Independentemente da avaliação que cada um de nós faça do presidente venezuelano Hugo Chávez e do seu projeto bolivariano, cabe uma pergunta: por que cria tantos constrangimentos para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva?
Primeiro, foi a admissão de que esteve intensamente envolvido no planejamento e execução da nova tentativa que o presidente deposto Manuel Zelaya está fazendo para recuperar o poder em Honduras.
É tudo de que Lula não precisava neste instante, pois se tratou de um trunfo dado de mão beijada para seus inimigos. O sempre conservador jornal O Estadão de S. Paulo logo aproveitou a bola levantada por Chávez para marcar um ponto, no editorial de sábado :
Este, aliás, parece muito orgulhoso do imbroglio que armou. Não deveria.
Como comentei, a chance de Zelaya recuperar o poder, frustrando a intenção dos golpistas de manterem-no afastado até elegerem e empossarem um novo presidente, seria de que sua presença no solo pátrio fizesse o povo derrubar o governo golpista e/ou os organismos internacionais (ONU e OEA) passarem das palavras aos atos. Nenhuma dessas possibilidades vingou.
Então, como comentei no meu artigo de ontem, o Brasil ficou num mato sem cachorro.
De um lado, por mais que negue, será sempre visto como apoiador da tentativa de Zelaya. Se esta fracassar, o fracasso respingará em Lula.
De outro, o governo ilegítimo de Honduras captou o recado do Conselho de Segurança da ONU (de que continuará de braços cruzados se a representação diplomática brasileira não for invadida) e decidiu dar mais dez dias ao Brasil para definir o status de Zelaya na embaixada.
Ou seja, descartou uma invasão e fica trombeteando que sua paciência no episódio tem sido "infinita".
Tira, assim, o único argumento que tornaria mais palatável uma incursão militar brasileira para resolver as coisas como as grandes nações costumam fazer, impondo sua vontade às pequenas (para não irmos muito longe, foi o procedimento adotado por George Bush no Afeganistão e no Iraque).
Lula pode, mesmo assim, ordenar uma tal incursão? Pode. Pelo visto, a ONU e a OEA não iriam além das resoluções platônicas de protesto. Obama, idem.
Mas, claro, o ônus político seria altíssimo -- exatamente o de ser comparado a presidentes intervencionistas e arrogantes como Bush. Lula ousará ir tão longe? Duvido.
Então, salvo uma reviravolta nos acontecimentos, inexistirão reais motivos para Chávez orgulhar-se do seu feito.
Caso termine sem vitória, o episódio só terá servido para desgastar Lula e queimar a última chance de Zelaya retornar ao poder, evitando o péssimo precedente de uma reincidência golpista na América Latina em pleno século XXI.
Coraçãozinho x ingerência - Chávez também falou o que não deveria em seu discurso na abertura da 2ª Cúpula América do Sul-África, que se realiza na Venezuela: "Dilma será a próxima presidente do Brasil".
Depois, justificou-se aos jornalistas:
Como Lula gosta muito de lembrar as pérolas da sabedoria popular, deveria ensinar uma ao aliado muy amigo: "em boca fechada não entra mosca".
Primeiro, foi a admissão de que esteve intensamente envolvido no planejamento e execução da nova tentativa que o presidente deposto Manuel Zelaya está fazendo para recuperar o poder em Honduras.
É tudo de que Lula não precisava neste instante, pois se tratou de um trunfo dado de mão beijada para seus inimigos. O sempre conservador jornal O Estadão de S. Paulo logo aproveitou a bola levantada por Chávez para marcar um ponto, no editorial de sábado :
"Boquirroto, como sempre, o caudilho Hugo Chávez já contou como aconselhou e auxiliou o presidente deposto Manuel Zelaya a voltar a Honduras e a buscar abrigo na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Forneceu os meios para a viagem e participou pessoalmente de uma operação de despistamento, para levar o governo de facto de Honduras a crer que o presidente deposto estava indo para Nova York, quando seu destino era seu próprio país. O que ainda não está claro é se Hugo Chávez deu conhecimento de seu plano ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao Itamaraty ou se decidiu colocar o Brasil numa situação delicada - numa verdadeira armadilha - sem avisar ninguém, dando por bem que pode manobrar à vontade o seu aliado brasileiro".Tanto para a imagem de Lula quanto para a de Zelaya, teria sido muito melhor que a mão de Chávez não transparecesse. Ficou parecendo que ambos foram manobrados pelo presidente venezuelano.
