domingo, 17 de agosto de 2008

MERECE INDENIZAÇÃO QUEM PARTICIPOU DE GUERRA SUJA AO LADO DOS CARRASCOS?

"Ex-militares pedem R$ 300 mi a União por ação no Araguaia" é a manchete de hoje da Folha de S. Paulo.

Pensei logo tratar-se de uma ação articulada pela direita como resposta às reparações que estão sendo pagas às vítimas do terrorismo de estado. Mas, não. É mesmo gente querendo tomar uma graninha da viúva.

Trata-se de cidadãos que afirmam ter ficado com seqüelas morais, físicas e psicológicas por terem participado da guerra de extermínio que as Forças Armadas moveram contra os guerrilheiros do PCdoB na década de 1970.

A perspectiva é que outros 425 venham a somar-se aos 125 que já deram entrada em suas ações, totalizando 600. Pedem, em média, R$ 500 mil cada, de forma que, se todos forem vitoriosos, a União terá de lhes pagar cerca de R$ 300 milhões.

Tive um vizinho francês que era artesão na Praça da República. Engenheiro formado, conhecia como ninguém aquelas pedras ornamentais brutas que algumas pessoas gostam de adquirir. Chegou a presidir a associação dos artesãos daquele logradouro em que, na década de 1960, surgiu a primeira feira hippie de São Paulo.

Homem cordial e bonachão, homossexual discreto, Pierre nem de longe aparentava ter o passado que tinha: participara da guerra suja que os franceses mantiveram contra o povo argelino nos anos 50, na vã tentativa de evitar a independência do país.

E o fizera justamente como paraquedista, integrando o contingente incumbido de torturar os patriotas argelinos. Antes dos militares latino-americanos os sobrepujarem nesse mister, os PQDs franceses eram tidos como os exemplos mais acabados de violadores dos direitos humanos.

Quatro décadas depois, Pierre foi surpreendido com o recebimento de uma apreciável pensão da parte do governo francês, algo assim como R$ 5 mil por mês.

Era justo? Eu diria que sim. Seres humanos não devem ser jamais obrigados por governos a cumprir funções cruéis e desumanas.

Então, como nem de longe estou capacitado para opinar sobre as sutilezas jurídicas do caso, eu diria que, DO PONTO DE VISTA MORAL, caberia, sim, indenizar os jovens que, prestando serviço militar, tiveram de participar da campanha genocida no Araguaia e colaborar com (ou presenciar as) práticas tão escabrosas como torturas, execuções de prisioneiros e mutilação de cadáveres.

Já os profissionais -- em termos morais, repito -- nada merecem, pois sempre tinham a opção de pedir baixa. O julgamento de Nuremberg foi emblemático: quem cumpre ordens que atentam contra a humanidade é também responsável por esses crimes.

Também deve ser considerado um detalhe: desde que a União e os estados começaram a pagar reparações às vítimas do arbítrio, os militares e os funcionários públicos são responsáveis pela maior parte das tentativas de burla.

Ou seja, indivíduos que perderam seus postos por incompetência ou desonestidade tentaram fazer passar-se por perseguidos políticos. Há até advogados que foram desmascarados ao montarem tais farsas.

Então, é preciso separar-se bem o joio do trigo.

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