sexta-feira, 9 de junho de 2017

DEU A LÓGICA: A BLITZKRIEG DO JANOT ATOLOU NO PÂNTANO DE BRASÍLIA.

Se a toga fosse maior, daria para esconder também a cara...
Deu a lógica: Michel Temer continua como presidente, tendo sobrevivido a uma das mais estapafúrdias e destrambelhadas tramoias da política brasileira em todos os tempos. 

Espera-se que, agora, a sociedade apresente a conta aos conspiradores trapalhões, por terem virado o País de pernas pro ar a troco de nada, prolongando por mais alguns meses a agonia em que se debatem os brasileiros desde 2015, quando se iniciou a fase mais aguda da recessão atual.

O processo na Justiça Eleitoral não passava de um Plano B, uma garantia adicional de que Dilma Rousseff seria privada do seu mandato presidencial, mesmo que ocorresse algum acidente de percurso com o impeachment. 

Como o Plano A resolveu a questão, o B perdeu sua razão de ser, reduzido a um estorvo; mas, noblesse oblige,  era necessário manter em pé as ilusões jurídicas da democracia burguesa. Assim, não havendo mais como evitar a realização do julgamento, ele deveria terminar com a absolvição da chapa Dilma-Temer.

Ao iniciar-se a terceira semana de maio, já se sabia até qual seria o placar da absolvição: 5x2. De repente, no dia 17, o jornal O Globo desencadeou uma verdadeira blitzkrieg contra Temer, publicando peças da delação premiada do Grupo J&F que deveriam estar sob sigilo de Justiça. 

E o relator dos processos ligados à Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, Edson Fachin, fez o inusitado: como parte do material havia supostamente vazado, resolveu levantar o sigilo do todo. Agiu como um general que, informado de que o inimigo matara 20 dos seus comandados e 80 estavam feridos, ordenasse: bom, então vamos matar logo os outros 80 também...
O vencedor: Gilmar Mendes. Com muita cotovelada, chute na virilha e dedo no olho...
O pandemônio se instalou no noticiário, nos mercados e nos partidos políticos, enquanto movimentos sociais ligados ao petismo providenciaram um badernaço em Brasília, culminando no incêndio de Ministérios. A impressão de caos e descontrole era fundamental para forçar Temer a uma renúncia imediata. Tal ocorrendo, a guerra relâmpago teria sido coroada de êxito.

Mas, Temer resistiu. O grande capital, para o qual o importante mesmo é a continuidade do programa de reformas neoliberais, começou a trabalhar em seu favor, por falta de opção melhor (nenhum dos cogitados substitutos de Temer se mostrava especialmente apto para o papel). 

Enquanto isto, jornalões concorrentes passaram a mostrar o outro lado do furo d'O Globo:
— o fato de que a gravação ilegal da conversa de Joesley Batista com Temer fora precedida de uma aula a espiões amadores, ministrada por pessoal da Lava-Jato, embora ainda não estivesse decidido se seria ou não aceita a delação premiada de tais criminosos (isto dependeria do resultado da gravação); 
— o caráter inconclusivo das intervenções de Temer no diálogo, ficando evidente para qualquer pessoa isenta que a interpretação dada pelo procurador-geral da República Rodrigo Janot não era a única possível, mas sim a única que servia para incriminar o presidente; 
As regalias do Joesley colocaram em xeque as delações 
— as fortes suspeitas de que a gravação havia sido editada; 
— a sofreguidão de Janot, tão ansioso por tocar os procedimentos adiante que nem se preocupou em pedir aos peritos federais que verificassem se a gravação cumpria os requisitos legais para servir como prova; 
— a desatenção de Fachin, não só passando batido pelo fato de que a gravação deixara de ser periciada, como também por sua evidente ilegalidade (não houvera autorização judicial para que Joesley a fizesse) e pelos vários indícios de que Temer fora vítima de uma armadilha judicial; 
— as regalias e privilégios repulsivos que os irmãos bandidos obtiveram com a delação, os maiores até agora concedidos a qualquer réu da Lava-Jato.
.O RESCALDO DA TRAPALHADA
.
Os conspiradores não conseguiram tanger Temer à renúncia, nem fazer com que perdesse o mandato no julgamento do TSE. Ou seja, não conseguiram nada. Entraram como leões, saíram como cães.

O desvio de finalidade cometido por autoridades ligadas à Lava-Jato, ao direcionarem sua atuação para um objetivo flagrantemente político (a derrubada de um presidente) ao invés de se manterem no terreno do combate à corrupção, servirá, em muito, como munição para os políticos encalacrados unidos desfecharem um contra-ataque, movidos pelo instinto de sobrevivência. Tiro no pé.

Também começam a avolumar-se os questionamentos de arbitrariedades e excessos cometidos ou autorizados por policiais, promotores e procuradores. Reforça-se a suspeita de que se trata de uma devastadora cruzada moralista para destruir o status quo ante, sem clareza quanto ao que deva substituí-lo, assim como era carente de um objetivo maior o tenentismo de outrora (daí já estarem sendo chamados de tenentes togados). 
Nem os Irmãos Marx dariam um golpe tão bagunçado

E seus abusos, característicos de estados policiais, inspiram comparações com  os jacobinos da Grande Revolução Francesa. É bem capaz de a História repetir-se, com o pântano finalmente criando coragem para reagir contra o terror que Curitiba lhe inspira.

