Quando as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia foram o pivô de uma crise que quase provocou uma guerra entre seu país de origem e o Equador, alinhei-me decididamente com os bombeiros, contra os incendiários: nada, absolutamente nada, justificava que os pobres e os excluídos desses dois países matassem uns aos outros, numa versão século XXI da Guerra dos Farrapos.
Havia correntes de esquerda defendendo incondicionalmente as Farc e açulando a guerra. Foi quando o corajoso companheiro Ivan Seixas e eu lembramos o critério da luta armada brasileira: vida só se troca por vida, não por grana.
Sequestrar diplomatas para salvar companheiros da tortura e da morte nas mãos da repressão era válido como medida extrema; sequestrar 800 pessoas e mantê-las em cativeiro degradante para exercer pressões políticas e arrecadar recursos não, jamais! Métodos de revolucionários nunca podem se confundir com os da Máfia.
Então, ambos apontamos as Farc como uma guerrilha desnorteada, que esquecera a causa e perdera o rumo.
Em vez de solidariedade para prosseguirem atuando como atuavam, precisavam, isto sim, ser convencidas a buscarem a saída do atoleiro em que se colocaram. Sem serem dizimadas, mas também sem continuarem a travar uma guerra perdida, anacrônica e rejeitada tanto pelos colombianos quanto pelo resto do mundo.
Faço esta introdução para deixar bem claro que não se trata de um simpatizante das Farc escrevendo, pois a direita usa e abusa de estereótipos para desqualificar seus críticos.
E é contra um dos queridinhos da direita que me posicionarei neste artigo: o ministro da Defesa Nelson Jobim. Aquele que, no Ministério de Lula, lidera a corrente empenhada em manter intocável a anistia concedida a si próprios pelos torturadores antes da redemocratização do País.
Em reunião que Jobim manteve nesta quarta-feira (11), em Brasília, com o ministro da Defesa colombiano Juan Manoel Santos, começou a ser esboçada "uma espécie de pacto contra as Farc", segundo a Folha de S. Paulo ( http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1203200914.htm ).
O jornal atribui a Jobim a revelação de que "uma das medidas em estudo é a flexibilização do espaço aéreo para que as aeronaves dos dois países possam ultrapassar as fronteiras até 50 quilômetros".
E cita uma declaração literal do próprio Jobim: "As Farc serão, em território brasileiro, recebidas a bala. Há um grande controle da fronteira. Vamos discutir com a Colômbia a questão da visibilidade do espaço aéreo. Cinquenta quilômetros adentro, para ver os aviões e barcos que vêm em direção ao Brasil, e vice-versa".
Como no Caso Battisti, a direita brasileira quer fazer de nosso país uma casa da sogra, contemplando os interesses estrangeiros ao preço de avacalhar nossa soberania.
Não cabe ao Brasil receber as Farc nem ninguém a bala, a menos que venham atirando. Nosso papel é apenas o de não deixá-las entrar ilegalmente em nosso país.
Qualquer atitude além desta implicará tomarmos partido num conflito que não nos diz respeito, assumindo uma posição de ingerência em assuntos internos de outra nação (pouco importando o consentimento ou não dos governantes colombianos).
E é simplesmente inqualificável que um ministro da Defesa brasileiro admita, com tal desfaçatez, a possibilidade de conceder a militares colombianos o direito de invadirem a bel-prazer nosso espaço aéreo -- ainda mais se levarmos em conta que eles não hesitaram em dizimar combatentes da Farc no Equador, ao arrepio de todas as normais internacionais.
A licença para invadir acabará sendo licença para matar, ou seja, uma versão recauchutada da escabrosa Operação Condor. Eu sei. Os leitores sabem. Jobim sabe - e não liga.
Se ele confirmar os termos da entrevista concedida à sucursal de Brasília da Folha, só caberia uma atitude a um governo cioso da soberania nacional: sua exoneração.
Ele está agindo como ativista da direita sul-americana, não como Ministro da Defesa brasileiro. Que vá exercer esse papel fora do Ministério!
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