terça-feira, 4 de abril de 2023

ANOS 60 E A CONTESTAÇÃO AO CAPITALISMO. É PRECISO RETOMAR A ENERGIA REVOLUCIONÁRIA DAQUELE PERÍODO!

 Em que pese no Brasil termos vivido o início das duas décadas de regime militar opressivo das liberdades individuais, da tentativa de conservação da caretice nos costumes por este mesmo regime, da mentira do falso milagre econômico brasileiro - financiado por uma dívida que nos custa caro, até hoje -, e das torturas, mortes e perseguições políticas, a lufada dos ventos libertadores dos anos 60 também chegaram ao nosso país pelas mãos da rebeldia juvenil.   

No mundo ocidental capitalista os jovens passaram a dizer NÃO! ao conservadorismo retrógrado nos costumes, bem como se posicionando contra os males da lógica capitalista sob diferentes formas: negando o modo de se vestir empolado, adotando o charmoso desleixo nos cabelos compridos, negando a sociedade de consumo sufocante, posicionando-se contra as guerras, principalmente a guerra do Vietnã e defendendo a consigna  faça amor, não faça a guerra!  

O surgimento da pílula anticoncepcional no início dos anos 60, nos Estados Unidos, rapidamente disseminada pelo mundo, representou substancial transformação nas relações sexuais, posto que os jovens namorados, e adultos também, passaram à prática do sexo livre sem maiores constrangimentos, e podemos ter uma ideia do que isto significou.  

Na música, que se tornou uma arma demolidora contra o establishment, vieram as bandeiras melódicas da rebeldia. Da Inglaterra vieram os Beatles, com suas músicas inicialmente adocicadas para explodir na visão psicodélica de mundo posteriormente, e os Rolling Stones, desde o começo mostrando a sua visceral performance de bad boys do blues e do rock’n’roll inconformista. 

Dos Estados Unidos, a irreverência calma e ferina de Bob Dylan e a visão colorida de mundo dos The Mamas & the Papas e dos Beach Boys

No Brasil, era a época da jovem guarda de Roberto Carlos e seu séquito de um lado, com o mesmo viés inicial dos Beatles, e do outro lado a música engajada de Geraldo Vandré, Chico Buarque de Holanda, Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Elis Regina, além do anarquismo implícito do tropicalismo de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Torquato Neto, Tom Zé, nas belíssimas vozes de gente como Gal Costa e Maria Betânia. 

Pari passu, veio também a explosão mundial da bossa nova como reconhecimento internacional da qualidade musical brasileira, chegando a competir com a beatlemania nas paradas de sucesso estadunidenses. João Gilberto e Astrud Gilberto, Nara Leão, Tom Jobim, Vinicius de Morais e tantos outros passaram a ser figurinhas carimbadas, de New York ao Japão.   

Iniciou-se um novo estilo de mobilização e contestações sociais utilizando os novos e ágeis meios de comunicação via satélite que se denominou como movimento da contracultura, cuja essência era o combate a conceitos conservadores havidos até então. Uma revolução cultural.  

Por aqui, levantaram-se as vozes contra o regime militar que anunciara a redemocratização após o golpe militar de 1964, mas os militares gostaram tanto do poder que nele permaneceram por sombrios 21 anos, até caírem de podre. 

Mas, embalado pelo sopro dos ventos libertários mundiais, jovens brasileiros iguais a Celso Lungaretti e tantos outros empunharam a bandeira da liberdade, mesmo com as mortes assassinas por policiais militares que vitimaram o jovem estudante Edson Luís de Lima Souto, em março de 1968, numa manifestação pacífica no Calabouço, restaurante estudantil carioca. 

Foi o gatilho da revolta estudantil represada. 

As intensas manifestações que se seguiram e que vinham contra a intenção de manutenção do regime militar, tiveram o seu ápice em 1968, quando a linha dura dos ferrabrases da ditadura resolverem promulgar o Ato Institucional nº 05 - AI5 - em 13 de dezembro daquele mesmo ano, quando, simplesmente, os militares tiraram o resto de sua máscara de caráter democrático-burguesa, fecharam o Congresso, manietaram o poder judiciário e passaram a governar o Brasil segundo os seus critérios pretensamente iluminados e perversos do ódio que promovem perseguições e mortes arbitrárias.  

