"...o indivíduo tem o direito de matar em legítima defesa, enquanto a coletividade não o tem? Responde-se: a coletividade não tem esse direito porque a legítima defesa nasce e se justifica somente como resposta imediata numa situação na qual seja impossível agir de outro modo; a resposta da coletividade é mediatizada através de um processo, por vezes até mesmo longo, no qual se conflitam argumentos pró e contra.
Em outras palavras, a condenação à morte depois de um processo não é mais um homicídio em legítima defesa, mas um homicídio legalizado, perpetrado a sangue frio, premeditado. Um homicídio que requer executores, ou seja, pessoas autorizadas a matar.
...o Estado não pode colocar-se no mesmo plano do indivíduo singular. O indivíduo age por raiva, por paixão, por interesse, em defesa própria. O Estado responde de modo mediato, reflexivo, racional. Também ele tem o dever de se defender. Mas é muito mais forte do que o indivíduo singular e, por isso, não tem necessidade de tirar a vida desse indivíduo para se defender. O Estado tem o privilégio e o benefício do monopólio da força. Deve sentir toda a responsabilidade desse privilégio e desse beneficio.
...busquemos dar uma razão para nossa repugnância frente à pena de morte. A razão é uma só: o mandamento de não matar. (...) Dostoiévski o disse magnificamente, quando pôs na boca do Príncipe Michkin as seguintes palavras: 'Foi dito: Não matarás. E, então, se alguém matou, por que se tem de matá-lo também? Matar quem matou é um castigo incomparavelmente maior do que o próprio crime. O assassinato legal é incomparavelmente mais horrendo do que o assassinato criminoso'.
...acreditamos firmemente que o desaparecimento total da pena de morte do teatro da história estará destinada a representar um sinal indiscutível do progresso civil. Esse conceito foi muito bem expresso por John Stuart Mill (...): 'Toda a história do progresso humano foi uma série de transições por meio das quais costumes e instituições, umas após outras, foram deixando de ser consideradas necessárias à existência social e passaram para a categoria de injustiças universalmente condenadas'.
Estou convencido de que esse será também o destino da pena de morte. Se me perguntarem quando se cumprirá esse destino, direi que não sei. Sei apenas que o seu cumprimento será um sinal indiscutível do progresso moral." (Norberto Bobbio, um dos maiores pensadores do século 20)
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