sábado, 18 de janeiro de 2025

APÓS MOSTRARMOS AO MUNDO NOSSA PIOR IMAGEM COM O BOLSONARISMO, "AINDA ESTAMOS AQUI" VEIO NOS REDIMIR.

 dalton rosado
AINDA ESTAMOS AQUI 
"
O teatro e a educação devem caminhar juntos; educar não é só ensinar a ler e escrever;
é ensinar a pensar e sentir o mundo de
outras formas" (Fernanda Montenegro) 
A Justiça Militar enviou ao Supremo Tribunal Federal  uma carta assinada por 37 militares, inclusive dois coronéis da ativa e dois da reserva, na qual faziam críticas ao judiciário e incitavam à quebra da institucionalidade constitucional. Foi o ponto de partida para a instrução e julgamento de tal prática golpista. 

Além de evidenciar a necessidade de uma apuração militar por quebra de hierarquia (pois militares da ativa não podem se dirigir aos seus superiores nesses termos de clara ingerência política, ainda mais estando o governo recheado de fardados em postos de comando), a Justiça Militar entendeu que o referido documento fugia à alçada de crime militar para caracterizar também crime comum,  passível de punição dentro da legislação penal brasileira.   

Na verdade, Jair Bolsonaro se via incomodado com a constatação de que seu governo tinha menos poder do que supunha como presidente: o ignaro desconhecia que, no regime republicano a serviço do capital, é o próprio capital quem manda nas questões mais relevantes, cabendo aos militares apenas darem suporte à garantia da ordem burguesa exploradora.

Quando os fardados se investem de poder político, o fazem de modo arbitrário, amiúde gerando conflitos administrativos nocivos para as pessoas e para a própria lógica funcional capitalista.  
Militarismo à brasileira: o fumacê num 7 de setembro

O militar, adestrado para a guerra, é administrador arbitrário que confronta o senso da lógica capitalista e termina por ser ineficaz tanto para o povo quanto para o próprio capital a que serve).     

As amarras institucionais da democracia burguesa se formataram de tal maneira que garantiram a impessoalidade do poder político diluindo-o em instâncias de departamentos, de modo que o capital não sofresse eventualmente a rebeldia de um governante que ameaçasse a sua hegemonia.  

Os militares, não raro, se acham poderosos por terem as armas e querem inverter, de modo político absolutista, aquilo que o capitalismo vem aperfeiçoando ao longo dos últimos 200 anos, ou seja, o capital defende o lema descentralizar, para governar, de forma que todos os seus servos (civis e militares) se tornem membros voluntários do seu absolutismo.  

Presos à lógica do capital, os militares, quando se imiscuem na política, ficam estressados com a divisão institucional burguesa porque querem governar fora de quaisquer amarras; então, acabam fazendo das suas vontades a lei,  como se fosse possível um retorno personalíssimo ao absolutismo monárquico-eclesiástico feudal. 

Representam politicamente o retrocesso da história, principalmente neste momento de crise do capital no qual os governantes sofrem o desgaste cada vez mais acentuado da ingovernabilidade sob a relação social capitalista, dando ensejo a que surjam oportunistas salvadores da pátria para anunciar uma pretensa solução sob a mesma lógica autoritária por sua natureza exploradora e que somente piora o que está irremediavelmente arruinado: o sistema produtor de mercadoria.  
"A ditadura dos generais, de triste memória, terminaria
com os militares indo embora pela porta dos fundos"

Esse é o contexto da tentativa de golpe militar frustrado num país que, apesar de desmemoriado, tornou-se suficientemente ressabiado de uma história republicana marcada: 
--por um golpe militar contra a monarquia que em 1889 instituiu a República pela direita (fato único no mundo); 
--pelos levantes militares que pipocaram desde 1922, tendo o mais importante deles sido o tenentismo, com seus 15 anos de duração; 
--pela volta dos militares ao poder pelas urnas no período 1946/1951, quando Getúlio Vargas, impedido de disputar a eleição presidencial, descarregou os votos que teria no general Eurico Gaspar Dutra, fazendo-o de  seu poste;
--e por mais uma recaída no militarismo em 1964, com a ditadura dos generais, de triste memória, que durou 21 anos e terminou com os fardados indo embora pela porta dos fundos.  

Mas. temos momentos fugazes de glória.  Somos um país carente de conquistas que erradiquem o complexo de vira-latas, e que por isso vibrou com a escolha da nossa Fernanda Torres como melhor atriz dentre as concorrentes ao Globo de Ouro, superando grandes estrelas como Nicole Kidman, Angelina Jolie, Kate Winslet, Tilda Swinton e Pamela Anderson.  Vibramos como se tivéssemos conquistado a Copa do Mundo de futebol pela primeira vez. 

Tratou-se também de uma espécie de reparação moral à Fernanda Montenegro, que muitos profissionais importantes da sétima arte consideravam merecedora do Oscar de melhor atriz em 1999, por sua atuação em Central do Brasil 
Fernandinha é bi em Cannes: "Eu sei que vou te amar"... 

Assim comemoramos por vários motivos: 
-- porque ainda faltava um reconhecimento hollywoodiano ao cinema nacional, cujas grandes conquistas até agora se limitavam ao Festival de Cannes (melhor filme de aventura de 1953 para O cangaceiro; palma de ouro de melhor filme de 1962 para O pagador de promessas; prêmio da crítica em 1967 para Terra em transe; prêmio de melhor atriz de 1986 também para Fernanda Torres por Eu sei que vou te amar, só que empatada com Barbara Sukowa; prêmio do júri em 2019 para Bacurau; e prêmio de melhor atriz para Sandra Corveloni em 2008, por Linha de Passe;
-- chancela para o mundo a ascensão do cinema brasileiro, atraindo olhares mundiais para a qualidade da nossa dramaturgia (em parte já conhecida pelas novelas na televisão); 
-- valoriza a tenacidade das mulheres brasileiras representadas no filme por Fernanda Torres, Eunice Paiva e Fernanda Montenegro; 
-- denuncia para o mundo a desumanidade da ditadura dos generais, ao mesmo tempo que provoca uma reflexão nas pessoas incautas que, por ingenuidade ou ignorância, não dimensionaram o perigo de votar numa pessoa capaz de afirmar que a ditadura deveria ter assassinado 30 mil opositores.  

Está na hora de sermos eminentes no exterior por outros talentos, pois até agora a grande maioria dos nossos destaques era na área esportiva.  

Confesso que me emocionei pelo conteúdo humano do filme, paralelamente à denúncia implícita que traz, até porque me considero colega da Eunice Paiva que foi defensora dos direitos humanos como eu ainda sou desde o final da década de 70. 
...e "Ainda estamos aqui".
Como disse a mãe, Fernanda Montenegro,
não é fácil romper a linha do Equador no cinema. Mas, rompemos!   

Obrigado Walter Salles, Selton Melo, todo o elenco e, especialmente, às Fernandas (mãe e filha). 

Bravo, bravíssimo!  

Ainda estamos aqui! (Dalton Rosado)      

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