Toque do editor |
Não conseguia engolir que os patinhos tivessem concluído o passeio sem receberem tiro nenhum. Bastaria um caça da FAB disparar uma rajada de advertência e todos debandariam, voltando em desabalada carreira para Juiz de Fora!
Então, ouvi um sem-número de relatos de companheiros veteranos e li muito sobre o rigoroso processo de crítica e autocrítica da esquerda então ocorrido, que redundou em vários rachas e fusões, esvaziamento de antigas siglas (como o PCB, cuja hegemonia foi pro espaço) e surgimento de novas, afirmação de alguns líderes e desgraça de outros, além, é claro, da guinada para a luta armada.
Ingenuamente, esperei que acontecesse algo semelhante após a derrubada de Dilma Rousseff, até porque o fiasco desta vez foi maior ainda: os tanques nem sequer precisaram sair dos quartéis, mesmo que apenas para fins cenográficos, pois bastou um peteleco parlamentar para o governo trocar de mãos.
Como autocrítica não houve, com o PT mantendo sua hegemonia e perseverando em todos os erros que conduziram à derrota acachapante, só me resta continuar divulgando os textos das poucas vozes petistas que honram as melhores tradições da esquerda. Como o Frei Betto, de quem reproduzo, em seguida, os trechos principais de sua Autocrítica da esquerda (para ler a integra, clique aqui).
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"Não existe hoje, na América Latina, uma correlação de forças que assegure, em curto prazo, a superação do modelo desenvolvimentista neoliberal por um novo modelo de sociedade centrado nos direitos dos trabalhadores, na inclusão social dos setores marginalizados e excluídos, e na preservação ambiental.
Frei Betto: quem se cala, consente. |
No Brasil, no governo do PT adotou-se a emulação do crescimento (PAC), visando a, em primeiro lugar, anabolizar o PIB. E a dependência da exportação de matérias-primas, hoje elegantemente denominadas commodities, agravou o processo de desindustrialização.
A corrupção se entranhou nas estruturas governamentais, cooptou líderes políticos como agentes de interesses privados de grandes corporações e corroeu a credibilidade ética da esquerda. Abandonou-se o horizonte socialista e acreditou-se na política de inclusão assistencialista dos mais pobres, sem alterar minimamente as estruturas sociais e os direitos de propriedade.
"Sem alterar minimamente as estruturas sociais" |
Cedeu-se à falácia de que o capitalismo é passível de humanização. Priorizou-se o acesso da população a bens pessoais (celular, computador, eletrodomésticos etc.) e não a bens sociais (alimentação, saúde, educação etc.).
Não houve empenho em preparar as bases de uma democracia participativa. Movimentos populares foram alijados como interlocutores preferenciais ou cooptados para atuarem como correia de transmissão entre governo e bases sociais.
É hora de fazer autocrítica e corrigir rotas, antes que seja demasiadamente tarde. Pena que, em seu congresso nacional, na primeira semana de junho, o PT tenha declinado desse dever político sob o pretexto de não dar munição aos adversários. Quem se cala, consente".
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