sábado, 22 de dezembro de 2018

IMPERDÍVEL: O BLOG AFINAL DISPONIBILIZA A OBRA-PRIMA DE SERGIO LEONE SOBRE MOVIMENTOS REVOLUCIONÁRIOS!

Perdi a conta de quantas vezes assisti a Quando Explode a Vingança desde o seu lançamento em 1971, mas seguramente não terão sido menos de 15. Na primeira, saí emocionado do saudoso cine Marrocos, no centro velho de São Paulo: acabara de conhecer a visão que um dos meus diretores favoritos tinha dos movimentos revolucionários... e era, em muitos aspectos, semelhante à minha!

Concluí que Leone também se desencantara com a postura repulsiva do Partido Comunista Italiano em 1968 (que se agravaria nos anos seguintes, até chegar ao pacto faustiano com a putrefata democracia-cristã): quando os ventos da mudança sacudiam a Europa, o PCI optara pela omissão, que logo mais viraria cumplicidade com as forças da ordem.

O desencanto de Leone se expressou num filme em que ele, fervorosamente, toma o partido do homem simples que se engaja em revoluções; mas, mostra os dirigentes desses movimentos como sempre propensos a traírem a causa.
James Coburn e Rod Steiger: atuações inesquecíveis! 
Assim, o irlandês John Mallory (James Coburn) é convencido pelo seu melhor amigo, o intelectual revolucionário Nolan (David Warbeck), a ingressar no IRA. E seria Nolan, preso e torturado, quem pessoalmente o apontaria aos policiais britânicos.

Mallory escapa atirando e foge para o México, onde aproveita a experiência que adquirira com a dinamite para garimpar prata. Lá acaba conhecendo Juan Miranda (Rod Steiger), pequeno bandido mexicano cuja quadrilha é constituída principalmente por sua filharada e cujo sonho dourado é assaltar o banco mais tentador da região. 

Meio sem querer, ambos vão se envolvendo cada vez mais com a revolução mexicana. E a história se repete: abnegação e heroísmo das pessoas simples, traição do líder Dr. Villega (Romolo Valli). Percebe-se claramente que Nolan e Villega sintetizam a imagem que Leone tinha dos dirigentes do PCI.

Mesmo desencantado ("Quando comecei a usar a dinamite, acreditava nos grandes ideais. Acreditava em tudo! Agora só acredito na dinamite"), Mallory permanecerá até o fim no campo ao qual pertence.  
O extermínio em massa dos rebeldes evoca matanças ocorridas nos estertores do regime de Mussolini
Mas, sem ilusões. Quando alguém pede sua opinião sobre dirigentes que ele sabe não terem honrado seu compromisso com a causa, ele ironicamente se refere a eles como "grandes e gloriosos heróis da revolução".

Ou seja, não tendo sequer a esperança de que a história venha a retratar o que realmente aconteceu, ele antecipa a forma distorcida como serão vistos: os líderes oportunistas, manipuladores e vacilões, endeusados; e os idealistas sinceros (como Battisti) perseguidos em vida e denegridos depois de mortos.  

Mas, claro, é um filme e não um panfleto. Tem uma ação tão envolvente que só os iniciados captam tal subtexto. Dá para se ver e gostar muito do filme sem perceber/entender nada disso.

Em alguns mercados foi lançado com um título equivalente a Por um punhado de dinamite, para relacioná-lo a Por um punhado de dólares e Por uns dólares a maisLeone, contudo, o concebeu como o segundo filme de outra trilogia: Era uma vez no Oeste, Era uma vez a revolução e Era uma vez na América.

Coburn e Steiger têm atuações magistrais. O roteiro escrito a dez mãos (inclusive as do Leone e do ótimo Sergio Donati) é simplesmente perfeito. E a trilha musical de Ennio Morricone, um arraso!

Também gostei muito do enfoque que Leone dá à repressão, personificada no comandante Gutierez (Anthony Saint-John): despreza-o tanto que lhe nega até a dignidade da fala. 

Gutierez aparece escovando repulsivamente os dentes, chupando um ovo, ordenando fuzilamentos com simples gestos de cabeça. Um desumanizado visto em toda sua desumanização, sem os habituais discursos redundantes. Só gênios como Leone criam soluções tão simples e eficazes. (por Celso Lungaretti)

2 comentários:

Anônimo disse...

