segunda-feira, 7 de maio de 2018

MARX NÃO QUERIA ENFIAR A HUMANIDADE NUM MUNDO CERCADO POR GRADES. ELE VISAVA, ISTO SIM, LIBERTAR O SER HUMANO

MARX E A LIBERDADE
Este mês comemora-se o 200º aniversário de nascimento de Marx. Por um lado, devemos celebrar um dos maiores pensadores da história, que nos legou não apenas uma obra científica e filosófica, mas também um instrumento intelectual para a emancipação humana. 

Por outro lado, no entanto, devemos parar e refletir diante da profunda falsificação histórica empreendida sobre o pensamento de Marx. Certamente, é o filósofo mais distorcido e deturpado da história. 

Tal deturpação não proveio só da direita reacionária. É preciso constatar com clareza que a falsificação veio com muito mais ênfase da esquerda e de quem se dizia combatente revolucionário. 

Uma destas falsificações é sobre a questão do indivíduo e da liberdade individual. Infelizmente, a apropriação do regime soviético da obra de Marx fez com que seu pensamento ficasse associado à noção de opressão estatal e de sociedade policialesca. 

Estabeleceu-se mesmo a ideia – numa profunda distorção do pensamento de Marx – de que não poderia haver igualdade e liberdade ao mesmo tempo. A igualdade, postulou-se, só é possível mediante a coerção estatal. 

No plano filosófico, formou-se um pré-conceito acadêmico de que a filosofia marxiana anulava o papel da liberdade humana, transformando a história num rígido determinismo. Os indivíduos mesmos seriam apenas produtos da sociedade, de suas classes, não possuindo qualquer liberdade particular.

Marx seria mesmo um inimigo da liberação individual, um apologista da servidão. Não é muito difícil entender que tal ideia tenha levado muita água para o moinho neoliberal, pois, com isso, era completa a oposição entre o socialismo, terreno da opressão, e o capitalismo, terreno da servidão. 
"A falsificação veio com muito mais ênfase da esquerda"

Nada mais longínquo do pensamento de Marx, contudo. Basta ler minimamente a obra do filosofo para entender seu profundo compromisso com a liberdade individual.

Marx não buscava erguer um mundo cercado por grades e ali dentro colocar a humanidade. Muito ao contrário, ele visava libertar o ser humano, livrá-lo da opressão de classe, da qual derivavam toda as outras formas de opressão. 

A opressão de classe é a exploração do homem pelo homem e sua base está na reprodução material da sociedade. Noutras palavras, a base da opressão de classes está na escassez. 

Porém, a sociedade capitalista libera forças produtivas capazes de acabar para sempre com a escassez. Por isto, o capitalismo é revolucionário. Mas, tais forças produtivas permanecem nas mãos de uma classe, em detrimento do resto da humanidade. E, por isto, o capitalismo é reacionário. 

O capitalismo coloca-se, ao mesmo tempo, como auge e limite da sociedade de classes e nela se expressam as misérias da pré-história humana e as ricas possibilidades da história autenticamente humana.

No capitalismo, a liberdade do indivíduo é paradoxal. Ao mesmo tempo em que ele possui mais potencialidades do que seus antepassados, ele também é mais coagido que eles.  
O que deve ser feito é a liberação das forças produtivas de suas cadeias privadas e seu controle por toda a sociedade humana. Somente neste ponto será possível a universalização da riqueza produzida e o fim definitivo da escassez, libertando o indivíduo, o qual não estará mais preso a qualquer tipo de amarra social. Neste tipo de sociedade, não haverá mais necessidades ou dependências, o indivíduo será livre para ser e viver como quiser.

Marx coloca – e isto é fundamental – que a liberdade humana não paira no nada. Ela é calcada no mundo material, fundada nas condições de produção dadas pela sociedade onde o indivíduo está inserido. 

Não significa, no entanto, que não haja liberdade individual. O ser humano sempre tem possibilidades de agir  e viver, mas tais possibilidades são dadas pelas condições postas em seu contexto social. Não era possível, por exemplo, aos gregos da antiguidade querer viajar de avião para o Egito. Simplesmente não havia tal possibilidade. Hoje já é possível, mas não para todos os gregos.  
O fundamental: a liberdade é condicionada pelas condições materiais, mas condicionada, não determinada. O mundo humano é muito mais complexo do que uma disjuntiva liberdade total x servidão total.

Marx, portanto, não era um advogado da escravidão. Nem entendia que a igualdade só seria possível mediante o controle dos indivíduos. Muito ao contrário, para ele só seria possível ao indivíduo ser igual quando houvesse plena liberdade. (por David Emanuel de Souza Coelho)

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