Por Celso Lungaretti |
Durante episódios políticos significativos como o julgamento da chapa Dilma-Temer pela Justiça Eleitoral, os grandes jornais publicam editoriais que são, na verdade, uma indicação do rumo que os grupos econômicos por eles representados esperam que os acontecimentos tomem.
Se há um pecado capital que este blogue não comete é o da soberba. Por aqui temos perfeita consciência de que, qualquer que seja a posição que assumamos, terá poder de pressão nulo. Ainda assim, para efeitos meramente morais, nos posicionaremos.
Aliás, já começamos a fazê-lo nos posts
— neste, lembrando que o PT ainda está devendo a imprescindível autocrítica que deveria ter feito logo após a derrota acachapante a que suas estratégias e táticas conduziram a esquerda em 2016; e
— neste, apontando algo que deveria constar obrigatoriamente de tal autocrítica, a necessidade de definir um projeto alternativo para o país, ao invés de continuar obcecado com a conquista e preservação de espaços no aparelho de Estado sob a democracia burguesa, com resultados nulos para o povo (melhoras momentâneas, como as tão trombeteadas por Lula, são sempre anuladas depois, como está acontecendo agora).
Antes era assim. Depois, os patrões viraram companheiros... |
É o principal recado que temos para dar: a esquerda precisa se reconstruir, pois cometeu erros gritantes e continua insistindo neles até agora.
Constatou que deter a Presidência da República sem ter o povo organizado a sustentá-la não serve para quase nada e, a qualquer momento, as vitórias nas urnas podem ser canceladas por petelecos parlamentares. Mesmo assim, prioriza acima de tudo a eleição presidencial de 2018, como um náufrago busca desesperadamente uma boia quando está afogando.
Constatou o estrago que uma cruzada moralista togada, frequentemente incidindo em ilegalidades grosseiras, produziu em suas fileiras, mas fechou os olhos quando tais ilegalidades atingiram o fraco presidente da República em exercício.
Pior: consentiu que alguns de seus chamados movimentos sociais fossem a Brasília para servirem como força auxiliar (parafraseando Boff) de uma esquisita tramoia envolvendo as Organizações Globo, o procurador-geral da República e um ministro do STF que jamais poderia atuar no processo da delação premiada do grupo J&F, caso seja verdadeira a acusação (por ele não desmentida) de ter sido fortemente apoiado por Joesley Batista quando buscava convencer parlamentares a favorecerem sua candidatura ao Supremo.
Ir botar azeitona na empada alheia dá nisso |
Com a falta de pensamento e o excesso de movimentação criticados por Boff, o PT parece nem sequer ter-se dado conta de que, colocadas as cabeças de Michel Temer e Aécio Neves na sala de troféus, os tenentes togados terão o contrapeso ideal para fazerem o mesmo com a do Lula, tapando a boca dos que alegam tendenciosidade: a guilhotina teria atingido um cacique do PMDB, um do PSDB e um do PT, ou seja, provocado baixas da mesma ordem de grandeza nos três principais partidos.
Então, o segundo recado deste blogue é o seguinte: a esquerda precisa desconfiar desses justiceiros que, a pretexto de combaterem a corrupção, parecem dispostos a quebrar todos os esquemas de poder do Estado brasileiro.
Somos os primeiros a considerar que os poderes da República estão podres como nunca. Mas, sua mera destruição, sem que a esquerda tenha o tal projeto alternativo para o país a que se referiu Boff, abrirá um vazio que neste instante, em meio à onda conservadora mundial, com toda certeza será preenchido pela direita, com grande chance de o ser não pela direita relativamente civilizada, mas pela direita totalmente selvagem e truculenta (Bolsonaro & cia.).
Mourão Filho começou no tenentismo e acabou desencadeando o golpe de 1964. |
Vale lembrar que os tenentes fardados de 1930, por não terem um propósito mais abrangente, acabaram sendo majoritariamente absorvidos pelo projeto ditatorial de Getúlio Vargas (com vários deles repetindo a dose em 1964), enquanto uma minoria se direcionou para o PCB.
E é até óbvio, mas vale deixar bem claro: Rodrigo Janot não é, nem jamais será, um novo Luiz Carlos Prestes...
Quanto ao julgamento no TSE, não vejo partido a nele tomar por parte da esquerda.
Seguindo à risca a legalidade burguesa, a chapa Dilma-Temer teria de ser cassada por abuso de poder econômico.
Mas, como a legalidade burguesa não nos diz respeito, vale mais avaliarmos as consequências que advirão.
A preservação de Temer deixará um presidente combalido arrastando-se até o final do mandato.
O descarte de Temer não levará a eleição direta nenhuma (a correlação de forças no Congresso Nacional e a intenção de voto já manifestada por vários parlamentares desfazem quaisquer ilusões a este respeito), mas à ascensão, por via indireta, de outro direitista qualquer, com grande chance de vir a ser um tucano que certamente usaria a caneta presidencial para encaminhar a vitória eleitoral do PSDB em 2018.
E se a confusão produzir o caos? Aí pode aparecer um salvador da pátria, fardado ou que já usou a farda...
Importante mesmo é a esquerda reciclar-se e. sob novas perspectivas e com outros dirigentes, reconquistar a credibilidade e a força perdidas. Assim, em momentos como o atual, poderá perseguir novamente objetivos próprios, ao invés de ficar colocando azeitona na empada alheia ou torcendo para esta ou aquela facção burguesa.
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