Um mero soldado do regime passaria a ter salvo conduto para matar quem fosse por ele julgado como subversivo. Dirigentes de estatais demitiam funcionários de carreira que manifestassem desapreço ao regime miliar, grandes empresas contratavam generais de pijama como diretores para facilitar seus interesses diante de licitações e relações de  negócios com o governo militar, o gerenciamento por militares de empresas públicas ou autarquias federais era reserva de mercado dos novos governantes e seus lacaios, o judiciário era temoroso de qualquer sentença que contrariasse a vontade militar encastelada no poder central e por aí vai...   

Nos Estados Unidos um pastor negro chamado Martin Luther King promoveu uma epopeia pelos direitos civis dos negros estadunidenses e plantou a semente da igualdade racial expressa hoje no movimento black lives matter, estando o sangue do seu assassinato ainda hoje a irrigar a lucidez das mentes libertárias dos seres humanos que acreditam na solidariedade entre todos nós.   

Na Europa, os ventos da liberdade sopravam numa região que ainda se restabelecia dos traumas e destruições da segunda guerra mundial. Na França - sempre ela - eclodia o lendário maio de 1968 levado por jovens universitários que contou com grande parcela do operariado francês desatrelado do movimento sindical pelego

Pela primeira vez surgiu um movimento de esquerda que criticava tanto o socialismo real, como a democracia burguesa, e tudo a partir de uma visão de mundo sem as amarras do Estado e das doutrinas estatizantes de extração de mais valia pelas empresas da nomenclatura stalinista.  

Frases como não trabalhe jamais, numa alusão ao trabalho abstrato produtor de valor e artífice do capital. Sejamos realistas, queiramos o impossível, referência jocosa à irracionalidade capitalista. É proibido proibir como contraponto à censura castradora da liberdade de opinião. E finalmente, a imaginação no poder  numa clara alusão à obtusidade do poder vertical obediente às ordens do capital, eram escritas nos muros de Paris e conduzidas em cartazes nas passeatas e paralisações que por um período longo de dias sacudiram o país, assustando o Presidente General Charles de Gaulle e sindicalistas, os quais ficaram tomados de surpresa por um movimento que simplesmente reivindicava a vida. 

 Surgiu na esteira do sonho libertário dos anos 60 o movimento hippie, que consistia numa mudança radical de comportamento e costumes e pregava a paz - peace and love era um dos dísticos mais usados - além de contestar a sociedade de consumo capitalista e fazer a defesa da natureza, tendo sido os precursores da luta de preservação ecológica, que teve a sua celebração máxima no festival denominado Woodstock Music and Art Fair, realizado no interior do Estado de New York, com a presença de milhares de jovens vindos dos mais longínquos recantos dos Estados Unidos e até de outros países.   

Mas, de repente, como disse John Lennon, o sonho acabou! 

Vieram os anos setenta e muitos hippies pouco convictos vestiram ternos e se transforam em yuppies bem-comportados e obedientes servos da ordem capitalista, na qual procuraram subir na hierarquia das suas carreiras profissionais.  

As gerações que se sucederam aos anos 60 foram afetadas pelo conservadorismo oportunista e opressor que catapultou o surgimento de fenômenos hoje tão comuns como violência urbana desmedida, consumo e tráfico de drogas por organizações criminosas, desemprego estrutural e queda vertiginosa do poder aquisitivo da classe média formadora de opinião, que ao invés de pugnar por uma sociedade diferente desta atual, prefere o retrocesso tão bem expresso no numeroso segmento anticivilizatório que ora se manifesta publicamente no Brasil e no mundo.  

Nunca foi tão necessário retornarmos  às bandeiras dos anos 60, agora mais conscientes da importância do conteúdo conceitual daquilo que os jovens daqueles anos defenderam, e com a sabedoria de quem experimentou um pedacinho do Céu, e pretende retomá-lo.  

Nosso companheiro Celso Lungaretti e seus companheiros estudantes, aos 18 anos ou pouco mais, ofereceram a sua vida em sacrifício da luta pela liberdade e ele, como eu - que não tive a mesma honrosa experiência sua -, vivemos por breve tempo no paraíso, antes de descermos ao inferno da ditadura militar.  

