quinta-feira, 8 de maio de 2025

TAL COMO SEU ANTECESSOR NOMINAL, IRÁ LEÃO XIV FAZER UM PONTIFICADO CONTRADITÓRIO? O TEMPO DIRÁ.

O nome escolhido por um Papa diz muito sobre os caminhos que ele deseja trilhar em seu reinado e no caso do novo pontífice a escolha vem carregada de significado. 

Leão XIII foi o Papa responsável pela encíclica chamada De Rerum Novarum, um documento publicado em 1891 que tratava especificamente da questão operária em um contexto de perda de influência do catolicismo entre a classe trabalhadora europeia, cada vez mais ganha pelo socialismo. Contraditório, o documento criticava a situação miserável dos trabalhadores, defendia o direito de greve e de sindicalização, mas também atacava o socialismo, o liberalismo e a laicização social. Foi a primeira grande tentativa do Vaticano de entrar no mundo moderno. 

Leão XIII tentou combater a influência
socialista entre os trabalhadores.

Essa informação histórica é importante para entendermos a escolha de Robert Francis Prevost pelo nome Leão XIV. Arcebispo de origem estadunidense, nascido em Chicago, Prevost foi durante mais de duas décadas bispo no Peru, país do qual é cidadão naturalizado. Portanto, a rigor, ele é o primeiro Papa estadunidense, mas também o primeiro peruano, continuando com o movimento do Vaticano, iniciado com Francisco, de eleger pontífices oriundos da América Latina, região onde hoje o catolicismo encontra-se em franca decadência. Que ele também seja estadunidense é mais uma peça política nada gratuita, diante dos recentes desgastes da Igreja nos EUA por causa das denúncias de pedofilia que abalaram aquele país. 

O agora Papa, inclusive, é criticado por ter acobertado padres pedófilos e é lembrado por ter feito declarações nada abonadoras a respeito da comunidade LGBT, declarando que suas práticas não estariam de acordo com o evangelho. Condenou igualmente a tentativa de se ensinar ideologia de gênero nas escolas da pequena e miserável cidade peruana onde era bispo. Em geral, é tido como um moderado, mais à direita que Francisco, mas sem o reacionarismo de um Bento XVI. 

Daens acreditou na encíclica
de Leão XIII, mas foi por ele
abandonado.
A encíclica de Leão XIII foi muito mais um documento vazio que uma correção concreta de rumos na empoeirada Igreja Católica. Quem tiver curiosidade, pode assistir ao filme Daens, colocado na janelinha ao final deste post, cuja trama aborda a história do padre belga  Adolf Daens. Vivendo no interior da Bélgica, esse sacerdote acreditava nas promessas da De Rerum Novarum e inicia potente campanha em prol dos operários, ali submetidos à superexploração e à miséria mais implacável, e entra em disputa com os burgueses locais. Os industriais da região iniciam brutal perseguição contra ele, o levando a bater nas portas do Papa em busca de ajuda. Contrariando sua encíclica, Leão XIII não ousa se colocar contra a poderosa burguesia belga e abandona o pobre Daens à própria sorte. No fim, condenado ao silêncio obsequioso, sua única alternativa é abandonar a Igreja e seguir sua luta.

Ao escolher seu nome, Leão XIV mostra qual será o espírito de seu pontificado e esse espírito parece ser o mesmo de seu antecessor nominal: contraditório e formal, buscando se entregar ao mundo moderno, mas o condenando, confrontando os poderosos no discurso, mas não na prática, e no fim acima de tudo preocupado com sua perda acelerada de fiéis. No fim, o novo Papa parece ser uma síntese impossível de uma Igreja atravessada por uma profunda crise entre os ressentimentos reacionários e as aspirações liberalizantes. (por David Coelho) 

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