segunda-feira, 8 de janeiro de 2024

UM ANO DA FARSA DO 8 DE JANEIRO

 Há um ano, um punhado de gatos pingados bolsonaristas invadiam e quebravam os prédios na Praça dos Três Poderes em Brasília. Era o epílogo do frustrado movimento que desde outubro tentava reverter as eleições de 2022 com fechamentos de estradas e acampamentos nas portas de quartéis país afora. 

A imprensa burguesa, em aliança com o lulopetismo e com a oligarquia política encastelada no Congresso e no STF, transformaram o ato aloprado em uma tentativa de golpe, em uma narrativa tão absurda que mesmo Kafka teria dificuldades de acompanhar. A Globo não se vexou mesmo de nomear os aposentados, vendedores de bolo de pote, agricultores, donas de casa ociosas e milicos aposentados de terroristas por terem quebrado relógios, cadeiras, vidraças e rasgado quadros. 

Foi o momento dos valentões brilharem contra os joão-ninguéns invasores. Alexandre de Moraes, o vingador da República, foi muito macho contra senhorzinhos e senhorzinhas, tendo, segundo contas recentes, chegado a efetuar mais de 6 mil processos desde então, um nível produtivo jamais visto na história das galáxias. Um homem com fúria de justiça! Pena que sua fúria tenha se elevado no máximo a um Coronel da PM e um ex-ministro de Bolsonaro, não alcançando fazendeiros, comerciantes, banqueiros, generais e demais figurões por trás do levante bozoísta. Mas não poderia ser diferente, pois pegar formigas gera mais número que pegar tubarões.  

Do Lula não precisamos falar muito. Presidente cada dia mais patético, precisou da intervenção da esposa para não decretar uma GLO, pois não havia ninguém em sua equipe com perspicácia suficiente para compreender o momento e tomar decisões adequadas. Rendido aos milicos, manteve Múcio, ministro da Defesa, que o havia traído pouco antes, não fez nenhuma intervenção nas Forças Armadas, exceto a demissão de um teimoso generaleco, e hoje compactua com a impunidade a Bozo e seus asseclas.

A falsificação do que foi o 8 de janeiro serve para validar a podridão das instituições, criminalizar manifestações populares e blindar o lulopetismo de qualquer crítica. Taxar de golpe é desconsiderar o que é um Golpe de Estado e, pior, desconsiderar a estratégia por trás de todo o movimento bolsonarista iniciado em outubro de 2022. Não importa o que este ou aquele participante dos atos acreditava, se eles tinham ilusão de estarem pondo abaixo a República, nada daquilo tinha o poder de subverter a estrutura social e política do país e nem mesmo uma GLO o faria, isso porque o núcleo duro das elites e o Imperialismo tinham fechado questão em torno de Lula e não apoiariam uma aventura golpista naquele contexto. 

Perigosa terrorista que atemorizava ministros
do STF

Esse ponto já tinha sido deixado claro pelo governo Biden aos milicos durante todo o ano de 2022. A União Europeia, na liderança de Macron, também já tinha dado sinais que não dariam sustentação a uma virada de mesa no país, não tendo sido gratuitas as inúmeras viagens de Lula aos EUA e à Europa antes da eleição. Por fim, a oligarquia brasileira, cristalizada nos bancos e na mídia, já tinha fechado questão contra o golpismo bozista de forma veemente no cômico movimento da Carta pela Democracia.