Mas estamos aqui como combatentes septuagenários, os quais sobreviveram para contar a história e a verdade, tal como feito por Celso neste sábado, 01 de abril, para um grupo de jovens que têm o mesmo espírito imorredouro da liberdade. (por Dalton Rosado) 

7 comentários:

Anônimo disse...

Agora falta o Comparsa sulamericano
https://img.semafor.com/c43b5d42f08cb3b6c2d0b52ea9f789867b501ce2-1280x854.png?w=800&q=85&auto=format

Anônimo disse...

https://www.economist.com/cdn-cgi/image/width=834,quality=80,format=auto/media-assets/image/20230408_FNP002.jpg

Valmir disse...

parece que a esquerda nunca vai se dar conta de uma coisa mais que obvia: a inversão total entre a tal "rebeldia" dos anos 60 (nao sei se foi godard ou pasolini que disse que - realmente o maio de 68 era uma luta entre proletarios e burgueses,,,onde burgueses eram os estudantes e proletarios era a policia)....com a total hegenmonia da seita esquerdista na politica e cultura (escolas, faculdades, midia, musica e teatro e o escambau) rebeldia e contracutura hoje é a direita que resiste a politica de terra arrasada fome e morta da esquerda.

David Emanuel disse...

Valmir,
quem disse tal bobagem foi Pasolini, o qual era ligado ao PC italiano e, tal como os estalinistas de sua época, rechaçava o maio de 68 por não estar sob controle dos partidões e por romper com o pacto de zonas de influência dada na Guerra Fria. Quanto à suposta hegemonia atual da esquerda, acho que vc deve estar lendo demais o finado filósofo fantasminha camarada, que recentemente morreu de doença inexistente. A esquerda não tem hegemonia em nada e, para atestar isso, basta verificar a imposição nas próprias escolas da neoliberal Reforma do Ensino Médio. Do mesmo jeito, acredito que vc jamais pisou em uma faculdade, pois do contrário saberia do predomínio da prática produtivista e alienante do neoliberalismo, o mesmo pra música (dominada pelo sertanojo), o teatro (inexistente, mas quando tem é controlado por figuras da TV), a mídia (puramente à serviço dos interesses do grande capital). Quanto ao escambau, não poderia te dizer muita coisa, pois não localizo tal lugar. Por fim, a direita não é contracultura, não é rebeldia, é conformismo e ignorância, tentando reativar um suposto passado cultural mítico, existente apenas na cabecinha oca dos reacionários, e negando tudo o que é verdadeiramente popular, crítico e libertador. A direita não busca libertar ninguém, apenas reforçar os laços de dominação, as hierarquias, as discriminações, as opressões e a espoliação. Verdade, muitas vezes ela faz isso de modo iconoclasta e simulando inconformismo, mas isto é apenas a forma, não o conteúdo. Ela usa meios inconvencionais para reforçar o convencional, para reforçar a estrutura de poder já existente e o comportamento mais conservador, submisso e resignado entre os indivíduos.

Valmir disse...

Considerando que...1- conservar é melhor q destruir. 2- só é conservador quem tem o q conservar. Mea culpa mea máxima culpa...sou um conservador

David Emanuel disse...

Conservar o que? A miséria? A fome? O sofrimento? A desumanidade? Gostaria de saber o que se tem para conservar nesta sociedade.

Valmir disse...

parece que vc esta falando de Cuba..Venezuela. Ou estou enganado???
em cuba (onde ja estive algumas vezes e todos são mendigos) um pedinte nao te pede dinheiro inicialmente...ele oferece o dinheiro local ao que ele identifica como turista: para em troca receber dinheiro de verdade. Estranho paraíso, muito estranho.
1- falta de comida: interessante que uma ilha enorme nao tenha peixe nao é?
no sistema local a pesca é impossível pq qualquer que entrar em um barco....nao volta nunca mais.
2-num resort de luxo onde estive em varadero muita policia na praia....pra que ninguem tenha a ideia de pegar uma boia de criança...e fugir. Ou um caiaque..ou qqr coisa que flutue.
Imagino que a precaução seja para com o empregados do resort pq o cidadão local nao tem acesso a praia.
como disse antes: estranho paraiso

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