dalton rosado
O DIREITO CODIFICADO DIANTE DA FALÊNCIA DO CAPITAL
"Se você perguntar a fórmula da água, não sabe, não sabe nada. São idiotas úteis que estão sendo usados como massa de manobra de uma minoria espertalhona
que compõe o núcleo das universidades
federais" (Jair Bolsonaro, sobre os
estudantes que protestam)
O Direito nascido e desenvolvido tendo como base relações sociais baseadas na forma-valor (dinheiro e mercadorias) traz no seu cerne deformações conceituais que negam a realização do ideal de justiça.
A combinação do ius (termo latino que significa direito material, substantivo, codificado) com o fas (a busca da realização da justiça) não encontra adequação sob a relação social mercantil, e muito menos na aplicação jurisdicional desse Direito codificado pelos magistrados, que são, ao assumirem a titularidade no cargo, incumbidos de obediência aos preceitos legais instituídos.
Previamente subordinados à aplicação do Direito substantivo (e lei básica) dentro das regras de direito subjetivo (a lei processual), os magistrados têm seu senso de justiça delimitado pelo enquadramento à norma legiferada, como agentes do poder estatal que são.
Independentemente do crescimento econômico proporcionado pelas relações sociais mediadas pela forma-valor, verifica-se nas sociedades mercantis uma cisão social decorrente da subtração dos valores produzidos pelos trabalhadores assalariados em benefício do capital, detido e administrado pelo capitalista.
As leis que regem tal processo são, portanto, injustas na sua origem, por mais firulas jurídicas que sejam utilizadas para não não deixar-se tão transparente que elas acabam sendo o oposto daquilo que se quer estabelecer como justo.
O direito de propriedade, p. ex.: consagrado como cláusula pétrea do ordenamento jurídico das relações mercantis, ele é mensurado economicamente pelo valor das mercadorias (a base das relações de produção e acumulação do capital), não podendo, portanto, deixar de ser cumulativo e ilimitado. É a mais clara configuração da injustiça social tutelada pelo Direito.
Não é por menos que já houve lei no Brasil que concedia o direito de propriedade aos senhores de escravos africanos, tudo dentro de pretenso senso de justiça legiferada pelo Direito codificado.
O respeito social a esse instituto jurídico absolutista e ilimitado sobrepõe-se a qualquer hipoteca social, e de tão cultuado (até por quem não tem nenhuma propriedade, mas deseja tê-la), parece ser uma instituição absolutamente justa.
Confunde-se o respeito que se deve ter ao natural direito à posse justa (valor de uso), com o segregacionista direito à propriedade (o infame valor de troca), possibilitando que um mesmo capitalista possa ser proprietário de mil casas numa cidade com déficit habitacional de centenas de milhares de casas.
Um defensor do capitalismo e do direito de propriedade certamente argumentará que é este o critério que faz girar a roda do desenvolvimento social, como o faz o ministro Paulo Guedes ao afirmar que 3 bilhões de seres humanos da miséria foram assim resgatados da miséria.
Esta é a lógica perversa que consegue ver até na guerra que mata milhões de pessoas os benefícios das descobertas científicas por ela proporcionadas. Não foi o capitalismo que alavancou o saber da humanidade, mas o natural desenvolvimento da razão humana que proporcionou os ganhos do saber e possibilitou a solução de problemas milenares, apesar do capitalismo!
Aliás, é esse mesmo desenvolvimento do saber aplicado à produção de mercadorias que está pondo a nu a irracionalidade do modo de produção mercantil, numa prova de que não é o capitalismo que criou o saber, embara seja o saber que, paradoxalmente, vai sepultar o capitalismo.
Mas, como não há mal que dure para sempre, a depressão capitalista está a prenunciar-se como avassaladora a partir do atingimento do seu estágio limite de expansão em função das contradições em seus próprios fundamentos; e, na esteira deste processo, fica visível e mais compreensível a injustiça contida nas normas legais de grande parte do Direito Constitucional e das regras econômicas e civis de Direito ordinário que lhe são complementares.
— o princípio segundo o qual o direito adquirido, preceito constitucional intocável, é facilmente derrogado diante da impossibilidade financeira do seu cumprimento. É o que está a acontecer com a reforma da Previdência Social, cuja proposição retira direitos constitucionalmente garantidos diante da falência das relações econômicas e das contas públicas delas dependentes.;
— a redução linear de verbas para a Educação (setor que se constitui como função estatal precípua, dever do Estado e direito do cidadão...), recentemente determinada pelo ministro Abraham Weintraub em consonância com a necessidade de ajuste fiscal à medida que o governo é dependente do crescimento econômico impossível de ocorrer no atual estágio da economia, o que dá muito bem a dimensão da subordinação do Direito às regras ditatoriais ao fetiche da mercadoria e falência do capitalismo;
— o trabalhador desempregado pela recessão econômica que não pode pagar o aluguel da casa onde mora com sua família, nem pagar a conta da luz e da água, é simplesmente despejado e tem o fornecimento de energia e água cortados pelo direito que têm os seus senhorios de recebimento do que lhes é devido, sem que se considere o direito natural de subsistência humana. (por Dalton Rosado)
Nenhum comentário:
Postar um comentário