Por Clóvis Rossi |
A FRAUDE QUE A ESQUERDA ENGOLIU
Ao contrário do que acontece na maior parte do mundo, a desigualdade -essa imensa chaga no corpo social brasileiro- não aparece nem de leve nos debates sobre o que fazer para o País recuperar vitalidade.
É fácil explicar por quê: não é um tema para a direita triunfante, mais preocupada com as contas públicas do que com os que mal podem pagar suas contas. E a esquerda, historicamente inquieta com o tema, preferiu render-se à fraude de que a desigualdade teria caído sob Lula.
O que caiu -se é que caiu mesmo- foi a desigualdade entre salários, mas jamais a disparidade entre a renda do capital e a do trabalho, verdadeiramente obscena.
É fácil entender: o único instrumento em que se apoiava a lenda da queda da desigualdade é a Pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar.
Não é instrumento idôneo: os pesquisadores perguntam a renda da família. Quem vive só de trabalho ou de outro rendimento fixo diz o que ganha. Quem, além do salário ou de rendimento fixo, recebe proventos advindos de aplicações financeiras omite essa parte da renda. Ou por mero esquecimento, portanto de boa-fé, ou por medo (do fisco, de sequestro, do que seja).
Como aumentou a renda dos mais pobres, a partir dos diferentes tipos de bolsas, a pesquisa registra diminuição da desigualdade, mas somente por uma falsa declaração dos mais ricos.
Em 2015, Marcelo Medeiros, Pedro Ferreira de Souza e Fábio Avila de Castro, todos da Universidade de Brasília e, os dois primeiros, também do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, lançaram na equação da desigualdade dados do imposto de renda e chegaram a uma triste conclusão: não houve em absoluto queda da desigualdade nos últimos 20 anos.
Um só dado: os 5% mais ricos passaram de deter cerca de 40% da renda total do país em 2006 a abocanhar 44% em 2012. Guardadas as proporções, o 1% mais rico e o 0,1% superrico também ficaram com uma fatia ainda maior que a obscena cota que tinham em 2006.
O Ipea (instituto do governo) proibiu a difusão do estudo, como é natural: a corte odeia quem grita "o rei está nu".
Mas o trabalho circulou entre especialistas e provocou observações, o que levou Marcelo e Pedro a uma revisão da pesquisa. Saiu há pouco o novo resultado e, sem surpresas, é igual ao anterior: não houve redução da desigualdade.
Nem poderia haver: o governo destina aos juros e encargos da dívida, em um ano, o equivalente a 15 anos do gasto com Bolsa Família.
Ou, posto de outra forma, o governo paga às (poucas) famílias mais ricas em um ano o que vai para 42 milhões de pobres em 15 anos. É transferência de renda, sim, mas de todos os contribuintes, inclusive os pobres, para os ricos e ultrarricos.
A realidade desmancha, assim, a narrativa que o governo ensaiou inutilmente, a de que a onda anti-Dilma é uma vingança dos ricos contra o governo dos pobres. Como diz sempre o próprio Lula, os ricos nunca ganharam tanto dinheiro como em seu governo.
E a esquerda ficou em silêncio.
3 comentários:
A verdadeira bolsa é a bolsa-rico. Por exemplo...
Quem aplicar um milhão de reais (278.000 dólares) receberá algo como R$ 50.000,00 por ano em juros reais, se optar pelo Tesouro Direto IPCA+Juros semestrais 2050. Tendo o capital inicial corrigido pelo IPCA e os Juros Semestrais (reais) calculados sobre a base reajustada pela inflação!
Só para ter uma idéia calculei a evolução da capital inicial corrigido por uma inflação de médios 4% aa em 34 anos. Deu R$ 3.700.000. Sem contar os juros reais que seriam pagos anualmente, os quais, numa aproximação simplista, seriam, em média, de 117mil, ou seja, mais R$ 3.995.000,00!
O ministro defendeu isso a poucos dias no STF, quando da discussão sobre a dívida dos estados.
Seu argumento? É assim que se opera no mercado financeiro!
Siga o dinheiro e desvendarás o verdadeiro objetivo dos movimentos políticos.
Não há quem queira perder uma boquinha dessas!
Concordo somente em parte com o texto. Não estou com tenpo de escrever muito agora, mas depous explico melhor. E também não acho qe é rico contra pobre necessariamente, mas os de renda mais alta estão preocupados com a diminuição das marcas de distinção (como diria Bourdieu). Isso eles não conseguem aceitar.
Robson,
só um detalhe: o artigo não é meu, é do Clóvis Rossi.
Além dos textos de minha autoria e das colaborações do Apollo Natali, Dalton Rosado e Rui Martins, trago para o blogue artigos da grande imprensa que, a meu ver, contém informações interessantes para nós.
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