Uma falácia das viúvas e discípulos da ditadura são as comparações desfavoráveis à democracia que espalham entre os desinformados. Dizem que a economia era mais próspera nos anos de chumbo, que havia menos violência e corrupção, etc.
Há idosos que avalizam esse besteirol, ajudando a desnortear as novas gerações.
O homem comum tende a engolir a propaganda oficial e a não reparar quando notícias lhes são sonegadas pela censura. A percepção do povão que aplaudia o sanguinário ditador Médici no estádio do Maracanã era bem diferente da dos que conhecíamos as entranhas, os escândalos abafados e os esqueletos no armário do regime.
Agora, p. ex., há total transparência em relação aos casos de ardência e irritação provocados por alguns lotes de Toddynho contaminados por detergente, que foram vendidos no Rio Grande do Sul.
Atuando em assessorias de imprensa, cheguei a formular e implementar a estratégia de comunicação de vários recalls de produtos. Alertavam-se as autoridades, os comerciantes, o público em geral. Substituíam-se os itens imperfeitos. Prestavam-se contas e apresentavam-se civilizadas desculpas, juntamente com o anúncio das providências adotadas para que a falha não se repetisse.
Ou seja, a opção nunca era por ocultar o problema, mas por corrigi-lo com o máximo profissionalismo. Houve vezes em que nenhuma fiscalização ou consumidor percebeu o ocorrido e este não era potencialmente perigoso, mas, mesmo assim, foi feito o recall.
Já nos estados policiais as informações adversas são sonegadas com a maior sem cerimônia dos cidadãos.
Tratava-se de um contrato tão crapuloso que a conta era integralmente paga pela tal multinacional, mas o trabalho executado em nome de uma associação fantasma de fabricantes de agrotóxicos, criada às pressas para servir como fachada.
Coube-me redigir material de imprensa destacando a notável contribuição que os defensivos agrícolas estariam dando à agricultura brasileira e os terríveis prejuízos que sua eventual proibição acarretaria: fome da população, desemprego no campo, queda das exportações.
Eram textos aparentemente inocentes, mas não o que estava por trás deles: o raciocínio desumano de que, para evitarem-se tais prejuízos, poderiam ser relevadas as mortes que foram noticiadas. Muitas outras não o foram, com a conivência das otoridades.
Pior ainda era o papel do dono da agência, um pioneiro da área de assessoria de imprensa e eventos (por ele designados como promoções), que se incumbia pessoalmente de falar com os jornalistas influentes, distribuindo subornos e fazendo ameaças veladas.
Repugnava-me vê-lo elogiar a si próprio por haver conseguido sustar a publicação de uma notícia sobre mortes de trabalhadores rurais que já descera para a gráfica de um jornalão. “Eu parei as rotativas”, proclamava, orgulhoso, para os empresários interessados nos seus serviços.
Ele considerava que haver levado a bom termo uma incumbência tão infame lhe servia como galardão profissional. E não é que os empresários entravam na dele?! Eu assistia e ficava pensando: "Este é o milagre brasileiro visto por dentro".
Participar dessa empreitada foi a primeira grande decepção de minha carreira jornalística. Muitas outras viriam, com os interesses econômicos prevalecendo sobre o bem comum e eu nada podendo fazer para remediar a situação, sob pena de perder o emprego e ficar com o mercado de trabalho fechado para mim.
Então, graças à censura sobre a imprensa e aos mecanismos de persuasão dos poderosos, o povo brasileiro deixou de ser informado dos riscos que corria quem utilizasse agrotóxicos. E ocultar-lhe mortes por envenenamento registradas em todo o País certamente contribuiu para que outras ocorressem.
A tal multinacional jamais ousaria proceder de forma tão leviana no 1º mundo: para reduzir custos, não investira no treinamento adequado dos usuários de seus produtos.
Mesmo assim, com a conivência do regime militar, conseguiu apagar o incêndio: ministrou rapidamente os cursos que deixara de promover no momento exato e não arcou com as multas astronômicas que lhe seriam aplicadas em qualquer país cujo governo zelasse pelos governados.
De quebra, indenizou mal e porcamente, por baixo do pano, as famílias das vítimas, que não tiveram como arrancar reparações à altura da gravidade das perdas que sofreram.
Ficou-me também a impressão de que o êxito da operação de acobertamento se deveu ao fato de que os mortos eram irrelevantes. Se os finados não fossem os coitadezas das zonas rurais, certamente aquelas mortes acabariam tendo maior repercussão.
Há idosos que avalizam esse besteirol, ajudando a desnortear as novas gerações.
O homem comum tende a engolir a propaganda oficial e a não reparar quando notícias lhes são sonegadas pela censura. A percepção do povão que aplaudia o sanguinário ditador Médici no estádio do Maracanã era bem diferente da dos que conhecíamos as entranhas, os escândalos abafados e os esqueletos no armário do regime.
Agora, p. ex., há total transparência em relação aos casos de ardência e irritação provocados por alguns lotes de Toddynho contaminados por detergente, que foram vendidos no Rio Grande do Sul.
