"Aqueles a quem os deuses querem perder, primeiramente enlouquecem", disse Goethe.
Quando os EUA tentam convencer a opinião pública mundial da necessidade de uma operação militar contra o Irã, não consigo imaginar procedimento mais estúpido por parte das autoridades daquele país do que teimarem em manter presa e ameaçada de execução horrível uma mulher por algo que nem sequer é crime em nações civilizadas.
Isto projeta uma imagem extremamente negativa do Irã, inspirando todas as desconfianças: quem se dispõe a apedrejar até a morte seu semelhante por uma mera presunção de adultério, que outras barbaridades não será capaz de cometer?
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva bem que tentou remediar a situação, ao oferecer asilo para Sakineh Ashtiani. Sua vida seria salva, com Ahmadinejad podendo sempre alegar aos aloprados de Teerã que atendera a um apelo de aliado importante.
Negativo. O estado teocrático do Irã é impermeável à razão e ao bom senso, como o são sempre os fanáticos religiosos.
Então, por suas sistemáticas violações dos direitos universais do homem, o Irã inspira tanto temor que só conseguirá levar adiante seu projeto nuclear, alegadamente pacífico, se aceitar submeter-se à mais rigorosa fiscalização de organismos internacionais.
E conseguiu o prodígio de fazer com que fosse praticamente esquecido o igualmente bárbaro ataque à flotilha de ajuda humanitária a Gaza, que era grande argumento em seu favor: se um país tão transgressor do Direito internacional como Israel possui artefatos nucleares há décadas, que autoridade moral têm os EUA e a ONU para encarniçarem-se contra o Irã?
Enlouquecidos pelos deuses, os dirigentes iranianos veem um abismo abrir-se à frente... e continuam marchando na sua direção.
"NÃO HÁ TESTEMUNHA. É A MAIOR PROVA
DE QUE O PROCESSO NÃO ESTÁ CORRETO"
Uma boa idéia do ambiente irrespirável no Irã é dada pela entrevista que a Folha de S. Paulo fez, por telefone, com o advogado de Sakineh, Mohammad Mostafaei, de notória atuação na defesa dos direitos humanos, que teve de fugir do país para não ser igualmente preso. Eis os principais trechos:
"Há mais de dois anos, sofro uma pressão muito grande. Meus casos tinham importância internacional, sendo o mais recente o de Sakineh. A gota d'água foi pegarem como reféns minha mulher e seu pai. Tenho muito amor pelo Irã e pelo meu trabalho. Posso dizer que já ajudei a salvar a vida de mais de 50 pessoas. Eu quero atuar no Irã, mas, infelizmente, a pressão que sofro é insuportável.
"Minha mulher está em uma solitária há 12 dias, na cela 209 da prisão de Evin. Minha mulher não cometeu nenhum crime e está numa situação muito difícil. Minha filha, agora, não tem a atenção nem do pai nem da mãe.
"Ela [Sakineh] não cometeu crime nenhum. O caso não tem nada a ver com as acusações feitas a ela. Os filhos cuidam do bem-estar dela. Se tivesse havido crime, os filhos seriam os primeiros a se manifestar. Para provar adultério, precisam existir testemunhas de quatro ocasiões [relações sexuais] ou quatro testemunhas de uma mesma ocasião. E não há testemunha. É a maior prova de que o processo não está correto".
Um comentário:
Bom artigo.
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