A indústria cinematográfica daquele país conseguira nos anos anteriores faturar uma boa grana com filmes épicos e mitológicos. Hércules, Maciste, Ursus, Golias, fundação de Roma, guerra de Tróia, etc. O filão, entretanto, estava esgotando-se e a Cinecittà saiu à cata de um novo produto.
Sergio Leone, então com 34 anos, tinha começado a carreira no neo-realismo italiano (como assistente de direção e diretor de segunda unidade), mas não conseguira alçar-se ao cargo principal. Era difícil abrir um espaço entre mestres como Vittorio De Sica, Lucchino Visconti, Pier Paolo Pasolini, Federico Fellini, Michelangelo Antonioni, etc.
Então, entre atuar eternamente à sombra dos medalhões do cinema de arte ou mostrar seu trabalho no cinema dito comercial, escolheu a segunda opção. Após dirigir os épicos Os Últimos Dias de Pompéia (1959) e O Colosso de Rodes (1961), teve a sorte de estar no lugar certo, no momento exato, para dar o pontapé inicial num novo ciclo.
Adaptou para o Oeste a história de Yojimbo (1961), um filme de Akira Kurosawa sobre samurai que açula a discórdia entre dois senhores feudais para prestar-lhes serviço alternadamente, sem que percebam seu jogo duplo.
O que Leone fez em Por Um Punhado de Dólares (1964), basicamente, foi mudar a ambientação e colocar um pistoleiro caça-prêmios no lugar do samurai.
Mesmo assim, teve inesperado sucesso praticamente no mundo inteiro, talvez por já introduzir diferenciais significativos com relação aos congêneres estadunidenses, então em franco declínio.
Tais diferenciais, criados por Leone, foram praticamente copiados pelos outros diretores italianos que correram a fazer filmes semelhantes. São os seguintes:
— a figura do anti-herói no centro da trama;
— a amoralidade básica dos tipos e das situações;
— a apresentação criativa dos letreiros iniciais, valorizada com vários recursos, inclusive o uso de animação;
— a nova concepção musical que Morricone trouxe para os westerns; e
Os concorrentes só não puderam contar com o ator principal do filme de Leone, Clint Eastwood, que acabou compondo um dos personagens mais emblemáticos do bangue-bangue à italiana, um pistoleiro oportunista que reapareceria nos seus dois bangue-bangues seguintes, Por uns dólares a mais e Três homens em conflito.
Eastwood não havia emplacado em Hollywood quando tentaram lançá-lo como mocinho convencional, daí o terem relegado a séries de TV e a filminhos classe B e C.
Leone o convidou para ganhar um dinheirinho extra durante suas férias nos EUA porque nele percebeu um bom anti-herói.
Compôs seu personagem (o Estranho Sem Nome) com barba rala, chapéu sobre os olhos, charuto na boca, fala arrastada e um poncho. Com isto, acabou alçando-o ao estrelato e fazendo jus à homenagem que depois Eastwood lhe prestaria, ao dedicar-lhe sua obra-prima Os Imperdoáveis (1992).
Vale para as novas gerações como curiosidade e decerto despertará boas lembranças em quem o viu no cinema ou no horário semanal que a TV Record dedicava ao gênero no século passado. (por Celso Lungaretti)
6 comentários:
Boa noite Celso, aqui é Hebert, tudo bem por aí?
O filme exibido ontem, na Rede Brasil de TV, foi "A conquista do Oeste"
exibido a muito tempo no "supecine".
As trilogias, com o Estranho sem nome (Manco), de Eastwood, junto com "Wild Bunch"
(Meu ódio será sua herança), melhor não ítalo, são obrigatórios no acervo, não é verdade?
Forte abraço!
Não sei exatamente qual é a sensação que um jovem tem ao assistir os faroestes italianos dos anos 60 e 70. Mas, para quem tinha se acostumado ao padrão de Hollywood, assistir àqueles filmes era um deslumbramento.
Tanto que os próprios estadunidenses foram forçados a mudar, o que deu abertura para o Sam Peckinpah, por exemplo, fazer filmes mais próximos do modelo italiano. Um "Butch Cassidy", com a abordagem simpática que dá à dupla de bandidos, seria inimaginável na Hollywood moralista de 10 anos antes,
Boa noite Celso, aqui é Hebert, tudo bem por aí?
