sábado, 20 de abril de 2019

DEPOIS DE USAREM OS TOTALITÁRIOS TOSCOS PARA DESMORALIZAR O STF, OS TENENTES TOGADOS OS JOGARÃO FORA

demétrio magnoli
GOVERNO BOLSONARO É SÓ UMA ESCALA TÉCNICA NA ROTA DO PARTIDO DOS PROCURADORES
A crise institucional em curso transbordou como crise constitucional pelas decisões do STF de agir, simultaneamente, como parte, promotor e juiz no inquérito das fake news e de impor censura à divulgação de notícias. Curiosamente, o governo Bolsonaro tem relação apenas lateral com uma crise cujos protagonistas são o próprio STF e a corrente jacobina do Ministério Público.

Atuando em dobradinha, Dias Toffoli e Alexandre de Moraes conduzem um inquérito abusivo já na origem aos descaminhos da truculência. Desconhecendo os limites da lei, acalentam a ilusão de que seus alvos se deixarão intimidar. 

O fruto prático de seus atos arbitrários é a desmoralização do STF —ou seja, exatamente a finalidade buscada pelos promotores da campanha difamatória disseminada nas redes sociais. O recuo de Moraes, revogando o ato de censura, restabelece parcialmente a legalidade. Falta, ainda, devolver as prerrogativas de investigar e acusar a quem a detém, ou seja, ao Ministério Público.

O voo suicida do STF concentrou as atenções, desviando os olhares do fenômeno que motiva o inquérito. Não são meia dúzia de haters de redes sociais: há anos, como subproduto tóxico da Lava Jato, a corrente jacobina dos procuradores engajou-se num projeto de poder.
Lembram dele? Sumiu após o fracasso da Operação Joesley... 

Os sinais iniciais emergiram em maio de 2017, na operação Joesley Batista e no artigo de Rodrigo Janot que denunciava “o estado de putrefação de nosso sistema de representação política”. 

O procurador-geral enunciava, então, nada menos que um objetivo estranho à missão judicial da Procuradoria: limpar a República, substituindo a elite política tradicional por uma outra, pura e casta. É essa meta que os pretendentes a Robespierres continuam a perseguir.

Janot foi protagonista circunstancial numa engrenagem que alastrou suas bases pelo Ministério Público, extravasou para setores da Polícia Federal e da Receita e se disseminou entre militares da reserva e políticos (tanto governistas como de oposição). 

Hoje, o projeto de poder tem seu próprio candidato presidencial, que atende pelo nome de Sergio Moro, e seu veículo oficioso de mídia, que é o site [O Antagonista, do Diogo Mainardi] censurado pelo ato ilegal do STF. Bolsonaro flerta alegremente com a engrenagem, sem se dar conta de que seu governo é apenas uma escala técnica na rota imaginada pelo Partido dos Procuradores.
O turco Erdogan é outro populista que mira o poder absoluto

Mundo afora, da Rússia à Turquia, o populismo vale-se do pretexto do combate à corrupção para quebrar as mediações institucionais que limitam o poder do governo. 

O núcleo da Lava Jato ganhou popularidade ao atacar eficazmente a corrupção sistêmica que envenena a política brasileira. Dessa plataforma, nasceu o projeto do Partido dos Procuradores [também conhecidos como tenentes togados] que agora esculpe as investigações segundo as necessidades de seu objetivo político. É nessa lógica que se inscreve a ofensiva contra a Corte Suprema.

“Tenho vergonha do STF” —a frase lançada por um obscuro advogado contra Lewandowski funciona como palavra de ordem da campanha de mídia. O site O Antagonista publica fragmentos de notícias verídicas, mas descontextualizadas, oferecendo munição aos guerrilheiros das redes, que as convertem em petardos difamatórios contra os magistrados escolhidos como alvos. 
Deltan Dallagnol é o cérebro do tenentismo togado, que pretende conduzir Sérgio Moro ao poder 
Pretende-se, no fim, eliminar as restrições legais à perseguição de inimigos políticos do Partido dos Procuradores. Nas Filipinas, o governo Duterte fez da guerra às drogas o alvitre para execuções extrajudiciais. No Brasil, faz-se da guerra à corrupção o pretexto para assassinatos de reputações.

O exército da difamação opera nas sombras, combinando vazamentos seletivos com torrentes de desinformação impulsionadas nos subterrâneos da internet. O STF tem a obrigação de expor os contornos da campanha criminosa por meio dos instrumentos legais, solicitando à Procuradoria inquéritos sobre fatos específicos. 

A luz do dia sempre é o melhor antídoto contra os combatentes das trevas. (por Demétrio Magnoli)

4 comentários:

Anônimo disse...

Não sei porque ver com tão maus olhos uma eventual presidência do Moro. Será que ele é pior do que tipos medonhos como Lula, Dilma e Bolsonaro? Mas minha impressão é de que ele irá para o Supremo, não para a presidência (Bolsonaro poderá indicar dois ministros). Esse foi o acordo para que ele assumisse o ministério, mais ou menos como fez o Alexandre de Moraes com o Temer.
No mais, goste-se ou não da Lava Jato, muito melhor ela do que se os esquemas bilionários de corrupção tivessem remanescido na obscuridade. E o inquérito do Toffoli é indefensável mesmo, inconstitucional ao extremo.

Anônimo disse...

Celso,
Como na fábula clássica de Andersen, a Lava Jato é aquela criança que se ergueu em meio à multidão e apontou que o rei estava nu.
O estamento burocrático agoniza em praça pública, mas ainda possui suas cabeças de hidra no judiciário e na imprensa.
A estratégia dos patrimonialistas é posar de defensores da ordem, apontando um espírito jacobino naqueles que expõem seus vícios.
Daniel

celsolungaretti disse...

Anônimo das 9h57,

não venha falar isto para quem teve duas dezenas de companheiros e amigos assassinados por uma ditadura e várias outras dezenas detonados nos porões (só estou enumerando os que conheci pessoalmente, se não os números seriam ainda maiores).

Afora ter sido quase morto e haver ficado lesionado para sempre, começando a carregar os traumas e as responsabilidades de um sobrevivente quando os jovens da minha idade estavam descobrindo a vida.

Então, saí dos porões com uma convicção inabalável: NADA justifica nem iguala uma ditadura. Nenhum ser humano merece ficar indefeso nas garras de um regime que possa fazer dele o que bem entender.

A essência do capitalismo é o roubo, portanto só acabaremos com "os esquemas bilionários de corrupção" dando-lhe um fim. Essas pirotecnias das lavas jato da vida nunca foram solução definitiva para o problema, apenas enganam durante algum tempo e depois volta a ser tudo como era antes.

Mas as ditaduras matam, torturam, mutilam, estupram, dão sumiço em cadáveres e todo um festival de horrores que, espero, nunca mais o povo brasileiro tenha de suportar.

celsolungaretti disse...

Anônimo das 12h51,

as hidras mais nefastas são as do autoritarismo: a extrema-direita bolsonarista, os malucos que o Olavo de Carvalho incita a botarem fogo no circo e os procuradores metidos a justiceiros.

Com todos os defeitos, o Supremo e a imprensa burguesa hoje estão servindo de contrapeso ao peso dos fanáticos intolerantes e ignorantes.

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