quinta-feira, 29 de junho de 2023

HÁ 65 ANOS O "RETARDADO" GARRINCHA E O "IMATURO" PELÉ NOS TORNARAM CAMPEÕES MUNDIAIS, DRIBLANDO OS PRECONCEITOS

O rei menino chorando, Gylmar e Didi 
"
A taça do mundo é nossa

Com o brasileiro não há quem possa
Ê, êta esquadrão de ouro
É bom no samba, é bom no couro

O brasileiro lá no estrangeiro
Mostrou o futebol como é que é
Ganhou a taça do mundo
Sambando com a bola no pé
Goool!
"
(Maugeri, Müller, Sobrinho e Dagô)
Hoje (29) se completam 65 anos desde a final da Copa do Mundo de 1958, disputada na Suécia, quando o escrete nacional deu um chocolate de 5x2 nos anfitriões, repetindo o placar da semifinal contra a poderosa França.

Tal conquista teve um significado imenso para nós, brasileiros: provamos ao mundo e, principalmente, a nós mesmos que poderíamos ser os melhores em alguma coisa, começando a livrar-nos do complexo de vira-lata.

Até então, víamo-nos como seres inferiores, deitados eternamente em berço esplêndido, sem nunca concretizarmos o nosso potencial. 

Uma vinheta radiofônica dizia: Brasil, um país a caminho do seu grande destino!. Que nunca chegava.

Enquanto isto admirávamos, embasbacados, o progresso dos EUA e as imagens fantasiosas que os grandes irmãos do Norte projetavam de si próprios via cinema e TV. Isso, claro, só fazia aumentar nossa sensação de inferioridade.

Consolávamo-nos com a ilusão de que seríamos a nação do futuro – uma pífia compensação para o passado inglório e o presente insosso. Era como a promessa católica do paraíso, o sonho que ajudava a suportar uma vida de privações.

O futebol já dera mostras, em 1950, de que poderia se tornar nosso grande motivo de orgulho nacional. No entanto, vacilamos na hora H e a euforia se transformou em frustração.
Bellini erguendo a taça Jules Rimet. Ufa!

[Meu pai costumava contar que, depois de tomarmos a fatídica virada do Uruguai por 2x1 em pleno Maracanã, a principal rua do nosso bairro ficou quase deserta, como ele nunca a vira numa noite de domingo. Rapazes e moças nem sequer se animaram a sair para paquerar.] 

Em 1954 trombamos com o avassalador esquadrão da Hungria e fomos merecidamente eliminados por Puskas & cia.

Aí, em 1958, receosos de mais uma frustração, não ousávamos acreditar na Seleção Brasileira. Ainda mais depois de duas derrotas vexatórias em amistosos de 1956 (0x3 Itália e 2x4 Inglaterra, apesar dos milagres do são Gylmar) e da eliminatória tortuosa em 1957, quando sofremos como nunca para vencer, em pleno Maracanã... o Peru!

É que a Venezuela desistira de disputar uma vaga no Mundial, deixando-nos a tarefa aparentemente facílima de derrotarmos um único e pouco ameaçador adversário. No entanto, o Peru não morreu na véspera. O jogo em Lima ficou em 1x1 e, no Maracanã, num magro 1x0 – gol de folha seca de Didi, cobrando com a maestria habitual uma infração da entrada da área.

[Um causo hilário. Excursionando pelo Brasil, o grande Benfica de então enfrentou o Botafogo e seu famoso goleiro Costa Pereira sofreu um gol de falta do Didi exatamente da mesma maneira, a folha seca, com o arremate parecendo que passaria sobre o gol e a bola descendo nos últimos metros. 

Aí, no Pacaembu, o corinthiano Cláudio repetiu a dose, com seu chute que rumava para a linha de fundo e entortava no finzinho da trajetória. Costa Pereira, que caminhava tranquilamente para bater o tiro de meta, botou as mãos na cabeça, estupefato, ao ver a redonda balançando suas redes, depois de fazer o que, nas entrevistas, ele qualificaria de uma curvita...]
Imparável, Garrincha enlouquecia os zagueiros

GARRICHA FUNDIU A CUCA DOS CIENTISTAS DA URSS
 
– O empate diante da Inglaterra, no segundo jogo das oitavas-de-final (depois da boa estreia contra a Áustria, 3x0, com direito a golaço de Nilton Santos), fez aumentar nosso pessimismo. 

