Hoje (25) se comemora mais um Dia do Soldado, insituído em homenagem ao Duque de Caxias, que nasceu em 25 de agosto de 1803. A data despertou em mim duas lembranças dos anos de chumbo.
Em 1969, um pequeno grupo de esquerda independente procurou a Vanguarda Popular Revolucionária, propondo-se a destruir, na madrugada de 25 de agosto, a estátua do Duque de Caxias que existe até hoje na praça Princesa Isabel, no bairro paulistano de Campos Elísios. Havia descoberto que a base era oca, tornando facílimo mandá-la pelos ares. Só precisava de explosivos, que nós tínhamos para fornecer, se assim o decidíssemos.
O Comando estadual da VPR contava, àquela altura, com três membros: José Raimundo da Costa (Moisés), Samuel Iavelberg (Moraes) e eu (Douglas). Aprovamos a idéia, até porque queríamos, de alguma forma, reagir à captura do quarto membro, João Domingues da Silva, o Elias. Logo adiante ele morreria de hemorragia, por terem-no torturado antes que se restabelecesse suficientemente do ferimento sofrido na troca de tiros com agentes da repressão.
Mas o Comando Nacional vetou a ideia, convencido pelo comandante Carlos Lamarca de que seria uma provocação inconsequente e poderia acirrar a bestialidade dos militares contra nós.
Meu lado racional até concordou, mas passei muito tempo sonhando com a satisfação que sentiria ao infligir tal humilhação à ditadura. Teria sido de lavar a alma.
A praça Princesa Isabel frequentou o noticiário no último mês de maio, quando os zumbis da cracolândia, que nela se haviam fixado, foram expulsos com o estardalhaço habitual.
Aqui serviu o professor de tortura Ailton Joaquim. Aqui, em junho/1970, me deixaram meio surdo para sempre. |
De imediato, cercaram-na com grades e ela passou a ser mais policiada. Em seguida, decidiu-se transformá-la em parque, mas, como tudo no Brasil de hoje, isto vai demorar.
A segunda lembrança é de quando eu já estava preso, na PE da Vila Militar: o tenente Ailton Joaquim, considerado um dos dez piores torturadores do período pelo grupo Tortura Nunca Mais, a pavonear-se pelo quartel com a Medalha do Pacificador que lhe entregaram no Dia do Soldado de 1970. Adivinhem onde eu gostaria que aquela latinha fosse enfiada...
Frequentemente lembrado por um episódio dos mais repulsivos –torturou presos políticos apenas para demonstrar as técnicas das quais era mestre, durante palestra que fez dois meses depois a oficiais no RJ–, ele foi responsável direto por eu ter ficado para sempre com um tímpano estourado e propensão a labirintite.
Tal medalha foi instituída em homenagem a Caxias, chamado de pacificador por seus fãs.
Na era Médici, era comum agraciarem os carrascos da ditadura. E, em plena democracia, os militares aproveitaram o 25º aniversário da quartelada para outorgá-la a mais uma leva de personagens com esqueletos no armário – provocação que a chamada Nova República engoliu da forma mais abjeta. (por Celso Lungaretti)
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