Bem frisado, os amantes de Western (principalmente espaguete) percebem as diferenças. Os americanos vêm com aquelas mensagens subliminares (ou diretas):
"O crime não compensa"; "Desbravando o Oeste bravio"; "Levando a Lei e a ordem", etc.
Os personagens maltrapilhos de James Stuart, Dean Martin, John Wayne, sempre parecem estilizados, né? Até que Sam Peckinpah trouxe um ar mais "trapaceiro"
e "farrista" e "beberrão" a seus personagens (dizem que fazia parte de sua personalidade).
A cena final (antes do épico tiroteio), com os irmãos "se enganado" na hora a mulher
pelo "programa" (o combinado era alguns "pesos" cada, não alguns "pesos" os dois juntos), é espaguete puro.
Isso traz a uma reflexão sobre a Máfia de Copola, e a de Scorsese.
De um lado, os maridos devotados, amigos leais, pais dedicados, respeitáveis chefes de família e "empresários" de Copola.
Do outro, os mulherengos, "ratos" (destaque à cena em que Henry leva Karen pra jantar
no "Copacabana", passando pela cozinha, até chegar ao salão principal, em "Goodfellas"),
duas-caras, de Scorsese.
Scorsese é irresistível, e qual a sua preferência?
Peckinpah, descendente próximo de indígenas, era um homem forte, que brigava com os produtores e captava toda a rude poesia das cidades da fronteira. O "Pat Garrett e Billy the Kid" conforme ele o criou, com 115 minutos, é uma obra-prima, pena que só pudemos vê-lo a partir do VHS. Os 15 minutos amputados da versão cinematográfica foram um crime de lesa-arte, não eram cenas de ação, mas transmitiam todo o clima do filme.
Concordo contigo quanto ao Coppola, os filmes da franquia dos chefões foram verdadeiros novelões. E a celebradíssima atuação do Marlon Brando no primeiro é artificial pra caramba. Como sou da Mooca, conheci italianos do tipo mafioso, vestidos de negro mesmo já sendo septuagenários. Eram diferentes, muito mais naturais. Passavam a tarde toca num boteco, jogando snooker, bebendo e papeando.
Naquele tempo furávamos um tipo de tabela e, de acordo com a bolinha que caísse, recebíamos um produto barato. Bom mesmo era o prêmio de quem derrubava a última bolinha. Uma vez as bolinhas já estavam todas no fim e eu, com uns 7 ou 8 anos, ia a cada 10 minutos dar uma olhada. Sobravam, digamos, umas 25 mas eu só tinha grana para umas 10. Torcia para ninguém chegar e derrubar todos.
Um daqueles italianões percebeu qual era o meu interesse e falou para os outros: "Vamos derrubar as que faltam pro menino ganhar o brinde". Fizeram isso. Perguntaram quantas eu podia pagar e deixaram exatamente o número correto para mim. Nunca antes eu tinha sido ajudado assim por estranhos, fiquei tão contente e surpreso que nunca mais esqueci.
Os filmes do Coppola são bons para passar o tempo. Mesmo longos não dão sono. Mas acho todos eles superestimados. Também os do Scorcese nunca me agradaram muito, salvo o "Taxi Driver" pelo ótimo final. Gosto mais do Scorcese fazendo filmes de blues, como O ÚLTIMO CONCERTO DE ROCK.
Boa noite Celso, desde já, bom fim de semana do Hebert?
Sempre tive a curiosidade por sinuca (até baixei tutoriais sobre o efeito da bola).
Até hoje, sempre que vejo "Taxi Driver" (daqueles que se vê trocentas vezes)
nunca consegui entender, para onde Travis olha, tão compenetrado, após deixar Betsy
(cybill shepherd) em casa.
Faz muito tempo que eu assisti a esse filme pela última vez. Deve ter sido no século passado.
Sinuca eu joguei muito, com colegas da ECA e depois com os de trabalho. Mas nunca fui bom nas tacadas, creio que jamais matei cinco bolas em seguida. Mesmo tacadas de quatro devem ter acontecido só um punhado de vezes.
Como jogávamos a dinheiro (apostas baixas), eu só me salvava de ter prejuízo escondendo as bolas dos adversários. Deixava-lhes jogadas difíceis, induzindo-os ao erro.
Postar um comentário