domingo, 22 de maio de 2016

NUANCES DO IMPEACHMENT

Durante o processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff vários vícios de comportamento se repetiram na sociedade, principalmente entre os interessados.

Iniciou-se pela própria presidente e seu bunker de defesa. É comum na  política brasileira apontar contradição sempre nos adversários. Com os defensores da presidente não foi diferente, ao sustentarem que o afastamento dela da Presidência da República configuraria um golpe.

Começa a sucessão de equívocos com a alegação de ter havido pecado original, em razão de o deputado Eduardo Cunha, então presidente da Câmara, ter autorizado a abertura do processo de impeachment por vingança, em retaliação pelo fato de a presidente da República não ter garantido os votos dos deputados do Partido dos Trabalhadores para impedir a cassação do seu mandato pelo Conselho de Ética.

Supondo-se que esta afirmativa seja verdadeira, foram os políticos que instituíram essa forma de barganha como modus operandi de fazer política no país.

Se a vingança fosse capaz de gerar a anulação, a cassação do mandado do senador Delcídio do Amaral, à véspera do afastamento de Dilma Rousseff, também deveria ser nula, tendo em vista que todos os senadores do PT votaram pela cassação  de um ex-líder do próprio governo.

Os defensores do governo Dilma Rousseff também argumentam que Michel Temer traiu, conspirou e trabalhou nos bastidores pelo afastamento da presidente. Trata-se de um posicionamento subjetivo,  que impossibilita qualquer argumentação em contrário mas só teria força de convencimento se a lealdade fosse a regra, e não a exceção, na política brasileira.

Outro argumento bastante inconsistente é o de que o vice-presidente “não teve um voto sequer”. Para quem tem um pouco de bom senso, tudo seria esclarecido com a resposta à pergunta “por que existe um vice-presidente”? Ele teve os mesmos 54,5 milhões de votos da presidente.

Tão inconsistente quanto a posição anterior é afirmar que a democracia correria risco com o impedimento da atual presidente. Não é verdade, mas ainda que trouxesse, era um risco que a democracia teria que arcar, até para ser colocada à prova. Se nada de anormal ou de risco ocorreu na queda de Fernando Collor há mais de duas décadas, só ocorreria agora se a democracia tivesse regredido, o que jamais ocorreu. Agora, está mais sólida, atuante e pujante do que nunca.

Algumas posições se generalizaram durante o processo do afastamento entre os setores da chamada esquerda. Uma, é a de que qualquer pessoa que foi ou vai em manifestações é alienada. E, nesse ponto, é preciso que as correntes de formadores de opinião cheguem a um acordo. Quando não se manifesta é omisso, quando vai é alienado.

Outra posição disseminada, principalmente, pelos políticos, seria uma preocupação com o colapso social a partir da denominada  negação da política pela sociedade. Tal tese é fundamentada no fato de nenhum político ter sido aceito como aliado nas manifestações. Não dizem com clareza que não é reprovação a qualquer política, mas a essa do toma lá, dá cá, da troca de favores, da corrupção instrumentalizada, utilizada atualmente como elemento inevitável na administração pública.

Precisa a sociedade consolidar o entendimento de que a atuação das instituições do Estado, em certos momentos, é como o combate a uma doença muito grave: requer tratamentos difíceis e traz indesejáveis, mas inevitáveis, efeitos colaterais. Na maioria das vezes, o tumor tem de ser extirpado, independentemente de haver ou não certeza da cura (assim como um médico, quando a alternativa é a morte do paciente, deve sempre tentar alguma cirurgia que tenha chance, mesmo pequena, de evitar o óbito) . 

É como sempre deve ser encarado um processo de impeachment do presidente da República, com seus impreteríveis resultados. 

O governo, que decorreu constitucionalmente do afastamento, com início muito confuso, será analisado futuramente.

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