Por Juca Kfouri |
DÓI PENSAR NO ALEGRE GABRIEL
JESUS NA CINZENTA MANCHESTER
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O saudosismo não me pega.
Embora tenha visto o que de melhor já aconteceu no futebol, sigo me divertindo igual ao ver o futebol de hoje em dia.
Não tem mais Mané Garrincha, nem o Rei Pelé, é fato.
Johan Cruijff morreu e Diego Maradona parou, como Tostão, como Paulo Roberto Falcão, como os Ronaldos e o Baixinho Romário, para não falar de Franz Beckembauer, de Franco Baresi, de Roberto Rivellino, Didi, Gérson, Pagão e Canhoteiro, estes dois últimos também como homenagem a Chico Buarque de Hollanda que está aí, como já estiveram Heitor Villa-Lobos e Antonio Carlos Jobim.
Nada a ver com fleuma e fog... |
Porque tem Lionel Messi, como tem Cristiano Ronaldo, Neymar, Iniesta, mesmo no fim, ou Asensio, no começo, garantias de diversão, de emoção, de comoção.
Ainda tem Luan, Gabriel Jesus, talvez venha a ter Pedrinho, Vinícius Júnior, e é aí que a ausência de saudosismo vira temor do futuro que não nos pertence, porque o dinheiro que vem de fora ganha fácil da mediocridade que vem de dentro.
Um dia contei aqui sobre a síndrome do torcedor ou do jornalista paraguaio.
Ainda criança tinha pena dos jovens paraguaios que não podiam desfrutar das noites de Santos do Pelé contra o Botafogo de Mané.
Dava graças por ter nascido no Brasil, campeão mundial em 1958.
Adolescente, a toada prosseguiu.
Podia ver o Cruzeiro de Tostão e Dirceu Lopes, o Palmeiras de Djalma Santos e Ademir da Guia, o Botafogo de Jairzinho e Gérson, e ainda o Santos de Pelé e companhia.
Já jornalista também, com os acréscimos do Inter de Falcão e Carpegiani, do Flamengo de Zico, do Corinthians de Sócrates, do Grêmio de Renato Gaúcho, do Galo de Reinaldo e Cerezo, do São Paulo de Telê Santana e Raí, o Vasco de Romário e o Fluminense de Rivellino.
Ou as seleções de 1970 e 1982!
"Noites de Santos do Pelé contra o Botafogo de Mané" |
Tinha pena dos colegas paraguaios, colombianos, chilenos e não tinha inveja dos italianos, ingleses, espanhóis ou alemães.
Hoje, com frequência, tenho pena de mim mesmo, me sinto venezuelano, morro de inveja dos franceses.
Hoje, com frequência, tenho pena de mim mesmo, me sinto venezuelano, morro de inveja dos franceses.
Menos mal que diferentemente de quando era criança posso acompanhar tudo até no telefone. Só que não é igual.
Vejo um Guilherme Arana nascer e tenho certeza de que, de perto, não vou vê-lo crescer, quem sabe se tornar um Nilton Santos, um Roberto Carlos.
Dói pensar no alegre Gabriel Jesus na cinzenta Manchester.
Saber que Luan já vai, como Vinícius Júnior.
Dói torcer para que Pedrinho não seja isso tudo e fique, pelo menos mais um pouco, porque Philippe Coutinho foi tão cedo.
O Brasil não merece o Brasil.
E por maior que seja a vontade de adentrar o pantanoso campo da política, não, desta vez a deixarei de fora.
É claro que sinto saudades dos tempos de criança, de adolescente ou do começo da vida adulta.
Adorava a bola de capotão e a chanca, mas sigo adorando as redondas plastificadas e as chuteiras assapatilhadas.
Gostava mais do velho Maracanã, mas não desgosto inteiramente do novo, assim como lamento o abandono do Pacaembu e sou capaz de curtir a Arena Corinthians.
Ter saudades de ontem faz parte.
O que apavora é pensar em não tê-las do amanhã.
O Brasil precisa retomar o Brasil.
4 comentários:
O e$porte em geral deixou de ter algum interesse para mim há uns vinte anos atrás, olha que já eram poucos: futebol, atletismo e ginástica olímpica. Além destes também gostava de outra, que já não dava para encaixar exatamente como esporte: a fórmula 1. Aliás, foi esta a que mais tempo permaneci acompanhando. Porém, com interesse cada vez menor. Nunca acompanhei esportes praticados com as mãos. São simplesmente detestáveis. Lutas então... podem ser extintas de imediato.
Time de futebol tem uma importância maior que a fé e a ideologia para as pessoas. Considerando isto e aplicando ao meu caso, direi que sou torcedor do Fluminense. Mas, não pergunte o nome de um jogador do time que não saberei responder. Com a seleção da CBF amarela coxinha é diferente, posso afirmar que o Neimar participa dela. As manchetes dos portais não me deixam esquecer.
O e$porte e o show business (o audiovisual em geral) são as maiores lavanderias mundiais de dinheiro. Nesse último o meu padrão de consumo também foge muito do que é promovido comercialmente. Não que a minha postura seja ditada pela revolta contra os ganhos financeiros. Nem mesmo a purificação dos valores obtidos com os mais variados crimes. Apenas me recuso a ceder tempo aos donos desses negócios. Vou fazer um mea culpa: os games. Talvez por manter ainda o meu lado lúdico, comandando soldadinhos que se movimentam...
