade de ver quanto tempo esse tipo de política consegue se manter em um ambiente de recessão e estagnação econômica, nas palavras do próprio Roberto de Oliveira Campos Neto presidente do banco central.

Ditadores como o garrafa azul só se mantém quando e enquanto proporcionam o pão, além do circo.
Já o mito nem isso.

Então entendo que, segundo seu prognóstico, ele permanecerá no poder só enquanto a reforma estiver em votação?

***
A economia está na UTI e o papai estado sem grana para insuflar alguma vida na quase defunta atividade econômica.
O Guedes está partindo para pedaladas e reeditando tentativas já absolutamente fracassadas: como a securitização da dívida imobiliária da CEF.

Mas, acredito e tenho a experiência de que a economia só começará a se mover quando for mais simples trabalhar no Brasil.
Veja, comprei a motocicleta mais barata da Honda (a Pop 100) e só para licenciar foi praticamente 10% do valor da moto. Isso para ser entregador de pizza!
(Não que eu seja, mas fiquei imaginando como é difícil se fazer alguma coisa útil com tantos impostos)
Pois bem, a motocicleta em si tem mais pelo menos 40% de impostos.
Por aí já se foram 50% do meu dinheiro sem retorno nenhum, pois tem-se que amarrar a motocicleta e rezar muito para não levarem ela já que o clima de insegurança é total.

Pois é... arminha, mito, jogo de futebol, declarações polêmicas, e "que tais" não mudam a realidade de estagnação total da economia e o tamanho do estado incompetente que parasita a atividade produtiva, sem garantir a mínima estrutura e paz social.
Ele é muito caro, pois não está atendendo as necessidades a contento.
Dizem que não é só aqui que isso está acontecendo.
Por isso, mesmo que o mito fosse Jesus Cristo, não conseguiria fazer grande benefício com o sistema econômico que temos. (Jesus teria a vantagem de que o bem possível faria)

Assim, cada vez mais concordo com o diagnóstico do Jakurski e do do Dalton de que este sistema morreu e algo novo tem nascer para possibilitar a continuação da vida sobre o planeta.

Da maneira que está é que não vai se sustentar muito tempo.
Seja quem for o governante.

celsolungaretti disse...

O meu prognóstico é de que o Bozo cairá se insistir em morder as mãos dos donos. Se recuar sempre como recuou diante da França e da Alemanha, poderá durar mais, infelizmente.

A guerra ideológica dele não incomoda os poderosos, só as pirraças e tolices que os façam perder dinheiro.

Podem suportá-lo se ele resignar-se a ser rainha da Inglaterra, deixando os mais equilibrados governarem, já que não tem competência para tanto.

Quanto à crise capitalista, os primeiros que se rebelarão são povos mais guerreiros. O brasileiro é conformista, a tradição é de que "os filhos seus fujam à luta", além de os pastores picaretas terem forte influência hoje em dia.

Anônimo disse...

Caro CL,
Esse Acordo Mercosul-UE, assinado por bozo e o macri, é o Acordo do pescoço com a guilhotina.

Se for efetivado (é necessário a aprovação de cada país membro), vai lembrar o Tratado de Panos e Vinhos entre Inglaterra e Portugal (Tratado de Methuen), no séc. XVIII, em que consolidou o atraso industrial do país lusitano por 300 anos.

Mas a mídia comercial venal vira-lata deu manchetes de acordo histórico.

Tristes trópicos...

celsolungaretti disse...

Eu o vejo mais como um abraço de afogados, pois o capitalismo afunda cada vez mais e uma crise de grandes proporções se aproxima.

Então, o importante foi o Bolsonaro ter feito uma entrada de leão e uma saída de cão. Isto provou que, encenações à parte, ele vai se curvar à vontade dos que realmente mandam.

Não é nem um Jânio Quadros, que partiu para o tudo ou nada. Não passa de um rato que ruge.

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