sábado, 18 de janeiro de 2014

LÚCIO FLÁVIO, PASSAGEIRO DE UMA AGONIA QUE PERDURA ATÉ HOJE

Os brasileiros avessos a argentinos que me desculpem mas, depois da morte de Glauber Rocha e do declínio dos grandes nomes do cinema novo, foi o hermano Hector Babenco quem segurou as pontas da cinematografia brasileira em termos de qualidade e relevância, pelo menos até a afirmação de Walter Salles na década de 1990.

E, sem desmerecer Pixote: a lei do mais fraco, O beijo da mulher aranha e Carandiru, sua obra-prima é mesmo Lúcio Flávio, o passageiro da agonia (1977), que esmiuça a atuação da polícia bandida (ou seja, da polícia que era parceira dos bandidos, fornecendo-lhes armas e proteção em troca de parte substancial do produto dos roubos) e o nascimento do Esquadrão da Morte no Rio de Janeiro. Um filme que contrastou vivamente com as produções cautelosas daquela fase da ditadura.

Ótima direção de Babenco, marcantes atuações de Reginaldo Faria como o bandido Lúcio Flávio Vylar Lirio (um personagem interessante, pois se tornou criminoso após ver sua casa invadida e seu pai humilhado por agentes do Dops durante uma festa de casamento) e de Paulo César Peréio como o policial Moretti (ersatz do famoso Mariel Mariscot), e um tema que continua atualíssimo, pois a associação entre policiais e criminosos só fez aumentar desde então, assim como as ilegalidades e torturas praticadas nas delegacias.

Aliás, a forma chocante como as torturas são mostradas no filme foi o que mais causou espanto em 1977. Mesmo não se tratando de maus tratos infligidos a prisioneiros políticos, tratava-se de um tema tabu. Foi uma surpresa o filme ser liberado pela censura, sinalizando que o pior momento da ditadura havia finalmente passado.

Recomendo enfaticamente.

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