Rebolla, com argumentos semelhantes você impugnaria TUDO que existe em nossa sociedade podre. Eu também vejo uma infinidade de distorções, mas tento garimpar algumas pepitas em meio a tanto calhau.
Agora, p. ex., é comovente o esforço do vovô Federer para se manter competitivo enfrentando adversários até com a metade da idade dele. Já é o maior tenista de todos os tempos, já conquistou tudo que se pode conquistar e já tem todo o dinheiro de que precisa na vida, mesmo assim usa mil artifícios para contrabalançar o peso da idade e as dores que sente nas costas e disfarça o melhor que pode.
Lembro-me de que o Muhammad Ali, já na fase de declínio, teve sua mandíbula fraturada no 2º assalto e lutou mais dez, perdendo apenas por pontos. E o coelho que ele tirou da cartola na "luta do século" contra George Foreman foi incrível. Quando cheguei no serviço, no dia seguinte, até os office-boys comentavam a luta, com um brilho no olhar. A vitória do Davi veterano contra um dos Golias mais terríveis de todos os tempos lavou a nossa alma.
O Corinthians começou o ano desacreditado, com um técnico que era só um auxiliar efetivado depois que uns cinco recusaram o convite e um time barato. Aí o assistente montou um esquema tático que os jogadores entenderam e no qual acreditaram; todos se dispuseram a atuar com muita dedicação e conseguiram fazer com que o rendimento coletivo fosse bem maior do que a soma das individualidades faria supor.
E que dizer do incrível match de xadrez entre o rebelde Kasparov e o burocratão Karpov? Aproveitando as ousadias do jovem, o veterano colocou 5 a 1 no placar e precisava apenas de outra vitória para liquidar a fatura. Aí Kasparov decidiu não correr mais risco nenhum, transferindo a responsabilidade de buscar a vitória para Karpov. Jogaram umas 20 partidas que terminaram empatadas. Karpov, mais franzino, começou a sentir a fadiga física e mental. Perdeu duas seguidas e perderia as outras três, se o presidente da federação na interrompesse a disputa.
Mas, o jovem desafiante saiu cheio de moral e o campeão com nenhuma, salvo pelo gongo. Quando jogaram de novo, Kasparov derrotou facilmente Karpov e iniciou seu reinado.
E você lembra de quando o Mansell tentou atravessar a linha de chegada empurrando seu F1?
E do Oscar arrebentando com os cestobolistas dos EUA na casa deles?
E do Garrincha, que muitos tinham na conta de um quase retardado mental, assumindo a responsabilidade de conduzir a Seleção Brasileira ao título depois que o Pelé se contundiu na segunda partida, no Mundial da Fifa de 1962?
Para mim os esportes valem por esses momentos mágicos, imprevistos, desconcertantes. Não pelo ramerrão.
O boxe já me lembrava as arenas da antiguidade. As novas modalidades de luta, 100% comerciais, chegam ainda mais perto. Creio que não irá demorar para que sejam permitidas lutas que só terminem com a morte de um dos oponentes.
O Mansell era da época que não perdia um GP. Não foi o meu ídolo no automobilismo por ser contemporâneo do Piquet. Como você sabe, quem torcia pelo Piquet detestava um outro piloto brasileiro. Menos naquele fatídico primeiro de maio. Não por ser o golden boy da família Marinho e todo o chororô do abutre Bueno, mas pela morte estúpida e sem sentido, aliás, todas são.
Interessante que na nossa era os esportes de competição, depois transformados em profissionais, foram incentivados principalmente nas universidades britânicas, a seguir nos EUA. Na segunda metade do século XIX foi uma avalanche de novas competições, ainda maior no início do Século XX. Por que se tornou tão importante ocupar o tempo dos jovens alunos nos períodos que estavam fora das salas de aulas? Começou como uma prática voltada para os que seriam os formadores de opiniões, depois disseminada para as classes baixas, primeiro como meros torcedores... Marx errou o frasco que rotulou como ópio, escolheu o que na maior parte da Europa já estava com a validade vencida.
Rebolla, muitos filmes já bateram na tecla de que em breve as lutas irão até a morte. E os UFC's da vida são uma prova de que o sistema consente com qualquer bestialidade, desde que o circo mantenha a plebe dócil e seja bastante lucrativo.
Eu, como bom enxadrista, prezava mais os pilotos que ganhavam as corridas com inteligência do que os arrojados. Ademais, aqueles gritos histéricos do Galvão Bueno na linha de chegada, AIRTON SENNA DO BRASIL!, faziam qualquer um pegar bronca do sacudidor de bandeiras. No que o fato de ser brasileiro alterou a forma de ele correr? Em nada! Então, qual o sentido de tal orgasmo patrioteiro?!
Nas universidades BRITÂNICAS? Então, vai ver que foi para dar aos jovens dândis algo diferente para fazerem, ao invés de passarem o tempo paquerando os colegas do mesmo sexo... Aliás, um filme interessante nesta linha é o MEMÓRIAS DE UM ESPIÃO, (d. Marek Kanievska, 1984), mostrando os eventos da juventude que levaram Guy Burgess, um dos "cinco de Cambridge", a mais tarde espionar para a URSS.
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