Oi Celso, como está o seu dia!?

Aqui é o Hebert.

Deste filme ( que vi na segunda feira sem lei, no Telecine Cult ), gosto em particular, da cena inicial do assalto a diligência, na qual a madame cheia de refinamentos, "não me toques" e escandalizada no início, finge ( ou tenta fingir ), não se sentir atraída e lasciva, diante do "vigor" de Juan Miranda.
Como as mulheres do filme O Estranho Sem Nome ( que tenho com Clint Eastwood ), que fingem indignação apenas no início dos encontros, sem convenções, sem etiquetas, apenas um homem diante de uma mulher.
Prazer e satisfação de ambos, sem traumas, sem remorsos, sem culpas.

Ótimo texto: O MELHOR DO NÁUFRAGO: O WESTERN ITALIANO, QUE FLERTAVA COM A REVOLUÇÃO...

Eu assisti por coincidência a pouco tempo, Django ( insuperável versão de 1966 ), com o imortal Franco Nero, que tenho incluído na minha coleção particular, na qual aprecio acompanhado de quitutes, e boa garrafa de vinho tinto, claro.
Também possuo a trilogia Sabata ( iniciada com Lee Van Cleef e terminada por Yul Brynner ).
As geringonças inventadas pelos italianos ( como a pistola trapaceira de Sabata ),
são um toque a parte, lembrando os aparelhos de James Bond.
Tenho Shalako, únco filme com Sean Connery no gênero, creio eu, e com participação do sempre marcante Woody Strode ( um dos divisores de águas antes da era Blaxploitation ).
O único filme que tenho protagonizado por Giuliano Gemma, é o Dia da ira.
Baixei a pouco tempo, o filme de outo gênero, Companheiros ( com Marcello Mastroiani ),
a pedido de meu Pai, que durante um papo com amigos, contou que nos tempos de estudante,
havia sugerido a um ex colega de ginásio, que o exibisse a outros colegas.
Por rasões obvias, teve medo de exibir a película indicada.
Fugindo um pouco do tema western, mas atento as mensagens contidas nos filmes,
O Tesouro de Sierra Madre, e o Salário do Medo, também são ótimos.

Abraço.




celsolungaretti disse...

Hebert,

eu também destacaria, naquela cena, que o Juan traz a ricaça para o universo dele, comendo-a numa cocheira. Aliás, aquela sequência inteira é genial, o papo dos poderosos é um verdadeiro resumo do porquê da revolução, com os closes das bocas dos fdp comendo as iguarias, sumo escorrendo, etc. Leone os faz repulsivos não só pelas opiniões que emitem, mas por todo seu ser. Foi o mesmo tratamento que ele deu depois ao comandante dos "gafanhotos".

Curioso o que vc me conta de "Os companheiros" ("I compagni", do Mario Monicelli). Dê uma olhada no post: https://naufrago-da-utopia.blogspot.com/2016/12/assista-no-blogue-do-naufrago-ao-melhor.html

Quando eu atuava no movimento secundarista, em 1968, fiz exatamente isso: o dono do "Bijou - cinema de arte" possuía uma cópia do filme e eu acertei com ele para exibi-lo 2 ou 3 domingos pela manhã para os estudantes que estávamos "conscientizando". No final, fazíamos um rápido debate. Bons tempos.

Além do lado político, a tecelagem do filme mexia comigo. Era de Turim no final do século 19 e lembrava demais aquela na qual meu trabalhava na década de 1960. O Brasil daquele tempo era assim, um atraso imenso com relação aos países do 1º mundo.

Os westerns italianos que, se vc ainda não viu, deve ir atrás são: "Companheiros" ("Vamos a matar, compañeros"), do Sergio Corbucci"; "Gringo" (do Damiano Damiani); "Quando os brutos se defrontam" e "O dia da desforra" (do Sergio Sollima) e "Keoma", do Enzo Castellari.

Indico outros bons no artigo que você leu, mas estes cinco estão num patamar superior, rivalizam com os do Leone.

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