Este, aliás, parece muito orgulhoso do imbroglio que armou. Não deveria.
Como comentei, a chance de Zelaya recuperar o poder, frustrando a intenção dos golpistas de manterem-no afastado até elegerem e empossarem um novo presidente, seria de que sua presença no solo pátrio fizesse o povo derrubar o governo golpista e/ou os organismos internacionais (ONU e OEA) passarem das palavras aos atos. Nenhuma dessas possibilidades vingou.
Então, como comentei no meu artigo de ontem, o Brasil ficou num mato sem cachorro.
De um lado, por mais que negue, será sempre visto como apoiador da tentativa de Zelaya. Se esta fracassar, o fracasso respingará em Lula.
De outro, o governo ilegítimo de Honduras captou o recado do Conselho de Segurança da ONU (de que continuará de braços cruzados se a representação diplomática brasileira não for invadida) e decidiu dar mais dez dias ao Brasil para definir o status de Zelaya na embaixada.
Ou seja, descartou uma invasão e fica trombeteando que sua paciência no episódio tem sido "infinita".
Tira, assim, o único argumento que tornaria mais palatável uma incursão militar brasileira para resolver as coisas como as grandes nações costumam fazer, impondo sua vontade às pequenas (para não irmos muito longe, foi o procedimento adotado por George Bush no Afeganistão e no Iraque).
Lula pode, mesmo assim, ordenar uma tal incursão? Pode. Pelo visto, a ONU e a OEA não iriam além das resoluções platônicas de protesto. Obama, idem.
Mas, claro, o ônus político seria altíssimo -- exatamente o de ser comparado a presidentes intervencionistas e arrogantes como Bush. Lula ousará ir tão longe? Duvido.
Então, salvo uma reviravolta nos acontecimentos, inexistirão reais motivos para Chávez orgulhar-se do seu feito.
Caso termine sem vitória, o episódio só terá servido para desgastar Lula e queimar a última chance de Zelaya retornar ao poder, evitando o péssimo precedente de uma reincidência golpista na América Latina em pleno século XXI.
Coraçãozinho x ingerência - Chávez também falou o que não deveria em seu discurso na abertura da 2ª Cúpula América do Sul-África, que se realiza na Venezuela: "Dilma será a próxima presidente do Brasil".
Depois, justificou-se aos jornalistas:
"Sei que vão me acusar de ingerência, meu coraçãozinho é quem está falando. Minha candidata é a Dilma".Ou seja, agora a direita não precisará mais utilizar fichas policiais falsas em suas campanhas de difamação de Dilma Rousseff. Vai acusá-la de candidata do Chávez, batendo na tecla nacionalista. Será um ótimo mote para a propaganda enganosa e pregações golpistas nos quartéis.
Como Lula gosta muito de lembrar as pérolas da sabedoria popular, deveria ensinar uma ao aliado muy amigo: "em boca fechada não entra mosca".
6 comentários:
Caro amigo,
Tens uns análises que é de tirar o chapéu.
Tua coragem, talvez decorrente de uma grande liberde, nos brinde com estes textos.
Há dias que eu estava com o "muy amigo" Chavez entalado na minha garganta, exatamente por isto.
No entanto eu não havia externado o que eu pensava por pura covardia da minha parte, uma vez que sou fã de carteirinha de Hugo Chavez.
No entanto tirastes da minha boca o meu pensamento, isto que há dias estava querendo desabafar, escrever.
Ocorreu exatamente isto que dizes, cara.
Chavez simplesmente jogou esta batata-quente chamada Zelaya nas mãos de Lula.
Simplesmente Chavez pode atrapalhar e tanto o presidente Lula, de quem Chavez diz-se grande amigo.
Que amigo, heim.
Ps1: só discordo de você quando se opões a Sarney de forma ardorosa, tudo bem, já li suas colocações, e respeito-as. Se bem Sarney, apesar de ter defendido dias atrás o MST, não tem cacife para entrar na minha galeria de revolucionários do pensamento, da política, da sociologia e da artes. Sei que tenho arrumado inimizades por conta desta minha defesa intransigente do coronel, você não viu que ele defendeu de forma ardente o MST. Meu medo de Sarney ser derrubado foi apenas de ver o Senado dominado pela gang do Zé Serra, FHC, Heráclito, Marconi Perillo, esta grande quadrilha da qual faz parte a imprensa brasileira.