As Organizações Globo conseguiram reeditar um dos seus piores momentos, o escândalo Proconsult, tanto em termos de armação canhestra, quanto de resultados desastrosos. A demonstração de fraqueza que deu deverá custar-lhe caro, em termos de saúde financeira e de influência. 

Janot ficou com a credibilidade em frangalhos. Se antes sonhava com voos mais altos, agora terá de dar-se por feliz se conseguir permanecer no cargo atual até setembro, conforme estipulado. Terá ele sensibilidade suficiente para perceber quão exausta a sociedade brasileira está depois de tantos sobressaltos e de período tão longo de rigores, querendo acima de tudo sair do sufoco, sem mais paciência com relação a quem faz tempestades em copo d'água?  

Fachin até agora não desmentiu que Joesley Batista tenha colocado sua influência e poderio econômico a serviço da campanha dele, Fachin, para tornar-se ministro do Supremo. Se aceitou tomar decisões sobre a delação super-premiada de Joesley, não se declarando impossibilitado de atuar neste caso por dever um enorme favor a uma parte, pode perder não só a relatoria, como a própria condição de ministro. Tem de torcer muito para que Charles De Gaulle estivesse certo ao dizer que o Brasil não era um país sério.

Finalmente, parte da esquerda, ainda presa à narrativa do golpe, embarcou ingenuamente no derruba Temer!, sem sequer perguntar-se o que estava fazendo quando atendeu ao chamado da Globo. Respondo eu: colocando azeitona na empada alheia, ao aceitar servir como força auxiliar numa disputa de poder entre facções burguesas.
A esquerda precisa desistir das mordomias palacianas e reencontrar o caminho das ruas
A lição de casa continua por fazer: 
— uma profunda autocrítica do papel que tem desempenhado nos últimos anos, culminando na derrota acachapante em que se constituiu o impedimento da Dilma; e 
— a retomada da tarefa primordial de organizar o povo para o combate cotidiano ao capitalismo, como etapa necessária no sentido de acumular força para voos maiores.
Para recuperar o protagonismo, precisa ampliar e enrijecer suas fileiras – e muito! A participação destacada nas lutas sociais é bem mais importante para a esquerda neste momento do que vencer quaisquer eleições, inclusive a de presidente da República.

Quanto à derrubada de presidentes, só faz sentido quando se tem um programa alternativo verdadeiramente de esquerda para colocar em prática e as massas organizadas para darem sustentação ao governo popular. 

Como os dois requisitos inexistem neste instante, do ponto de vista de uma esquerda consequente, tentar fazê-lo mesmo assim seria, no mínimo, uma leviandade; afora o risco de fortalecer o inimigo, dando-lhe ensejo para trocar um presidente fraco por um bem mais competente, como decerto seria, p. ex., o FHC.

3 comentários:

SF disse...

Celso,

Lê o seu blog é como assistir esta tragédia de camarote.

Paulo disse...

De fato, o julgamento no TSE era um plano B. No entanto, suas críticas à delação da JBS não sã razoáveis. Essa delação cria obstáculos à política destruidora em curso e mostra uma realidade que deve ser conhecida pelo povo brasileiro. Assim sendo, seu artigo faz mais mal do que bem.

celsolungaretti disse...

Paulo,

"a política destruidora em curso" é a única possível sob o capitalismo, tanto que a Dilma nomeou um ministro neoliberal (Joaquim Levy) para fazer a mesmíssima coisa. As mudanças trabalhistas são secundárias, mas não existe jeito nenhum no mundo de, DENTRO DA LÓGICA CAPITALISTA, as contas da Previdência se equilibrarem com cada vez menos contribuintes e cada vez mais beneficiários.

Ou seja, a terceirização e a extinção de empregos em função de avanços tecnológicos fazem diminuir o número de pagantes. A longevidade cada vez maior da população faz aumentar o número dos que devem ser pagos. Há enganadores fazendo mil e um contorcionismos para sustentarem que esta conta pode fechar, mas na vida real não fecha nem nunca fechará. Basta saber direitinho as quatro operações aritméticas para se chegar a tal conclusão.

Mas, e FORA DA LÓGICA CAPITALISTA? Aí sim, pois o homem já tem condições tecnológicas de produzir, sem a atual destruição do meio ambiente, o suficiente para cada pessoa do planeta levar uma vida decente. Aos idosos tudo seria dado sem nenhuma exigência de contrapartida, abolindo-se as grandes desvantagens que hoje os inativos levam na comparação com os ativos.

O problema seria cortar produtos desnecessários, atividades parasitárias e estabelecer a prioridade do bem comum sobre as ambições individuais. Esta conta sim, fecharia!

Mas, essa esquerda desvirtuada que está aí desistiu da revolução e se acomodou ao papel de força auxiliar do capitalismo, prostituída e aburguesada. Então, não pode admitir a verdade: essa odiosa reforma da Previdência é impossível de ser evitada sob o capitalismo, mais dia, menos dia, acabará ocorrendo.

Os populistas/reformistas preferem embromar. Quando estão no poder, abrem as pernas para o grande capital. Quando estão fora do poder, atacam demagogicamente as reformas e satanizam o presidente da vez, como agora.

O que eu prego o tempo todo é: vamos parar de desperdiçar nosso tempo em Brasília e voltar a nos fazer presentes junto ao povo de todo o Brasilzão, organizando-o para a luta contra a capitalismo.

Caso contrário, continuaremos mais 32 anos patinando sem sair do lugar, como vimos fazendo desde a redemocratização.

A conciliação de classes chegou a um beco sem saída. Temos de voltar à origem de tudo: a LUTA DE CLASSES.

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