"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da sua
pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para
odiar as pessoas precisam aprender e, se elas
podem aprender a odiar, elas podem ser
ensinadas a amar." (Nelson Mandela)
.
Há pouco mais de um século, os colonizadores brancos açoitavam os negros nos pelourinhos de suas fazendas e praças das cidades; depois, aos domingos iam à missa professar os dogmas cristãos de tolerância, irmandade, de não violência e de amor ao próximo.
Havia igrejas de brancos e igrejas de pretos. Embora nelas se dissesse que os homens eram irmãos, filhos de Deus, os negros não eram considerados tão iguais assim.
No período colonial se considerava que a barbárie da escravidão direta era o preço a pagar-se pela benfazeja colonização e pelo progresso da civilização; assim se justificava a segregação racial contra índios (tidos como preguiçosos por não se submeterem aos trabalhos escravos numa terra na qual anteriormente viviam livres) e contra os negros (trazidos acorrentados da África em porões de navios, qual animais, para serem vendidos como mercadoria).
Uns por convicção sincera, outros por mera hipocrisia, a grande maioria aceitava que, para haver progresso e ganhos civilizacionais, eram necessários tais sacrifícios.
Cabe traçarmos um paralelo entre a escravidão direta, pré-capitalista, e a postura atual dos segmentos sociais dominantes, assessorados por seus áulicos de estimação. Nesta fase terminal do capitalismo, em que poderíamos caminhar pra frente, colocando os ganhos do saber e a serviço da humanidade para emancipá-la, eles defendem (influenciando muita gente) a volta a um passado que nunca foi bom, mas que era melhor do que o presente.
Mas, embora a roda da História seja em alguns momentos detida por obstáculos e até retroceda, ela acaba sempre retomando o seu curso natural. Então, ao atual período de retrocesso deve seguir-se um impulso mais acelerado pra frente, caso a vida planetária não seja interrompida pelo belicismo bestial.
É óbvio que a recaída num capitalismo belicista, nacionalista, xenófobo, racista, machista e, enfim, mais segregacionista, não vai resolver um problema que nasce justamente do anacronismo de tal segregação social causada por um modo de relação social que se tornou inviável graças às contradições na dinâmica dos seus próprios fundamentos. O imperativo do desenvolvimento econômico, que todos defendem, significa apenas mais do mesmo.
Não há sobrevivência possível para o capitalismo no atual estágio da concorrência de mercado (a partir da produção tecnológica de mercadorias) e a adoção pelo Estado de políticas segregacionistas não terá o condão de mantê-lo em pé. A história seguirá o seu rumo inexorável, mas não podemos esperar que as coisas se resolvam sozinhas, aceitando passivamente as políticas de austeridade, sob pena de nos tornarmos sacrifício humano no altar da vã tentativa de salvação capitalista.
O povo alemão engoliu a cantilena nazista da exclusão como receita para o reerguimento da Alemanha, sendo levado a crer na superioridade da raça ariana e do comando político-imperialista alemão.
O povo alemão engoliu a cantilena nazista da exclusão como receita para o reerguimento da Alemanha, sendo levado a crer na superioridade da raça ariana e do comando político-imperialista alemão.
A história acontece como tragédia... |
Como consequência, teve suas principais cidades destruídas e milhões de pessoas dizimadas, principalmente jovens que marcharam iludidos para o sacrifício inútil, sob o matraquear das metralhadoras que dilaceravam os seus corpos num momento em que deveriam, isto sim, estar desfrutando as delícias da mocidade.
Os judeus foram feitos de bodes expiatórios para a decadência do capitalismo alemão após a 1ª Guerra Mundial. É sempre assim. Quando o capitalismo emperra, sempre se apontam supostos culpados, porque a mente social aprisionada pelo fetichismo da mercadoria é incapaz de enxergar que o ato de comprar e vender não é algo natural, representando, isto sim, um mecanismo de segregação social cuja lógica caminha para um ponto de contradição inexorável. O fim já se avizinha e, por mais que o retardem, não o conseguirão evitar.
Agora a bola da vez são os ataques às posturas humanistas. A falácia da austeridade, que coloca a culpa das dificuldades sociais nos ombros das eternas vítimas do capitalismo, legitima posturas excludentes e individualistas, de modo a que o estadunidense Donald Trump, a francesa Marine Le pen, o inglês Nigel Forage, o austríaco Norbert Hofer e o alemão Franke Petry, além dos candidatos tupiniquins a Hitler subdesenvolvidos, hoje se alardeiam como salvadores da pátria, defendendo sem o menor pejo as posturas mais desumanas.
...depois se repete como farsa... |
A miséria nunca foi boa conselheira. Em fase de depressão irreversível, o capitalismo caminha para barbárie e o ecocídio. É mais fácil guardar egoisticamente para si o último toucinho da despensa do que garantir o prolongamento da vida mediante uma produção coletiva que proporcione toucinho para todos.
É mais fácil aceitar que o Estado demita, policie os revoltosos, mantenha ou aumente os impostos, salvando assim o sistema financeiro da bancarrota, ainda que isto imponha sacrifícios inauditos à população exaurida, do que negar o Estado e a política convencional, partindo para a construção do novo desconhecido.
E não adianta ficarmos esperando que os demagogos salvadores da pátria acabem se desmoralizando, com seu consequente defenestramento do poder, pois eles serão substituídos por outros lobos em peles de cordeiros, num eterno pêndulo da ineficácia.
Há que negarmos o poder; negarmos a política; negarmos a forma de mediação social que segrega; e de empregarmos todas as nossas energias e saberes acumulados pela humanidade no sentido sua emancipação.
Por que continuarmos repetindo as fórmulas que nada resolveram, esperando que deem certo na próxima tentativa? A lógica mais banal aponta na direção contrária.
...e pode até virar chanchada. |
Por que reivindicarmos mais salários, se é a mecânica dos salários é aquilo que nos oprime sem que compreendamos o porquê da opressão, tal qual um viciado em cocaína precisa da droga que o consome para a estabilização momentânea da sua dependência àquilo que o mata?
Por que exigirmos políticos honestos, se é a política aquilo que nos mantém aprisionados na camisa-de-força chamada democracia (a arapuca que nos faz acreditar que temos direito de escolha, quando, na verdade, nossas opões estão restritas àquilo que já foi escolhido)?
Por que acharmos que precisamos de mais policiamento e cadeias, numa guerra urbana na qual os peões fardados se confrontam com peões descamisados igualmente armados, com a intensificação morticínio dos dois lados, ao invés de cultivarmos uma cultura de paz, com indivíduos sociais que não sejam adversários entre si e apoiem outros seres humanos na busca da felicidade?
Por que os sindicatos de trabalhadores não se transformam em sindicatos de homens livres, que denunciam o trabalho como a fonte primária de uma forma de relação social escravagista por excelência, na qual tudo é valor monetário e mensurado por esse mesmo padrão, como se a vida estivesse subordinada a uma lógica ilógica de acumulação de riqueza abstrata quando falta riqueza material para o povo?
Será isto impossível por estarmos fadados a uma autodestruição fratricida? A resposta a tal indagação é um rotundo NÃO, desde que nos livremos dessa matriz fetichista mercantil que aprisionada o nosso pensar, e que leva muitos a acreditarem que os defensores da essência do mal sejam capazes de extirpar o próprio mal. (por Dalton Rosado)
Nenhum comentário:
Postar um comentário