Atuando em assessorias de imprensa, cheguei a formular e implementar a estratégia de comunicação de vários recalls de produtos. Alertavam-se as autoridades, os comerciantes, o público em geral. Substituíam-se os itens imperfeitos. Prestavam-se contas e apresentavam-se civilizadas desculpas, juntamente com o anúncio das providências adotadas para que a falha não se repetisse.
Ou seja, a opção nunca era por ocultar o problema, mas por corrigi-lo com o máximo profissionalismo. Houve vezes em que nenhuma fiscalização ou consumidor percebeu o ocorrido e este não era potencialmente perigoso, mas, mesmo assim, foi feito o recall.
Já nos estados policiais as informações adversas são sonegadas com a maior sem cerimônia dos cidadãos.
AGROTÓXICOS LETAIS
Foi o que fez a ditadura militar brasileira com as mortes de trabalhadores rurais intoxicados por defensivos agrícolas e com uma epidemia de meningite, nas duas vezes, pretensamente, para evitar o pânico.
O primeiro episódio eu acompanhei de perto. Trabalhava na agência de comunicação empresarial que, em meados da década de 1970, foi contratada por uma multinacional para evitar que repercutissem as seguidas ocorrências de envenenamento de cidadãos brasileiros nas áreas rurais.
Tratava-se de um contrato tão crapuloso que a conta era integralmente paga pela tal multinacional, mas o trabalho executado em nome de uma associação fantasma de fabricantes de agrotóxicos, criada às pressas para servir como fachada.
Coube-me redigir material de imprensa destacando a notável contribuição que os defensivos agrícolas estariam dando à agricultura brasileira e os terríveis prejuízos que sua eventual proibição acarretaria: fome da população, desemprego no campo, queda das exportações.
Eram textos aparentemente inocentes, mas não o que estava por trás deles: o raciocínio desumano de que, para evitarem-se tais prejuízos, poderiam ser relevadas as mortes que foram noticiadas. Muitas outras não o foram, com a conivência das otoridades.
Pior ainda era o papel do dono da agência, um pioneiro da área de assessoria de imprensa e eventos (por ele designados como promoções), que se incumbia pessoalmente de falar com os jornalistas influentes, distribuindo subornos e fazendo ameaças veladas.
"EU PAREI AS ROTATIVAS"
Repugnava-me vê-lo elogiar a si próprio por haver conseguido sustar a publicação de uma notícia sobre mortes de trabalhadores rurais que já descera para a gráfica de um jornalão. “Eu parei as rotativas”, proclamava, orgulhoso, para os empresários interessados nos seus serviços.
Ele considerava que haver levado a bom termo uma incumbência tão infame lhe servia como galardão profissional. E não é que os empresários entravam na dele?! Eu assistia e ficava pensando: "Este é o milagre brasileiro visto por dentro".
Participar dessa empreitada foi a primeira grande decepção de minha carreira jornalística. Muitas outras viriam, com os interesses econômicos prevalecendo sobre o bem comum e eu nada podendo fazer para remediar a situação, sob pena de perder o emprego e ficar com o mercado de trabalho fechado para mim.
A tal multinacional jamais ousaria proceder de forma tão leviana no 1º mundo: para reduzir custos, não investira no treinamento adequado dos usuários de seus produtos.
Mesmo assim, com a conivência do regime militar, conseguiu apagar o incêndio: ministrou rapidamente os cursos que deixara de promover no momento exato e não arcou com as multas astronômicas que lhe seriam aplicadas em qualquer país cujo governo zelasse pelos governados.
De quebra, indenizou mal e porcamente, por baixo do pano, as famílias das vítimas, que não tiveram como arrancar reparações à altura da gravidade das perdas que sofreram.
Ficou-me também a impressão de que o êxito da operação de acobertamento se deveu ao fato de que os mortos eram irrelevantes. Se os finados não fossem os coitadezas das zonas rurais, certamente aquelas mortes acabariam tendo maior repercussão.
5 comentários:
Celso, desculpe a ignorância, mas quem são algumas das imagens da abertura do teu blogue:
o 1 na linha do alto ao lado de Trotski, e o penúltimo na linha do alto ao lado de Freud;
o 3 na linha do meio ao lado do Che, o 5 abaixo do Marighella, o 6 ao lado da Rosa, e o 8 ao lado da Rosa;
na coluna de baixo o 1, 2,3 e 4
Faz mais sentido dar a relação inteira, companheiro:
Thoureau
Trotsky
Gandhi
Mandella
Muhammad Ali
Brecht
Rousseau
Freud
Marx
Che
Proudhon
Bolivar/Zumbi
Marighella/Garcia Lorca
Anita Garibaldi
Rosa Luxemburgo
Prometeu
Spartacus
Galileu
Marcuse
Thomas Morus
Gramsci
Lennon
Martin Luther King
Allende
Valeu Celso, é que os outros eu já sabia.
Ora, vc me deu a chamada boa idéia. Percebi que valia a pena botar a lista logo no topo da coluna da direita.
Abs.
Postar um comentário