Foram 90 minutos de sofrimento, grudados nos rádios cujo som às vezes fugia, pois as transmissões a longa distância eram pra lá de imperfeitas; quando voltava, afligíamo-nos tentando adivinhar se não sofrêramos algum gol durante o apagão.

Tivemos de partir para o tudo ou nada contra a pretensiosa URSS, que anunciava ter estudado cientificamente as vulnerabilidades dos futebolistas brasileiros.

Foi quando o técnico Vicente Feola se curvou à pressão dos líderes do elenco e escalou o fenômeno Garrincha... que até então ficara no banco porque um laudo psicológico o dava como pouco mais do que um débil mental. Foi preciso chegarmos à beira do abismo para o técnico desconsiderar os preconceitos dos engravatados.

O resultado foi aquilo que passou à história do futebol como um dos inícios de partida mais fulminantes de uma Copa do Mundo. Imprevisível como uma força da natureza, Garrincha pulverizou a ciência soviética, colocando uma bola na trave, servindo Vavá no primeiro gol e criando sucessivas jogadas agudas. 2x0.

Na quarta-de-final contra o retrancadíssimo Pais de Gales, foi a vez de Pelé dar o ar de sua graça, fazendo o gol salvador. 1x0.
Os melhores ataques daquele Mundial fizeram uma semi inesquecível
Ele também começou a Copa como reserva (de Mazzola), pois Feola temia que, aos 17 anos, não aguentasse tamanha responsabilidade. 

Ledo engano. O escrete melhorou muito com sua escalação a partir do jogo contra a URSS, para deslanchar de vez na semifinal contra a poderosa França de Fontaine (que, com seus 13 gols marcados nos gramados suecos, dificilmente perderá um dia a coroa de maior artilheiro de um só Mundial). 

Graças ao retardado Garrincha e ao imaturo Pelé, o Brasil selou a mais retumbante conquista de uma Copa do Mundo até hoje, pois, com exibições de uma arte futebolística nunca antes vista no Planeta Bola, venceu as duas partidas finais por sonoros 5x2.

Gilmar; Djalma Santos, Belini, Orlando e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Vavá, Pelé e Zagallo disputaram a partida derradeira, não se intimidando com a abertura do placar pelos anfitriões. 

Bastaram duas arrancadas perfeitas de Garrincha, deixando os atônitos defensores suecos pelo caminho e centrando rasteiro para Vavá completar, e a vantagem mudou de mãos.
Golaço de Pelé furou a sólida retranca da Pais de Gales

Pelé (2) e Zagallo liquidaram a fatura, sob aplausos dos extasiados torcedores escandinavos.

O nosso povo, que há tanto tempo andava atrás de qualquer alegria, pôde finalmente desabafar: com o brasileiro, não há quem possa!.

Pena que as lições foram logo esquecidas. O embasbacamento face às metrópoles e a submissão aos preconceitos dos engravatados voltaram a prevalecer.

E continuamos reprimindo o Macunaíma que temos dentro de nós – tanto que, ao contrário dos argentinos com seu ídolo Maradona, fomos terrivelmente ingratos com nosso herói de duas Copas, deixando Garrincha agonizar no alcoolismo e abandono. (por Celso Lungaretti)

Melhores momentos da final (ou acesse o jogo completo aqui) 

3 comentários:

Anônimo disse...

Panem et circenses - já dizia o Juvenal.
Depois da rosa passar só resta O Nome da Rosa... passou. Escuto Ecos de tempos medievais.

celsolungaretti disse...

Nem tanto. Amanhã, em homenagem aos 65 anos dos 5x2 na Suécia, o TSE deverá tornar o Bozo inelegível por 5 votos a 2...

celsolungaretti disse...

Mas o que eu realmente quero é que o STF o condene a 52 anos de prisão, sem direito a redução da pena.

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