Tudo isso porque amam a democracia? Óbvio que não! Os capitalistas odeiam a democracia e, no Brasil, ela é limitada ao máximo para impedir a concreta participação popular. O grande temor da plutocracia era com o efeito desestabilizador de um golpe da extrema-direita, com consequências imprevisíveis. Lula pelo menos eles já conhecem, é um fiel servidor da burguesia, tão manso quanto um cãozinho. E, melhor, pode apaziguar as massas com seu discurso de pseudo esquerda

Então, se era assim, por que o bolsonarismo foi às ruas? Porque o jogo é de longo prazo! Steve Bannon, o grande estrategista mundial da extrema direita, já tinha traçado que se fosse para o movimento sair vencedor, seria uma tarefa talvez de décadas. Ao mobilizar o povaréu fascistóide nas ruas, os líderes da extrema-direita estão apenas mantendo o movimento energizado após uma derrota que, para eles, é momentânea. Foi assim na invasão ao Capitólio, outra ação que não tinha poder nenhum para mudar nada, mas serviu para manter as bases trumpistas mobilizadas após a derrota para Biden. Mesmo as prisões ajudam nesse processo, pois afinam o discurso da perseguição política e da podridão do sistema, gerando ainda mais coesão e senso de propósito aos participantes. 

Desgraçadamente, a esquerda até hoje não compreendeu o movimento da extrema-direita e insiste em considera-la a partir de categorias equivocadas. A extrema-direita não precisa dar golpes claros e inequívocos porque está modificando as instituições burguesas por dentro, de forma democrática e legal, ao eleger deputados, senadores, colocar ministros nas cortes de justiça, aprovar leis restritivas, etc. Não se trata de uma Copa, com uma final apoteótica, mas de um campeonato de pontos corridos com pequenas vitórias corriqueiras, mas que se agregam  na totalidade da competição. E, é preciso dizer, estão abrindo pontos de vantagem.

Passado o circo bolsonarista, foi a vez
dos palhaços mais veteranos adentrarem o picadeiro 


QUAL DEMOCRACIA, CARA PÁLIDA?

Para concluir, é preciso dizer que das narrativas sobre o 8 de janeiro a mais irritante é sobre a defesa da democracia. Não apenas porque nossa burguesia não acredita na democracia, mas também porque se trata de uma democracia apodrecida, falsa. 

Uma democracia em que, por exemplo, acaba de ser aprovada, pelo governo Lula, uma lei geral das Polícias Militares liberando a militarização geral da sociedade e reforçando o caráter repressivo de tais instituições. Isso sem qualquer debate social!

Numa democracia em que o Congresso, um aglomerado de bandidos e parasitas, decide tudo na base da extorsão e sem qualquer debate com o povo ou em que as leis mudam de acordo com a conveniência dos poderosos, não valendo hoje o que valia ontem.

Ou em que a Justiça, corporativa e oligárquica, faz o máximo de esforço para tomar decisões às escondidas, em vergonhosos acordões que achincalham a Constituição e colocam ministros do STF no podre jogo do toma lá dá cá , mas, óbvio, sempre em favor dos poderosos e de si mesmos. 

Steve Bannon: é um campeonato de pontos 
corridos, não um mata-mata
A democracia em que tudo muda para permanecer igual, pois cada eleição é mero teatro com personagens medíocres e previsíveis, com debates inúteis, superficiais, sem jamais tocar no essencial. A cada novo ciclo eleitoral, a vida segue a mesma.

Defender tal democracia é defender a perpetuação da ignomínia humana. 

Na realidade, a ponderar bem as coisas, nenhuma ação dos aloprados do 8 de Janeiro se compara em nível destrutivo ao que é pacatamente praticado nos corredores daquele mesmo Senado, Câmara Federal, STF e Palácio do Planalto todo dia, pois ali o resto da democracia é vilipendiada e a vida do povo atacada sem levantar qualquer indignação. (por David Emanuel Coelho)  

2 comentários:

Anônimo disse...

Na visão do New York Times
na falta de generosidade NYT, vai em PDF
https://www.4shared.com/s/f2Qh-qGg5fa

Neves disse...

Na visão do Guardian
Lula hails ‘victory of democracy’ on anniversary of pro-Bolsonaro uprising | Brazil | The Guardian
https://www.theguardian.com/world/2024/jan/08/brazil-january-8-insurrection-anniversary-democracy

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