(continuação deste post)
Pêndulo célebre: o do conto de Edgar Allan Poe. Tudo a ver |
No Brasil estamos assistindo à repetição desse movimento pendular que faz com que a vida social não saia do mesmo canto de sempre, impedindo a superação dos problemas sociais, que apenas se agravam.
Quem defende a candidatura do Lula é mortadela; quem se opõe à sua candidatura é coxinha, e esses dois tipos de pensamento, expresso em simbologia alimentar, apenas refletem o bolor de suas concepções obsoletas e já fétidas.
Trata-se de uma falsa dicotomia a impedir que se pense alternativamente; e o primeiro movimento de quebra da postura imobilista diante da decadência social deve ser a negação coletiva do voto, seguida por uma discussão minimamente inteligente sobre o que fazer.
Por absoluta falta de compreensão científica daquilo que está subjacente à monstruosa crise social e ecológica que aflige grande parte das populações mundiais periféricas do capitalismo, o pensar fora da caixa não é adotado pelos intelectuais nem compreendido pela população, vítima de uma comunicação de massa que a induz à burrice coletiva.
Hoje quase não há estudos críticos no capitalismo tomando por base o conteúdo intrínseco da economia e os números da economia mundial, pois a esquerda mais não faz do que positivá-la com um discurso capitalista de defesa de modus operandi voltado para o desenvolvimento econômico, como se esse fosse o apanágio do equilíbrio da vida social.
Os economistas, mesmo os de esquerda, apegam-se às formas acadêmicas doutrinárias da economia para justificar a postura de se limitarem à administração do capital, sem perceber que se faz necessária, isto sim, a sua superação, posto que ele é impossível de ser administrado do ponto de vista do interesse coletivo global e, agora, até mesmo quanto à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro de sua sustentabilidade nas relações macroeconômicas mundiais.
Combatemos a corrupção há uma eternidade. Adiantou? |
Dessa incompreensão (ou desinteresse em compreender) somente pode resultar a barbárie, que é a forma de manifestação suicida de qualquer coletividade incapaz de ter consciência sobre os meandros de sua própria tragédia e, a partir daí, criar alternativas saudáveis.
Nunca foi tão necessário compreendermos a crítica da economia política nos seus fundamentos científicos e cotejarmos ditos ensinamentos com os fenômenos sociais que se nos apresentam sem que se saiba como e por que eles acontecem.
Temos um Judiciário politicista; instituições estatais comprometidas com um arcabouço jurídico-governamental-legislativo decomposto e opressor; e uma grande imprensa que atua apenas como uma correia de transmissão da ideologia da classe dominante. Como consequência, assistimos à tentativa de se atribuir à corrupção com o dinheiro público a principal ou única responsabilidade por nossa miséria social.
O resumo moral falacioso do discurso é: sejamos honestos com o dinheiro público e teremos resolvido nossos problemas sociais. A aceitação de tal conceito corresponde a um atestado de insanidade coletiva.
Ainda que devamos atribuir à corrupção política/privada o agravamento de uma situação de miséria crescente, seria desconhecimento dos números e fatos da economia atribuir a ela (corrupção) a razão primária da nossa tragédia social.
É que, impossibilidade de se colocar o dedo na ferida, ou seja, de se denunciar o anacronismo das relações de produção capitalistas no estágio atual e discutirmos formas alternativas de produção e propriedade, é muito mais fácil para a direita e a esquerda, ambas politicistas e aferradas às tetas do poder estatal, escamotear a verdade ou ignorá-la na sua substancia nefasta.
A questão que se coloca não é Lula ser ou não ser candidato, ou mesmo presidente, mas sim criarmos formas horizontalizadas de produção e de gerenciamento social das nossas vidas.
Isto sim é ser anticapitalista; isto sim é lutar pela emancipação humana. (por Dalton Rosado)
3 comentários:
Me parece que há uma forte relação negativa entre corrupção e bem-estar social, ou seja, os paises menos corruptos aprentam menor desigualdade social e pobreza. Não estou querendo defender o capitalismo ou qualquer outra forma de relação. Não há no mundo um país com baixa pobreza e desigualdade com alta corrupção, assim como há varios paises pobres e com alta desigualdade social associada a uma corrupção sistêmica.
Caro Henrique Nascimento,
Os países de economias desenvolvidas, e que são ricos justamente a partir de uma lógica econômica que os beneficia, ou seja, na proporção inversa aos países pobres, são por isso mesmo os mais corruptos. É que a corrupção deles é por cima da mesa, ou seja, oficial, chancelada pela lei e por uma ordem econômica mundial histórica, embora agora eles já sofram algumas consequências das contradições próprias à essa mesma ordem que desmorona por seus próprios fundamentos (as labaredas da crise só agora estão chegando à sala de estar).
Eles não praticam a chamada baixa corrupção, aquela por baixo da mesa, criminalizada (mas permitida historicamente nos países pobres para determinadas castas sociais, como políticos corruptos em conluio com a empresariado (inclusive com o alto empresariado estrangeiro, que aceita a corrupção fora das suas fronteiras). E é justamente isso que permite o discurso hipócrita de honestidade do qual elas são tão orgulhosos.
A miséria e os baixos níveis de escolaridade e saber científico são artífices de estratégias de sobrevivência criminosa (a partir de pequenas ou grandes formas de corrupção) disseminada pelas populações de países pobres, fato que ao invés de contribuir para uma teoria e ação emancipacionista, só aumentam os seus níveis de pobreza e submissão.
Não há santo nessa história; os países ricos nos exploram descaradamente, mas sob um discurso moral de regras econômicas legais, mas que são leoninas. O conceito de honestidade sob a forma-valor é tão mentiroso como ela própria.
É assim que vejo essa questão.
Um abraço, Dalton Rosado.
O capitalismo é de fato cruel. Essa forma de relação posso afirmar que o é pois vivo nela desde que nasci. No entanto, não posso dizer o mesmo com respeito às outras.
Ainda insisto que os corruptos latinos e africanos do "baixo escalão" precisam aprender com os corruptos europeus e americanos do "alto escalão" para que essa nossa corrupção latina-africana não nos atrapalhe a impor limites aos corruptos do "alto escalão". Para mim, existe claramente uma relação de causa-efeito, em que a principal causa da nossa situação de penúria (o efeito) é nós mesmos e não os corruptos do "alta escalão".
Agradeço sua resposta, Dalton.
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