Ps1: você sabe que eu estava usando na capa do IDEAÇÃO uma imagem que eu havia roubado de ti, o que estava me incomodando bastante. Para resolver isso destrui sua imagem, descontrui, transformei, acrescentei a imagem de um sonho.
Bom fds*
*fim de semana
Mais uma coisa, estás autorizado a utilizar a imagem do meu blog para a capa do seu, sou muito grato às pessoas que algum dia me fazem algum bem, não tem problema, podes usar como quiseres, mas a capa do seu blog já está muito bonita, por isso não resisti. Como de disse, agora estou aliviado porque embora tenha traços, já não é mais a mesma. No entanto a herança, a marca na fita de DNA será e)terna.
Companheiro,
minha formação revolucionária se deu na década de 1960, quando havia muito mais tolerância com o exercício da crítica.
Combatíamos como inimigos os porta-vozes da burguesia e da reação.
Tratávamos como adversários os companheiros de esquerda que divergiam de nós estrategicamente (p. ex., quanto à etapa da revolução brasileira a ser cumprida, se democratico-burguesa ou socialista) ou taticamente (p. ex., se o melhor caminho era a luta armada ou o movimento de massas "puro").
Hoje, se fazemos certos questionamentos, mesmo estando nitidamente engajados no campo da esquerda, corremos o risco de ser tratados como inimigos.
já houve momentos em que isso me acarretou perda de tribunas e saída de grupos de discussão.
Mas, se me deixasse intimidar, a atuação como blogueiro perderia todo o significado.
Pretendo, acima de tudo, contribuir para a formação de uma nova geração de revolucionários, transmitindo-lhe os ensinamentos e lições que minha geração aprendeu na luta.
Então, mesmo correndo o risco de enfrentar rejeições (que acabam prejudicando também as lutas que travo, como a atual em prol do Cesare Battisti), procuro manter vivo este valor: como homem de esquerda, temos o direito de discutir e aprofundar os assuntos. Não somos cordeirinhos para ficar balindo aprovação eterna a quem quer que seja.
Chávez vem a público afirmar que foi ele o principal inspirador da situação criada em Honduras.
Ora, por que ele não indicou a Zelaya o caminho da embaixada da Venezuela? Por que colocou o Brasil numa situação tão delicada?
A manchete da "Folha de S. Paulo" de hoje é que Zelaya está pregando a desobediência civil ao abrigo da embaixada brasileira. É claro que a gritaria dos reaças contra o Lula amanhã vai ser ensurdecedora.
Não dá para alguém como eu calar que Chávez cometeu, sim, uma ursada com o Lula, presumivelmente seu aliado. Ficaria com isto entalado na garganta.
Quanto à imagem do meu blogue, foi mais uma maneira de dizer que é possível um homem de esquerda inspirar-se em fíguras aparentemente díspares como Che Guevara e Gandhi.
Talvez o Che, nas circunstâncias da luta contra o Império Britânico, optasse pela não-violência de Gandhi.
Talvez Gandhi, em Cuba, participasse da guerrilha contra Fulgêncio Batista.
Quem sabe? Os dois foram revolucionários sinceros e extremamente dedicados à causa. Isto é o que conta.
Um forte abraço.
José Carlos Lima,
Você se diz 'fã de carteirinha de Hugo Chavez'... oras, ninguém é perfeito (ainda bem).
Celso,
Qualquer coisa que o Chávez faça ou não faça vai ser motivo para a 'gritaria dos reaças'. É um bode-expiatório mais eficaz que Cuba.
E mais: os golpistas já atacaram a embaixada brasileira... com armas químicas.
Um abraço,
Luis Henrique
Percebi agora que meu último comentário pode ter duplo sentido, aviso que não pretendi de forma alguma ironizar o posicionamento político do José Carlos.
Luis Henrique
Luiz Henrique,
o xis do problema é a roubada em que o Chávez deixou o Lula com suas declarações inoportunas. Nos dois casos trombeteou o que deveria calar.
E nosso papel não é dar como favas contadas que o inimigo sempre convencerá o cidadão comum. Isso se chama derrotismo.
Temos, isto sim, de travar dia após dia a batalha pela conquista dos corações e mentes, mesmo não dispondo dos mesmos recursos da burguesia.
Um forte abraço!
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